05 / 08 / 2025 / BEDA / Dama De Cinzas

Vem um dos homens e lhe ofende a natureza feminina
Silenciosamente rouba-lhe a inocência de menina
Determinado e consciente impõem-lhe a boca calada
Que quando balbucia a verdade é de pronto velada
Sofre a exclusão familiar e ainda a pecha que espezinha
De ser além de uma pequena mulher, uma mulherzinha
O decreto que apequena a moça a conduz ao descaminho
Tenta encontrar na química a sua recompensa, o carinho
Nos corpos alheios busca confirmar a dúbia fama
E passa a acreditar nos créditos de cinzenta dama
Mas como um anjo caído, sabe que pode alçar voo maior
Acima do rés do chão, além do horizonte de novo alvor
Subjuga o ódio que poderia sentir pelos machos da espécie
E ainda consegue amá-los e achar graça além da efígie
Prova-se emancipada em carne, osso, mente e espírito
Escreve a cada momento a sua história rumo ao infinito
Une-se a nós e expande o seu ser de boa influência
Confessa-se imperfeita, ainda que seja uma dama de excelência.

Foto por Vladimir Uporov em Pexels.com

Cauby Peixoto*

Cauby Peixoto, se apresentando no antigo salão social da S.E. Palmeiras, por ocasião do aniversário do clube, em 2005.

Grandioso. Estrela no palco. Protagonista na vida. Voz cristalina, mesmo com o corpo envelhecido e alquebrado. Donde suponho que a sua voz incrível não era daqui. De onde quer que ela tenha vindo, voltou para onde veio… A minha mãe brincava que poderia ter sido o meu pai… Por vários motivos, sabemos que seria impossível…

Mas Deus me deu a oportunidade de estar algumas vezes com ele, ouvindo-o de perto, através do meu trabalho. Uma de suas características era falar bem baixinho quando não cantava, tanto para se comunicar quanto para se fazer ouvir entre as canções. Na ocasião da foto acima, um dos espectadores reclamou que a sua fala estava quase inaudível, ao que respondeu que não era nossa culpa, mas porque ele tinha o costume de preservar a sua voz o máximo que pudesse, a não ser quando cantava. Para ouvi-lo no camarim, tínhamos que nos aproximar bastante devido a essa precaução.

Outro de seus costumes era o de chamar de “professor” a cada um dos colegas de trabalho – incluindo músicos e técnicos – equiparados num título de deferência. Educado e apesar de no final de sua carreira estar perdendo a audição, não saía fora do tom equilibrado. A minha admiração por ele crescia conforme o tempo o debilitava, ainda que mantivesse a excelência no canto. Provavelmente um artista de ouvido absoluto, num projeto do qual participei, observou discrepâncias nos arranjos que estavam sendo montados para os shows. Foi a única ocasião em que o vi se alterar um pouco, ainda que mantivesse a elegância.

Que seja bem recebido de volta às outras estrelas, ao brilho que tentava reproduzir em suas roupas. Obrigado por compartilhar conosco da sua magia, Cauby!

*Texto de 16 de Maio de 2016, por ocasião do passamento de Cauby Peixoto, um dia antes, aos 85 anos.