19 / 08 / 2025 / BEDA / Nove Dias

Em 2021, vivíamos um ano em que o País vivia sob a sombra da gestação do Golpe de Estado, o mesmo projeto que o acusado de gestá-lo, nega que o fez. Era Agosto e, então escrevi: “Parte da turma que se reuniu para comemorar mais um ano de vida da Romy, a primogênita da família Oliveira Ortega, mesmo nove dias depois. Porque a comemoração de sua existência é nossa, que a amamos. Neste ano difícil para todos, assim como foi o anterior, superamos vicissitudes extras, mas não há outra opção a não ser caminhar com coragem e determinação. Que saibamos governar o nosso destino, ainda que estejamos embarcados numa nau sem comandante capaz.”

13 / 05 / 2025 / Comemoração de Bodas

Hoje, a Tânia e eu completamos 36 anos de matrimônio, oficialmente. A nossa “comemoração” foi trabalharmos na casa, principalmente nos jardins — o do meio e o da frente. Enquanto isso, as notícias se sucediam apenas ouvidas e quase esquecidas, a não ser aquelas que nos tocaram de alguma forma — como a morte do grande Mujica, ex-presidente do pequeno Uruguay e uma figura ímpar em qualquer latitude do planeta. Outra figura ímpar é o impagável Mister T. Ele não me “decepciona” na sua trajetória obscena, mas não deixa de me surpreender.

Reproduzindo um processo realizado no Brasil no final do Século XIX e início do Século XX, em que o governo brasileiro iniciou a importação em massa de mão-de-obra europeia com o intuito velado de embranquecer a nossa população predominantemente de tez escura. Ele pretende receber sul-africanos brancos que se dizem descriminados racialmente. Não duvido, mesmo porque razões não faltam, convenhamos. Dominantes durantes séculos em que aplicaram o estúpido Apartheid, os brancos, também chamados de Afrikarnes, sendo 7% da composição populacional, dominam boa parte das terras produtivas da África do Sul, herança do período em que detinham o poder político.

Estamos preocupados com as cochonilhas que atacaram o abacateiro e vieram para mais perto da casa, começando a passearem pela grande jiboia que enfeita a frente, além da mangueira. Boa parte do trabalho foi o recolhimento dos galhos das podas do ora-pro-nobis e da mangueira. Eu também comecei a limpar o quartinho que será pintado. Nele, guardamos livros que ficaram fora da biblioteca, além de quinquilharias que vamos dispensar. Há alguns armários com peças hidráulicas, parafusos, ferramentas, utensílios como enxadas, tesouras, serrotes e outros utilizados na jardinagem.

Tenho que levá-los para cima e aproveitei para me exercitar utilizando o peso à linha da cintura, equilibrado para não trazer lesões nas costas na subida dos degraus. Amanhã, terminarei essa tarefa. O importante é que percebemos que cuidar da casa e lar é resultado de perseverança numa união com os seus devidos altos e baixos que uma longa relação ocasiona. As filhas estão distantes, a casa, grande para apenas um casal exige cuidados e dela fazemos um refúgio. Os velhos ainda guardam a energia necessária para levar adiante uma trajetória de quase quatro décadas.

BEDA / Dia De Pais

Dia de Pais
Eu e Sr. Ortega

Sobre este domingo comemorativo, quis permanecer longe da voragem causada pela artificialidade de uma data instituída pelo mercado para alimentar o comércio. Manipular sentimentos é a melhor maneira que existe para estimular a compra de objetos que demonstrariam o quanto somos agradecidos a quem deveríamos homenagear. No mínimo, ajuda a amenizar a culpa que sentimos por alguma falta que cometemos a quem presenteamos.
No entanto existem datas que calam fundo, como a dos dias das Mães e a dos Pais. Essas datas acabam por expressar a ideia simples porém completa de início de tudo. Qualquer ser de organização celular mais complexa vivente neste planeta foi gerado por um(a) genitor(a). Pegos, assim, de uma forma tão primária em nosso âmago, não há como deixarmos de expressar algum tipo de emoção quanto a estes dias.
O meu sentimento é contraditório. Tenho filhas que me realizam como gerador de vidas que fizeram, faz e, tenho certeza, ainda farão diferença na existência de quem tiver a boa sorte de encontrá-las. Eu as amo por isso e porque as amo independentemente de qualquer coisa. Quanto ao meu pai, a dubiedade se aplicava de maneira exemplar. Quando estava vivo, ficava meses sem vê-lo. Morávamos perto, caminhava por lugares que eventualmente passava, entretanto quando estávamos juntos, sentíamos certo distanciamento.
Quando houve a cisão definitiva entre ele e minha mãe, que fisicamente também já passou, deixei de tê-lo mais por perto. Com a deterioração de seu estado de saúde e eventual proximidade de seu desenlace, comecei a pensar muito nele e nos momentos que me lembrava (não foram tantos assim) em que vivemos certa comunhão emocional, a maior parte de cunho negativo. Sentia que ele não estaria fisicamente muito mais tempo entre nós e intencionava visitá-lo, ver como estava. Talvez para protagonizarmos outra e possível última discussão. Não conseguia evitar me indispor com ele e preferi não fazê-lo. Fui vê-lo apenas morto.
Frequentemente digo para alguns que o utilizo meu pai como um exemplo a não ser seguido, principalmente quanto a ser um pai presente. Se bem que presença pessoal nem sempre seja indicativo de qualidade. Agradeço a ele que tenha proporcionado subsídios para que eu e meus irmãos tenhamos casas onde morar. Contudo filhos são exigentes e querem sempre mais. Desejava que não quisesse me ver como um mero apêndice de seus ideais e vontades.
Ele esquecia-se que ou não aceitava que, apesar de filhos da carne, não somos compulsoriamente filhos do espírito. Que ele não visse que honrar pai e mãe não era pensar o mundo como ele projetava. Que a partir do momento que os trazemos ao mundo seres aos quais damos suporte – casa, comida, vestuário, escola, educação (algo diferente de escola) e (hipotético) amor –, ao mundo eles pertencem. Lugar comum, todavia verdadeiro.
Por poucos anos, tive uma convivência normal com o Sr. Ortega. Ele era um homem elegante, com tez amorenada e os olhos puxados, devido a sua ascendência indígena. Eu me pareço mais com meu avô, “Seu” Eustáquio Humberto, mas não são poucas as vezes que o vejo em mim, no espelho, e o ouço reproduzido em minha voz. Ainda que afastado de nós, desejava que meu pai que estivesse bem consigo mesmo, já que essa fora sua escolha desde o início. Presente em minha mente-tempo-espaço, o homenageio, mesmo que de modo torto, como progenitor da família que formamos um dia.