Com a chegada de datas marcadas como importantes — aniversário, por exemplo — passamos por reflexões acerca da passagem do Tempo, lembranças fugidias ou outras, mais palpáveis, porém de certa maneira dolorosas. Em 2014*, escrevi:
“Por poucos anos, tive uma convivência normal com o meu pai. Ele era (é) um homem elegante, com tez amorenada e os olhos puxados, devido a sua ascendência indígena. Eu me pareço mais com o pai dele, o ‘Seu’ Eustáquio Humberto, mas não são poucas as vezes que o vejo em mim, no espelho ou fotografias, e o ouço reproduzido em minha voz. Quando houve a cisão definitiva entre ele e minha mãe, que fisicamente já passou, deixei igualmente de tê-lo mais assiduamente por perto. O Senhor Ortega ainda está presente em meu tempo e espaço e o homenageio, mesmo que de modo torto, mostrando que, um dia, formamos uma família como pai e filho”.
Post Scriptum: Não o imagino me segurando em seu colo muito tempo depois da foto. Ele não afeito a certas formalidades e certamente não se mostrava carinhoso. Na minha memória, no entanto, ele era o meu herói. Essas contradições se pacificaram na tremenda objeção ao seu comportamento que acabei por usá-lo como a um exemplo não ser seguido. O meu pai faleceu há alguns anos… cinco anos, talvez. Não foi marcante como deveria, a não ser pelo fato de que, prestes a entregar um projeto para a Scenarium Livros Artesanais — RUA 2 — sequei. Posteriormente, consegui desenvolver o livro de contos curtos, mas o tema recorrente foi a morte.
há crenças mesmo para quem não crê em nada o que já é uma crença há quem acredite de acaso no amor que se transforma em caso quando o encontro se dá há quem não acredite no amor seria uma série de episódios esparsos envolvendo sinais ações visões versões de fatos afeições transitórias e fátuas os corpos não ajudam atrapalham quando se tocam reagem quimicamente os pelos se eriçam as peles se pelam de calor fulgor de fogo paixão querência desejo falta versus falta a se completarem as bocas respondem as línguas caladas mas ativas os sexos a buscarem satisfação os sentidos em explosão busca de sentido que perde sentido e direção as horas se perdem dos ponteiros não creio em acaso mas nele boto fé os dados sendo jogados à revelia de nossa sofreguidão se encontrando em linhas de aparentes paralelas contra todos os prognósticos dois corações começam a bater no mesmo ritmo desenfreado concorrendo para que um instante se torne eterno marcando memórias recorrentes mesmo que apartadas no tempo e no espaço viver é viver de lembranças encontros desencontros o amor um caso de acaso criado pelo destino de nossos egos tontos…
De início, Geometria é a parte da matemática que estuda rigorosamente o espaço e as formas (figuras e corpos) que nele podem estar. Porém, as suas variadas expressões nos induzem que usar o termo Geometrias não seja contraditório, mas complementar – analítica, plana, descritiva, cotada, elementar, euclidiana, não-euclidiana, espacial ou a de n dimensões. De maneira generalizante, a maioria das pessoas pouco dá importância às questões geométricas, apesar de seus corpos viverem num determinado espaço geometricamente quantificado.
Essa desconexão não as impede de continuar respirando, mas dá bem a dimensão da ignorância que graça entre nós no sentido de entendermos como pouco estamos ligados à beleza matemática da Vida. Todos nós praticamos ações intermediadas pelos elementos geométricos. Apesar de não possuir definição, dão base para eles a reta, o ponto, o plano e o espaço. São noções primitivas de funcionalidade. Dado tantos fatores que estabelecem a nossa vivência em continentes e mares, florestas e montanhas, a vibração vital é modulada através dos corpos incongruentes dos seres vivos geometricamente espalhados pela superfície da Terra – figura arredondada, apesar de opiniões ao contrário –, um dos muitos planetas presentes no Espaço infinito, entre estrelas, galáxias e buracos negros.
Dentre as questões matemáticas mais impressionantes que conheço estão a dos números fractais. São conhecidos como fractais as formas geométricas que se repetem infinitamente em diferentes tamanhos. Ou seja, ao observar-se um fractal em diferentes escalas, é possível perceber o mesmo padrão, ainda que tenha tamanhos diferentes. Esses padrões matemáticos infinitos são apelidados de “impressão digital de Deus”. Os fractais estão ligados a áreas da Física e da Matemática, chamadas Sistemas Dinâmicos e Teoriado Caos, porque suas equações são usadas para descrever fenômenos que, apesar de parecerem aleatórios, obedecem a certas regras – como o fluxo dos rios, o formato de uma montanha ou a formação dos galhos de uma árvore.
São Paulo contém tantas formas geométricas que poderia representar o exemplo típico de confusão visual que mais assusta do que acolhe. Para quem a ama, é atraente e desafiadora. Nesta imagem, colhida em dia de chuva, pela manhã, o caminho em linha reta sempre poderá ser obstruído por uma bela visão… ou por hordas de seres humanos deitados embaixo de alguma marquise, cobertos por panos puídos.
“Longe das cercas embandeiradas que separam quintais, no cume calmo do meu olho que vê, assenta a sombra sonora de um disco voador…”. Eu me mudei para esta região em 1969. No alto dos morros, apenas o verde imperava onde atualmente se observa construções de tijolos aparentes em sua maior parte. São como quadrados e retângulos alinhados em áreas em declive. Engenhos da arte da sobrevivência. Essa região pertencia a uma antiga fazenda loteada em terrenos de 250m², em média. Isso, na parte “plana” do vale, onde podemos ver as casas desta rua, na várzea do Rio Guaraú que em tempos idos inundava a região.
Essa é a Gertrudes, nossa Kombi (em registro de 2013) que, nos anos iniciais do Século XXI, serviu para transportar a nós e aos equipamentos da pequena empresa de locação de equipamentos de som que meu irmão e eu temos para as mais diversas localizações, dentro do Estado e para além da fronteira. Em Portugal, as Kombis são chamadas de Pães de Forma. Basicamente, é um veículo em forma retangular, nada anatômico do ponto de vista do conforto, mas tão funcional que a chamamos de “coração de mãe”, pois tudo cabe nela, se bem posicionado. Um enigma em termos matemáticos… como se fosse um universo paralelo.
O círculo de fogo “lá em cima” gera a energia que nos aquece. Sem o Sol, nenhuma forma de vida neste planeta existiria. A Terra está na distância exata para que não desfaçamos em pó ou nos enregelemos a ponto de sermos estilhaçados feito pedações de vidro. No céu, as nuvens navegam ao sabor do vento, se formam e se desformam ao “gosto” da pressão atmosférica. Carregam partículas que podem se precipitar em forma de gotas d’água. Tudo é forma, aparência, ainda que gasosa ou aquosa.
O Homem não inventou a roda. Apenas descobriu como utilizá-la para se locomover mais rapidamente e para carregar maiores pesos com o auxílio de animais como bois e cavalos, revolucionando a Civilização. Segundo Platão, a roda já existia no Mundo das Ideias, também chamada de Teoria das Formas. Mais cedo ou mais tarde, seria natural que se materializasse. A forma circular é utilizada para vários fins, desde arquitetônicos até mecânicos, além de comparecer como elemento essencial em vários esportes na forma da bola. Neste registro feito em movimento desde as Marginaisdo Rio Tietê, sugere mais uma pintura do que uma foto de uma roda gigante. Uma das maiores do Brasil, está localizada no Parque Villa Lobos, sendo uma atração turística recente na capital paulista.
“Aprendi com as palavras o que eu não consegui com as asas: voar!”, por Suzana Martins, em (In)Versus
Quando adolescente, fã de séries de viagens espaciais, ficava intrigado com as que eram realizadas num átimo como em Jornadas Nas Estrelas, através das “dobras espaciais”. O veículo através da qual a comunidade múltipla-humana viajava o Espaço – a fronteira final – era a nave estelar Enterprise, “em sua missão para explorar novos mundos”. O contato com seres humanoides, de formas físicas diferenciadas dos Homo sapiens, com adaptações adequadas aos seus ambientes originais, propunha uma interação possível entre as várias raças e conformações.
Um mandamento que foi colocado de forma clara era o de não intervenção direta no desenvolvimento das civilizações originais dos planetas visitados. Mas, como não iria deixar de acontecer, o Capitão Kirk, o comandante da missão, era um humano que infringia as normas frequentemente, tendo em contraponto Mister Spock, cujo planeta carrega a racionalidade como característica principal, se opunha quase sempre às aventureiras opiniões de seu capitão, sendo ele o segundo em comando. O interessante é que o homem de Vulcano trabalhava a razão num contexto em que tudo inspirava a imaginação. Diante de muitas novas descobertas, o sábio ser desferia a expressão: “fascinante!”.
Para mim, o planeta ao qual me foi dado a explorar é este no qual vivemos. Por ter um olhar de estranhamento quanto a praticamente tudo que me cerca, me pego acordado a sonhar. Ou a sonhar acordado. Quando pequeno, voava sobre as casas do meu bairro, fazendo rasantes junto aos morros em que a vegetação verde ainda imperava. Lembro que percorria ruas que não conhecia ainda, a frente ou abaixo da qual morava. Confirmando depois seus caminhos. Deem o desconto de que a minha memória não é confiável. Mas quando menino cria que fosse assim. Ainda assim, percebi que a forma mais rápida de viajar era o pensamento.
As minhas asas eram invisíveis (para os outros) ou eu as mantinha escondidas para não parecer mais estranho ainda aos olhos dos outros. Através das palavras as materializava. Quando me perguntavam de onde surgiam tantas ideias para escrever não poderia dizer que armava as minhas asas para visitar as diversas realidades. Para parafinar minhas penas, lia bastante. Tudo me interessava. Nunca se sabia onde encontraria os melhores temas para desenvolver novas histórias. Essas construções buscavam reproduzir mundos ideais. A maldade humana era sempre suplantada. O Bem, poderoso, ao final vencia o Mal.
Enquanto isso, lá fora, onde eu não voava; onde os homens conseguiam vencer trapaceando; onde as mulheres choravam por seus filhos mortos; onde as botas pisavam sobre as cabeças dos subjugados; onde a Polícia matava pela ação dos esquadrões da morte (motivo de temor constante na Periferia); onde meu pai se ausentava; onde eu apanhava da Turma do Louquinho; onde a minha única alegria era jogar bola, apesar da miopia que crescia – eu me sentia Ícaro, em voo cego rumo ao abismo.
À princípio, o tema deste 6 On 6 me pareceu um supremo desafio. Para mim, não existem espaços em branco. Nem mesmo as nuvens brancas poderiam ser chamadas dessa forma. São fluídos corpos branqueados a preencher espaços azuis. Tenho imensa dificuldade para meditar porque não consigo deixar a mente desabitada de ideias, coisas e seres de todas as espécies. Para atender ao chamado, busquei o que para mim se configura no que é mais parecido com espaços em branco – a minha memória claudicante. Ela carrega mitos e meias verdades, uma expressão cabível no tema deste 6 On 6. Dos arquivos eletrônicos, preenchi os espaços em branco que se não fossem os registros das imagens-vida-pensamentos deformados, ao olhar para trás veria somente uma longa estrada plana, de fundo infinito.
2016
Rua Santa Ephigênia, onde as antigas construções abrigam lojas de equipamentos de ponta em vários setores da tecnologia. É uma festa para os meus olhos, mas não nesse aspecto. Para mim, o que é precioso reside nas edificações… É comum aproveitar a abertura de algum portal do Tempo e viajar para o Passado. São breves instantes de percepção extrassensorial em que capturo algum momento especial, testemunho a História a acontecer em décimos de milissegundos e volto a caminhar entre carros, pessoas e luzes de LED…
2015
A Luz foi engolida por grossas camadas de nuvens escuras, repentinamente! O calor ameno deu lugar ao frio que se projetou por nossas peles desprotegidas. O ser humano vem a perceber, nesses momentos de humor ciclotímico do tempo, que é muito frágil diante do Clima e diante da força da Terra. Será por inveja que queremos destrui-la?
2014
Foi ontem, mas poderia ter sido hoje. Poderia ser em qualquer dia, quando vemos o Sol erguer-se além da linha do horizonte. Se pareço insistir no tema do confronto da luz solar contra as fímbrias do nosso fundo do olhar, muito mais não se cansaria o trabalhador cintilante em continuar a sua faina por bilhões de anos de explodir em Luz?
Outubro de 2021
Nascido há 60 anos em terra, no centro de São Paulo, na maternidade de mesmo nome (hoje demolida), sob Libra, signo do ar, é na água que me sinto estar em meu elemento. Adoro saltar, flutuar em queda, atravessar o azul, mas ao mergulhar é que me percebo ser um com a Natureza.
Abril de 2019
Encontro gostoso de pessoas amantes da vida e da arte no Sarau do lançamento de mais uma edição de “Vermelho Por Dentro“, de Lunna Guedes, pela Scenarium. Um ano após, os encontros foram interditados para prevenção de possíveis contaminações pela Covid-19. Desde então, por segurança, os saraus presenciais não mais ocorreram. Voltarão talvez com as boas novas que novembro de 2022 nos trará…
Setembro de 2022
Passei pela RuaSanta Ephigênia, como é corrente fazer, para comprar itens para a minha casa e trabalho, como lâmpadas e outros detalhes para a execução de minha atividade. De lá, fui em direção ao Largo do Paissandu para embarcar no ônibus que me levaria para a casa. Na esquina da Rio Branco com a Antônio de Godói, encontrei o que poderia se chamar de um espaço em branco consumado. Apesar da presença de mato e do entulho, o terreno baldio no qual um dia se encontrava o edifício-favela ocupado em condições inadequadas por pessoas em situação de precariedade financeira está vago. A antiga sede, por 33 anos, da Polícia Federal foi abaixo na madrugada de 1º de maio, levando consigo apenas nove vítimas fatais, algo surpreendente dada a quantidade de ocupantes do arcabouço em concreto, vidro e aço.