26 / 06 / 2025 / Nudez E Cascas

Foto por Life Folk em Pexels.com

No início dos tempos, principalmente em lugares de temperaturas mais baixas, os seres humanos instituíram o hábito protetivo de se vestirem. No decorrer das idades das civilizações, mesmo em países mais quentes, essa proteção – a roupa – passou a intermediar a relação de nosso corpo com o meio. A moda tornou-se a linguagem sofisticada desse processo e estabeleceu um critério que para muita gente veio a definir uma maneira de ser. Para tantos, “somos” o que vestimos.

Outra roupa que vestimos é a nossa própria pele. O nosso corpo carrega tantas informações sobre as nossas origens – fisionomia, forma, cor, idade – que, dependendo do uso que fazemos dele, passamos informações e conceitos claros e subjetivos que queremos (ou não) dar aos outros. Dessa maneira, preconceituosamente, nos conectamos a dados que “definem” o ser humano que se põe a nossa frente ou caminha do nosso lado.

Uma terceira vestimenta que carregamos é a cultura. Não falo de erudição, mas de expressão coletiva e de participação individual nesse caldo de saber(-se). Imagens, palavras, movimentos e falas nos mostram e… nos escondem. O jogo que se desenvolve entre nós todos, entremeado pela expressão física, a incluir a escrita, ilumina ou joga sombras sobre a compreensão correta do que, finalmente, somos ou queremos mostrar quem somos.

Apenas ao nos desnudarmos de tantos trajes poderíamos ser vistos realmente como somos… se é que desejemos que assim seja. Ao vestirmos tantas indumentárias, nos apresentamos como produtos de “histórias” emprestadas, a instituir a nossa própria história. Nessa barafunda de informações, é comum não nos identificarmos plenamente conosco. Tanto quanto seja comum mentirmos a nossa real identidade urbi et orbi, mentimos quem somos para nós mesmos.

Tivéssemos a visão total de nós mesmos e dos outros seres humanos, talvez não conseguíssemos sobreviver nus em pelo. Depois de desbastarmos todas as nossas camadas, feito uma cebola, talvez não restasse a mínima consistência ou ao menos o odor ou o sabor… Talvez nos restasse somente as lágrimas a preencher o oco vazio…

Outonando*

Chegou o Outono

O que mudou? Para uma civilização em que a maioria de seus habitantes vive nas cidades, quase nada. Principalmente em um País que tem quase todo seu território entre as linhas do Equador e de Trópico de Capricórnio, com variações climáticas mais tênues que nos países muito acima ou abaixo da metade imaginária do planeta.

Viver em metrópoles desvincula o seu morador do ciclo natural em que as estações anunciam as suas características de forma mais aberta. O asfalto e as casas de pedras impedem que as águas das chuvas penetrem no solo e, nesses momentos, ou quando o sol inclemente frita os cidadãos nas calçadas sem cobertura verde, é que a questão ambiental interfere no dia a dia desses seres desarmados de aparelhos de ar condicionado.

Com os horizontes descontinuados pelas grandes construções, nem os céus nem os sonhos ganham profundidade e a inclinação da Terra em relação ao Sol não pode ser visualizada nos efeitos mágicos de cor que são produzidos quando o tempo não está fechado.

O desequilíbrio climático apenas agrava as péssimas condições nas quais vivemos. Para sustentarmos a civilização que tem o granito e o aço como símbolos do progresso, acabamos por contaminar a nossa alma e nosso pensamento pela falta de magia que é a revelação da vida natural, naturalmente…

Forçamos o início e o fim do processo como a acionar um botão de liga e desliga, sem passarmos pelo tempo intermediário que é a base da própria existência e os ciclos não se cumprem…

Até onde chegaremos?…

*Texto de 2016

Nudez

Nudez
O semideus Hércules
 
No início dos tempos, principalmente em lugares de temperaturas mais baixas, os seres humanos instituíram o hábito protetivo de se vestirem. No decorrer do desenvolvimento das civilizações, mesmo em países mais quentes, essa proteção – a roupa – passou a intermediar a relação de nosso corpo com o meio. A moda tornou-se a linguagem sofisticada desse processo e estabeleceu um critério que, para muitos, veio a definir uma maneira de ser. Para tantos, “somos” o que vestimos.
 
 
Outra roupa que vestimos é a nossa própria pele. O nosso corpo carrega tantas informações sobre as nossas origens – fisionomia, forma, cor, idade – que, dependendo do uso que fazemos dele, passamos informações e conceitos claros e/ou subjetivos que queremos dar aos outros, quando podemos escolher. Se não, fugimos às comparações, porque ficamos à margem. Dessa maneira, preconceituosamente, nos conectamos a dados que “definem” o ser humano que se põe a nossa frente ou caminha do nosso lado.
 
 
Uma terceira vestimenta que carregamos é a cultura. Não falo de erudição, mas de expressão coletiva e de participação individual nesse caldo de saber(-se). Imagens, palavras, movimentos e falas nos mostram… e nos escondem. O jogo que se desenvolve entre nós todos, entremeado pela expressão física, a incluir a escrita, ilumina ou joga sombras sobre a compreensão correta do que, finalmente, somos ou queremos mostrar quem somos.
 
 
Apenas ao nos desnudarmos de tantos trajes poderíamos ser vistos realmente como somos… se é que desejemos que assim seja. Ao vestirmos tantas indumentárias, nos apresentamos como produtos de “histórias” emprestadas, a instituir a nossa própria história. Nessa barafunda de informações, é comum não nos identificarmos plenamente conosco. Tanto quanto seja comum mentirmos a nossa real identidade urbi et orbi, mentimos quem somos para nós mesmos.
 
 
Tivéssemos a visão total de nós mesmos e dos outros seres humanos, talvez não conseguíssemos sobreviver nus em pelo. Depois de desbastarmos todas as nossas camadas, feito uma cebola, talvez não restasse a mínima consistência ou ao menos o odor ou o sabor… Talvez nos restasse somente as lágrimas a preencher o oco vazio…

Cor De Maravilha

Maravilha

A roupa macia-suave ao toque de minhas mãos, transformou-se em uma lembrança-cor. Não sei que nome se dá a ela, hoje – rosa choque, pink ou alguma outra derivação. Para mim, desde que eu era novinho e gostava de desenhar, a conhecia “como cor de maravilha”.

Eu a usava apenas para dar um toque diferenciado a uma cena, como as recorrentes tardes de outono ensolaradas a se porem entre as montanhas que desenhava… bem parecidas às fotos que os crepúsculos produzem atualmente de onde os observo. Na época, subia na laje para isso. Parece que mantenho alguns vícios juvenis dos quais não me livrei.

A minha mãe, com muito esforço, por achar que tivesse aptidão para o desenho, comprou uma caixa de lápis de 24 cores da Faber Castell. Era uma caixa dobrável, em que as cores eram numeradas e nomeadas. Um requinte. Eu a mantinha como um tesouro. O lápis cor de maravilha era a que menos usava. Preciosa e rara.

Quando escrever se tornou muito mais importante do que desenhar, por volta dos 12 anos, deixei a caixa de lado, para decepção da Dona Madalena. Como lembrança, eu a mantive guardada intacta até minhas filhas começarem a brincar de desenhar. Achei que deveria dar a caixa a elas como se fosse um rito de passagem. Talvez as cores tenham durado alguns meses todas juntas. Sabe-se que, rebeldes, muitos delas preferem ganhar o mundo e voltarem a colorir as cenas do nosso passado. Volta e meia, ressurgem em todo o seu fresco esplendor…

Maravilha 1

Projeto Fotográfico 6 On 6 / Dezembro Em Preto & Branco

Dezembro… luz do sol… calor… mês de festas… Preto no branco, quase não há o que comemorar, a não ser termos sobrevividos a um ano tão doloroso quanto um ferimento à faca. Em tempos em que cada termo ou imagem passa pelo escrutínio ideológico, essa metáfora, por mais inocente que pareça, indicaria pendores aleivosos. Pelo sim, pelo não, não precisa ser faca, então. Vamos dizer que tenha sido tão doloroso quanto o espancamento de um ser inocente com barra de ferro apenas para não tê-lo por perto. Este ano se encerra com dúvidas e incredulidade muito maiores do que quando começou. Fiz previsões para este ano da graça de Vinte Dezoito. Foram publicadas em uma das Revistas da Scenarium Plural – Livros Artesanais. Eu as reproduzirei aqui, até o seu final. Errei muito. Não queria acertar o que acertei.

Por hora, resta aludir às imagens em P&B – tema desta edição do “Projeto Fotográfico 6 On 6” – que consiste em postar seis imagens comentadas publicadas no sexto dia de cada mês, por autores convidados por Lunna Guedes. As fotos em preto e branco são, para mim, estranhamente mais atraentes que as coloridas. Talvez, uma influência direta do fato de ter assistido meus programas favoritos em TVs P&B até meados de 1982, quando minha mãe juntou o dinheiro que tinha e que não tinha para comprar uma TV Colorida para assistirmos a Copa da Espanha.

6 On 6 - P&B

Ao passar pelo Museu da Diversidade, instalado na Estação República do Metrô de São Paulo, encontrei essas palavras em um dos vários quadros com dizeres espalhados pela parede externa do pequeno e expressivo espaço de resistência da liberdade de ser. Traduz de forma exemplar como somos manipulados para viver por padrões que engessam nossa expressão humana. E como nossos sentidos – físicos e infra-ultra-físicos – se entregam à estereótipos confortáveis e padronizados para interpretar o mundo que nos rodeia.

6 On ¨- P&B (Devaneio)

A luz do sol inclinada na hora do crepúsculo, banha o vale e sua casas. Entre elas, a minha, que se sente calorosamente atravessada. Como o personagem de “Beleza Americana”, que assiste o passeio de um saco plástico ao sabor do vento, eu me perco em devaneios para formar imagens que se diluem em linhas costuradas pela imaginação. O registro fotográfico apenas arranha na superfície a viagem para o tudo ou nada do que vislumbro…

6 On 6 - P&B (Escuridão)

A imagem acima é um atestado do que coloquei acima, sobre preferir tons mais sombreados em contraste com a brancura dos corpos. Neste caso, de cravos vermelhos. O que eventualmente tenha se perdido em cor, ganhou em consistência – peso seria uma boa palavra – quase como se as delicadas pétalas fossem revestidas de ferro.

6 On 6 - P&B (Chuva Na Marginal)

Normalmente, voltamos de madrugada – eu, meu irmão e nosso auxiliar – dos eventos em trabalhamos na produção com nosso equipamento de som e luz – esta, idealmente colorida. Dia desses, quando choveu tanto em São Paulo que vários trechos da Marginal foram alagadas com as águas do Tietê, passamos transversalmente, a salvo por pontes do Corredor Norte-Sul. Registrei esta ilustração noturna que logo se configurou, como caçador de imagens, em uma das minhas favoritas desde sempre.

6 On 6 - PB (Portal)

Este portão de uma residência aparentemente abandonada é quase um portal do tempo. Não posso ver construções como essa sem reconstruí-las como à época de seus esplendores funcionais. Esta, acima, se localiza no início da Francisco Matarazzo e não duvido que tenha feito parte do patrimônio do próprio Comendador, como quase tudo no vale que a avenida que carrega seu nome, percorre. Esse portal dá entrada a uma pequena vila bastante descaracterizada, com linhas mais retas-modernas-pobres do que as belas-esféricas-sinuosas do passado. As primeiras, preferi cortar da foto.

6 On 6 - P&B (Idades)

De início, não via vinculação entre as duas imagens que estão expostas lado a lado. No entanto, a primeira, originalmente em P&B, representa um auto-retrato sem tanto apuro técnico, pois desenhava bem espaçadamente naquela época, ao contrário de anos antes, quando cheguei a me imaginar desenhista e até, pintor. Nada impede que possa me tornar um, algum tempo adiante. A segunda, devido à falta de luz, sombreou naturalmente. Contribuí com um pouco mais de escuridão. No desenho, o queixo é menos largo e o nariz menor do que se tornaram. O rosto, mais preenchido em suas linhas. O olhar, é de espanto. Espanto que carrego até hoje, talvez com os olhos espremidos de quem pensa demais. Além do que relacionei em comum, nos dois registros, uso óculos. Ao contrário do que diz a música, eu nasci de óculos, ainda que tenha começado a usá-los apenas a partir dos 12 anos…

Participam desse projeto:
Ana Claudia Anália BossClaudia LeonardiFernanda AkemiLuana de SousaLunna Guedes Mari de CastroMariana Gouveia Maria Vitória  Isabelle Brum