Apesar de saber que a vida é feita de porcentagens — somos 70% água, 10% meia calabresa, meia atum, mais ou menos e, por aí, vai — hoje, eu me irritei quando alguém citou, sobre determinada situação, a porcentagem de 99,9% como provável.
Por algum motivo obscuro para mim, como já que proclamei em certa ocasião, sou um digno representante do “Talvez“, acordei a querer ter certezas. Queria para o resto do dia que tudo se definisse 100%. Queria a absoluta convicção, sem a intermediação de advogados a citar contestações em latim: data venia…
Queria a fé dos quem erram com perfeição:
“São bandidos, sim!”
“São pessoas corretas, com certeza!”
“Não é amor, é apenas paixão!”
“Droga não faz bem, ainda que recreativa!”
“A minha vida é uma droga!”
“Sou feliz prá caraleo!”
“Você é uma besta, mas eu o amo!”
“Eu adoro arroz e feijão, tanto quanto odeio bacalhau!”
Não queria cores intermediárias nem o cinza, mas o preto e o branco perfeitos. Queria saber para onde estou indo e para onde vou. Queria saber quem sou eu. Queria amar e o amor sem dúvidas. Queria ter a certeza de que todos morremos para as outras certezas da vida… pelo menos, por hoje.
À princípio, o tema deste 6 On 6 me pareceu um supremo desafio. Para mim, não existem espaços em branco. Nem mesmo as nuvens brancas poderiam ser chamadas dessa forma. São fluídos corpos branqueados a preencher espaços azuis. Tenho imensa dificuldade para meditar porque não consigo deixar a mente desabitada de ideias, coisas e seres de todas as espécies. Para atender ao chamado, busquei o que para mim se configura no que é mais parecido com espaços em branco – a minha memória claudicante. Ela carrega mitos e meias verdades, uma expressão cabível no tema deste 6 On 6. Dos arquivos eletrônicos, preenchi os espaços em branco que se não fossem os registros das imagens-vida-pensamentos deformados, ao olhar para trás veria somente uma longa estrada plana, de fundo infinito.
2016
Rua Santa Ephigênia, onde as antigas construções abrigam lojas de equipamentos de ponta em vários setores da tecnologia. É uma festa para os meus olhos, mas não nesse aspecto. Para mim, o que é precioso reside nas edificações… É comum aproveitar a abertura de algum portal do Tempo e viajar para o Passado. São breves instantes de percepção extrassensorial em que capturo algum momento especial, testemunho a História a acontecer em décimos de milissegundos e volto a caminhar entre carros, pessoas e luzes de LED…
2015
A Luz foi engolida por grossas camadas de nuvens escuras, repentinamente! O calor ameno deu lugar ao frio que se projetou por nossas peles desprotegidas. O ser humano vem a perceber, nesses momentos de humor ciclotímico do tempo, que é muito frágil diante do Clima e diante da força da Terra. Será por inveja que queremos destrui-la?
2014
Foi ontem, mas poderia ter sido hoje. Poderia ser em qualquer dia, quando vemos o Sol erguer-se além da linha do horizonte. Se pareço insistir no tema do confronto da luz solar contra as fímbrias do nosso fundo do olhar, muito mais não se cansaria o trabalhador cintilante em continuar a sua faina por bilhões de anos de explodir em Luz?
Outubro de 2021
Nascido há 60 anos em terra, no centro de São Paulo, na maternidade de mesmo nome (hoje demolida), sob Libra, signo do ar, é na água que me sinto estar em meu elemento. Adoro saltar, flutuar em queda, atravessar o azul, mas ao mergulhar é que me percebo ser um com a Natureza.
Abril de 2019
Encontro gostoso de pessoas amantes da vida e da arte no Sarau do lançamento de mais uma edição de “Vermelho Por Dentro“, de Lunna Guedes, pela Scenarium. Um ano após, os encontros foram interditados para prevenção de possíveis contaminações pela Covid-19. Desde então, por segurança, os saraus presenciais não mais ocorreram. Voltarão talvez com as boas novas que novembro de 2022 nos trará…
Setembro de 2022
Passei pela RuaSanta Ephigênia, como é corrente fazer, para comprar itens para a minha casa e trabalho, como lâmpadas e outros detalhes para a execução de minha atividade. De lá, fui em direção ao Largo do Paissandu para embarcar no ônibus que me levaria para a casa. Na esquina da Rio Branco com a Antônio de Godói, encontrei o que poderia se chamar de um espaço em branco consumado. Apesar da presença de mato e do entulho, o terreno baldio no qual um dia se encontrava o edifício-favela ocupado em condições inadequadas por pessoas em situação de precariedade financeira está vago. A antiga sede, por 33 anos, da Polícia Federal foi abaixo na madrugada de 1º de maio, levando consigo apenas nove vítimas fatais, algo surpreendente dada a quantidade de ocupantes do arcabouço em concreto, vidro e aço.
Junho me engoliu. Descobri que passeava pelo mês, quando já havia deglutido o primeiro dia em sua metade. No feriado, ocorrido no último dia do mês finado-passado, trabalhei vinte horas seguidas. Acordei na sexta-feira passada, pensando que fosse segunda. Mandei mensagem para a minha podóloga, informando que perdera a hora da consulta, às 13h. Apaguei, logo que percebi a discrepância. O motim dos caminhoneiros, ajudou a tornar o início de Junho prenúncio de algo novo –– só não sei dizer o que será…
Domitila
Junho me deixa preguiçoso. E invejoso, de tanta paz que alguns sentem ao vivenciá-lo. Apenas penso que será um mês atribulado, com Copa do Mundo e eventos relacionados à esse acontecimento. Nunca observei tanta pouca acolhida ao torneio de futebol quanto neste ano. Talvez reflexos de certo 7 X 1, na Copa passada. Prefiro acreditar que o brasileiro sabe que teremos grandes problemas a enfrentar no decorrer do ano. Que vencermos um evento esportivo não definirá nosso futuro tanto quanto as eleições que se aproximam.
Mês branco…
Junho é um mês branco. Em sua maior parte, nasce e morre sem outra cor. O outono se esvai em sangue cada vez mais ralo, à espera do inverno que se aproxima. A cidade cinza se diferencia das cores manipuladas pela mão do homem, em paredes e janelas. Nesta paisagem de São Paulo antiga, do Vale do Anhangabaú, pintada em um prédio na Avenida Tiradentes, o branco do céu real se confronta com o azul do céu fictício. A cidade se sobrepõe em camadas, em avessos e vice-versa.
Paisagem suspensa…
Junho começou com visitas à Santa Efigênia, região onde busco suplementos e equipamentos de trabalho. Vez ou outra, adentro a espaços em que quinquilharias se acumulam sem propósito aparente, a não ser de servirem como cápsulas do tempo. Já consegui peças e dispositivos com bons preços nesses lugares. Ontem, cheguei a ver o mar, ainda que mal pintado. Surpresas deste mês frio.
Nudez…
Junho desencarnado se reflete em visões nuas. Como a parede deste belíssimo prédio. Praticamente abandonado. Aparentemente, está para ser reformado. O mês de junho está para ser reformador. Janelas e portas escancaradas para nos conscientizarmos de nossas possibilidades como povo. Poderia começar com as festas juninas queimando as fogueiras do descaso à vida, da insolvência da lei, do descumprimento das normas básicas de convivência social. Que as quadrilhas dancem apenas os temas folclóricos.
O multi-Homem que não sou…
Junho antecipou emoções que esperava viver apenas em seu final. Solicitações de todas as ordens fez com que eu tivesse que multiplicar minha atenção. Nem mesmo a minha personalidade dada a brincar com personagens para atendê-la em sua diversidade, está conseguindo lidar com todas as questões que este mês tem me pedido. Há datas que gostaria de ser três pessoas, pelo menos, para estar onde gostaria de estar. Dia 23 de Junho será um desses dias…