21 / 09 / 2025 / Paulo Freire*

Por ocasião do aniversário de Paulo Freire, em 21 de Setembro de 2021, publiquei no Facebook um texto que repercutiu de uma maneira que me fez entender o quão profundo era o buraco escuro em que nos metemos ao eleger um sujeito despreparado e mal-intencionado para o Executivo do Governo Federal. Aliás, melhor dizendo, a eleição talvez tenha sido consequência da personalidade de País de espírito escravista que nunca deixou de existir e encontrou ressonância no discurso do sujeito eleito. Vamos ao texto:

“Feliz aniversário do pensar e do pensador! Cem anos deveria ser tempo suficiente para celebrarmos o pensamento que nos libertaria dos grilhões da ignorância imposta se tivéssemos feito a lição de casa. Para percebermos a diferença entre o que é um pensamento sólido e outro baseado em mitologia. Mas somos um povo que foi sendo deixado na ignorância, apesar de termos um dos maiores pensadores sobre a educação entre nossos filhos. Atacar o pensamento e o pensador é a tática fácil e perniciosa de quem está satisfeito com o que temos hoje — um País rico de gente pobre material e mentalmente, que elege salvadores da pátria sem pensamento crítico, estruturado e em permanente reestruturação. Pensar não nos livra das dores de viver. De certa maneira, as evidencia. Porém, sem sabermos da doença não há como curá-la. Interessados em deixar que a nação continue enferma para se arvorarem de médicos é de interesse de muitos, em todas as vertentes. Não estarei aqui para ver um país melhor. Deixamos a nossos filhos um legado pesado. Salve, Mestre! A benção, Paulo Freire!”

A reação ao que está escrito acima foi intensa, em vários sentidos. Tanto a favor quanto contra. Os ataques ao maior educador brasileiro, reconhecido em todo mundo como um dos mais proeminentes, foi descomunal. Sem entender de início, percebi que pessoas que não faziam parte do meu círculo imediato de contato, começaram a reproduzir em comentários que percebi serem estruturas com a mesma linguagem e viés. Foi com essa experiência que identifiquei uma espécie de direcionamento estruturado para desvalidar as questões que envolviam a Educação e a Cultura. Tanto quanto se pode observar no que está acontecendo nos EUA atualmente, existe uma estratégia montada nos laboratórios da Extrema-Direita com sede exatamente naquele País, principalmente pelo grupo de Steve Bannon.

Durante o tempo do (des)governo do Ignominioso Miliciano, o Brasil serviu de campo de atuação desse movimento que renuncia às criações humanas no campo do Conhecimento, Pensamento e Cultura para aderir a uma política em que o populismo utiliza as mesmas estratégias criadas no bojo do Nazifascismo do Século passado. Cem anos passados desde então, ideias e sentimentos que estavam supostamente enterrados, ressurgiram após a ascensão do agora condenado por tentativa de Golpe de Estado. O seu grupo continua mobilizado para manter o “legado” de cunho retrógrado. Cumpre estarmos sempre atentos.

23 / 04 / 2025 / BEDA / Dia Do Livro*

Hoje é o Dia Mundial do Livro. Se bem que modernamente possa ser acessado por equipamentos eletrônicos — como computadores, tablets, celulares e, mais especificamente, ebooks — o objeto livro, por si só, é algo simples. Primitivamente, são páginas de papel unidas umas às outras que expressam mensagens imagéticas e ideias por imagens e/ou palavras. A estas últimas as quais me filio como escritor, rendo as minhas homenagens. Principalmente neste momento que há um projeto para taxação de publicações literárias por considerá-las elitistas. E se isso acontece é porque o investimento na Educação tem declinado gradativamente. É como se fosse o paradigma do biscoito ao contrário: como a Educação é elitista, os livros — instrumentos fundamentais do ensino — também devem ser. Considerando que a leitura é um dos eficazes expedientes para o desenvolvimento do aprendizado e do conhecimento, a formulação do projeto deveria ser o oposto.

É o empobrecimento da Educação como projeto de separar os bem-educados dos que irão servi-los. No livro que tenho à mão na foto — a coletânea de setes escritores com sete textos cada, chamada Sete Pecados — há um texto meu chamado Governante Supremo, em que o referido personagem odiava a Literatura. Seu projeto secreto é o de tornar a todos equalizados a um nível menor de inteligência. Em certa passagem, está expresso: “Ao contrário do que se propagava de que uma imagem valesse por mil palavras, intimamente sabia que uma só palavra poderia equivaler a mil interpretações diferentes, se o leitor tiver capacidade de interpretação aprimorada. Como evitar que uma comunicação simples ou ordem direta não fosse corrompida por pensamentos espúrios quando se escrevesse ou lesse a palavra ‘amor’, por exemplo?”

*Texto de 2021, por ocasião do desgoverno do Ignominioso Miliciano.

14 / 02 / 2025 / Sobre Pragas*

Nesta mesma época, em 2020*, publiquei o texto abaixo, em plena vigência da Pandemia de Covid-19. Como a replicar a atual realidade, só que na parte de cima no Mapa Mundi, vemos acontecer a mesma gerência da realidade como se, por sortilégio dos deuses, um senhor tangerina de parca capacidade administrativa imprime uma visão de mundo como se brincasse de joguinhos de dominação, a narcísica criatura buscasse manipular a ordem com atitudes violentas — anexação, deportação, invasão, destruição.

“Eu sei que tem muita gente gostaria de um Corona Vírus para apimentar a nossa vida de perigo. Não precisamos. Vivemos em um País com péssimo Saneamento Básico, causador de doenças endêmicas; crescimento de mortes por Dengue e Chikungunya; a volta da Paralisia Infantil, Sarampo e da Tuberculose, por falta de vacinação, resultado de pura ignorância estimulada pelas Redes Sociais — assim como ‘adquirimos’ este desgoverno —, que cogita diminuir a assistência aos doentes de AIDS, que resultaria no aumento de casos de doenças oportunistas, principalmente daquelas que se aproveitam de pessoas que não se previnem ou estão desassistidas por políticas públicas de saúde deficientes. O portador de AIDS normalmente se cuida, toma precauções e se medica convenientemente, segundo mostra estudos recentes. O comportamento de risco geralmente se dá por parte daquele que se considera eleito pelos deuses, geralmente ‘homens’ socialmente aceitos como acima de qualquer suspeita — os piores — que transmitem doenças às esposas, alheias a vida dupla de seus companheiros. Para piorar, a base de tudo — a Educação — que desenvolve cidadãos mais conscientes e aparelhados de conhecimento para sanear a Sociedade do lixo mental e da desinformação, está sendo alvo de um processo silencioso e paulatino de desmonte. O desinvestimento nessa área se inicia desde a infância, com a retirada de verbas para creches. Como estudante de História, parece que estou vendo acontecer no cotidiano uma representação de fatos antigos, de séculos passados, que julgava ultrapassados para este novo milênio. O que surge como exercício de distopia — um dos temas preferidos pelos escritores — está sendo reeditado como obra de péssimo autor. Já estou a prever a procissão de hordas de convictos caminharem, por ordem superior, até a beira da Terra plana para saltarem para o Infinito…”.

Foto por Julissa Helmuth em Pexels.com

Nós & Eles*

A publicação acima foi extraída do Instagram e mostra uma situação que eu vivenciei de perto. Eu trabalho com eventos. Em muitas ocasiões, “invado” espaços que normalmente não frequentaria pela sofisticação do lugar. Aliás, fugiria deles se fosse me dado a escolher.

Nasci na Maternidade de São Paulo, já demolida, onde várias personalidades da cidade também nasceram, não que me considere uma. Vivi o começo da minha vida na região do Largo do Arouche, mas depois a minha família e eu, fomos caminhando para os extremos da Capital Paulista. Primeiro à Leste, em seguida ao Norte. Onde até hoje vivo, aliás. Em uma casa, em uma rua com outras casas, um sistema antigo e em extinção nesta Sampa da “grana que ergue e destrói coisas belas”. Prevejo um futuro onde todos viveremos encastelados em edifícios cada vez altos.

Mas, voltando ao assunto inicial, a Ortega Luz & Som foi contratada para sonorizar uma banda para o batismo de uma criança, filha do dono de uma universidade particular. Fomos um dia antes e vários operários estavam ainda montando o local onde se daria a cerimônia e, logo após, seria servido o jantar durante o qual a banda se apresentaria para animar/distrair os convidados. Era uma imensa plataforma colocada em cima da piscina, com compartimentos que faria inveja a várias casas — capela com pia batismal, uma sala enorme para a mesa também imensa, banheiros bem equipados, corredores para a passagem de garçons e outros funcionários. Fiquei pensando que aquilo era grande demais pelo valor que havia cobrado.

Montamos o equipamento, testamos, deixando tudo pronto para o dia seguinte. Várias personalidades, entre artistas e poderosos de ocasião, compareceram ao evento e todos pareciam encantados com a suntuosidade do espaço e a pompa da cerimônia de batismo, levada a termo por um padre da moda. Talvez por meu provincianismo ou por ter uma mentalidade crítica urdida no estudo de História, eu achei tudo exagerado. Interpretei (cabe ressalva) que aquilo não foi pela fé do pai e da mãe, mas pelo espetáculo proporcionado. Demonstração de poder. De qualquer forma, também não foi por esse motivo que decidi escrever este texto.

Tudo aconteceu antes. Quando chegamos para a montagem, o rígido sistema de segurança começava pela chegada do veículo que nos transportava, que parou em uma “caixa” onde tivemos os equipamentos vistoriados e nós, revistados por homens armados. Liberados, chegamos junto ao “cenário” da cerimônia para descarregarmos o equipamento e montá-lo. Foi quando aproximaram três grandes carros pretos. Do primeiro e do terceiro desceram vários seguranças que se posicionaram junto à porta do carro do meio. Dele, saiu o gestor da universidade, protegido como se houvesse uma ameaça por perto, entrando rapidamente na residência. Olhei para além dos muros altos e sequer tinha um prédio naquela região do Morumbi, onde poderia se instalar um atirador de elite que pudesse feri-lo.

Foi quando me dei conta. A ameaça éramos nós — prestadores de serviços —, simples mortais e, eventualmente, uma possível ameaça à integridade física de alguém tão importante. Por sermos de uma casta inferior, nossas mãos e ferramentas de trabalho poderiam ser usadas como armas para agredir o plenipotenciário senhor de um negócio que prosperou na ausência de uma política pública de apoio à Educação de qualidade.

Objetivamente, eu não tinha como odiá-lo por ele ser um homem rico financeiramente. Ele era apenas mais um “esperto” que utilizou o vazio proposital deixado pelos mandatários eleitos por nós para que fossem ocupados por agentes do sistema de castas que impera no Brasil desde sempre. Se não fosse ele e os assim como ele, seriam tantos outros que também transitavam pelo salão artificial que, desmontado, daria lugar à exuberante piscina abaixo. Junto à mansão e à grande casa adjacente, ladeada pelo canil onde se “hospedavam” os cães da bela família apartada em seu mundo da constante intimidação do resto da nossa “perigosa” população.

*Texto de 2023

Entulho*

Quando eu era mocinho, faziam “bulling” com o meu nome, Obdulio, o relacionando com bagulho, com entulho ou embrulho. Como gostava dele, por ser incomum, segurava a onda numa boa. Hoje, sei que a questão do entulho é muito mais importante que qualquer brincadeira com nomes e que corremos o risco de sermos todos engolidos pelo lixo, de nos tornamos apenas bagulhos.

É muito comum encontrarmos aqui na Periferia locais onde são despejados entulhos – restos de materiais de construção, móveis velhos, utensílios indesejados de todos os tipos. Esses objetos são depositados nas calçadas e esquinas (feitos despachos), muros e jardins das nossas ruas e avenidas. Essas ações, normalmente, não são realizadas por seus (ex)proprietários, mas por intermediários que recebem um dinheirinho para descartá-los. No entanto, quem paga até vem a imaginar, pelo pouco valor envolvido e veículos utilizados (muitas vezes, carroças de tração humana), o destino que será dado ao seu entulho. Porém, a partir do momento que o entrega, não quer mais saber para onde será encaminhado… Não deve ser incomum ocorrer de o sujeito ver a sua própria privada, onde sentou tantas vezes ou o sofá, onde deitou outras tantas, jogados no caminho para pegar o seu ônibus ou atrapalhando a passagem de seu carro…

Essa questão de nosso lixo é, para mim, primordial para identificarmos a quantas anda tanto o nosso nível educacional institucional como o familiar e, antes de tudo, da nossa consciência particular e coletiva. Reflexo direto do que somos como povo, especulo que não merecemos representantes melhores do que temos, mesmo porque é em nosso seio que eles surgem. Escolher aqueles que tem genuína preocupação com a Ecologia tem sido a minha preocupação nas últimas eleições. Se há representantes que, em vez de fazerem promessas mirabolantes, simplesmente se comprometerem com a efetivação de uma Educação de qualidade, bem como o saneamento básico irrestrito, terá o meu apoio.

Da Educação ampla, se desenvolvem os instrumentos para o conhecimento que leva quem a detém, a melhorar a sua vida e de todos ao redor; a de desenvolver a consciência de que temos responsabilidade coletiva com o bem comum; a entender de que a nossa casa não termina no portão para a rua; que o meio ambiente vem a sofrer com o nosso descaso; que, sem sabê-lo saudável, ficaremos (como estamos) igualmente doentes.

Quando falo em saneamento básico, o relaciono à preservação de mananciais, com o tratamento total de nossos esgotos, com a consequente oferta de água potável para todos, o que diminuiria bastante o gasto com a Saúde, já que o uso de água de qualidade evitaria o surgimento das doenças mais comuns, mas não menos graves, por serem endêmicas. Um povo educado valorizaria a geração de energia limpa, eficiente e de oferta quase ilimitada, como a solar e a eólica e veria com desconfiança a ideia de reserva de mercado para combustíveis fósseis que favorecem mais a uma empresa sob a direção de homens que manipulam números dentro do País, enquanto guardam outros fora dele, acima dos interesses da nação.

Eu sei que este possa vir a parecer um pronunciamento partidário, mas desisti de deixar de me colocar à parte das principais discussões que envolvem o nosso modo de vida, para além da observação dos pequenos (apesar de definidores) detalhes da vida cotidiana. Política é a arte da convivência e as pessoas a tem transformado na arte do confronto.

O dono do espelho quebrado terá sete anos de azar, assim como todos que jogam lixo na rua, assim como todos nós, que vivemos neste País. Enquanto isso, utópico, fico a lutar pela salvação pelo Sol, a favor dos moinhos de vento…

*Texto de 2015