BEDA / A Última Cruzada

Sobre o tema da Ressureição, fundamento da Páscoa, permanece desde sempre a questão da Vida e, mais profundamente, a da Morte. A busca pela eternidade passa não apenas pela Ciência como é explorada pela Arte na Literatura, no Teatro, na Música, na Iconografia, no Cinema, na Religião, além de em outros campos da cultura humana.

Ontem, na TV aberta, passou “A Última Cruzada”, terceiro filme da franquia Indiana Jones. Coincidência ou não, a Disney anunciou o fim da série estrelada por Harrison Ford, sendo que o quinto e último filme ainda será lançado este ano, com a direção de Steven Spielberg: “O Chamado do Destino”. “A Última Cruzada” trata da busca pelo Cálice Sagrado, aquele usado na Última Ceia por Jesus Cristo. Segundo escritos antigos encontrados em pedra, quem o encontrasse e tomasse dele, encontraria a vida física eterna. Ou seja, uma simplificação em relação ao conceito da perenidade da alma.

Passado um pouco antes da Segunda-Guerra Mundial, envolve a participação de nazistas em busca de armas de origens místicas. Expediente já utilizado no roteiro de “Os Caçadores da Arca Perdida”. Ambos os filmes foram baseados numa suposta divisão nazista que pesquisava a utilização de dispositivos sobrenaturais para a conquista da hegemonia militar, para além de armas bélicas. Assim como o uso de substâncias químicas como a metafentamina para viabilizar as famigeradas blitzkriegs que estimulavam os soldados a lutarem dias seguidos com eficiência e sem intervalos – um dos segredos do sucesso da invasão e anexação de países fronteiriços em pouquíssimo tempo.

A passagem da vida corpórea para a eminentemente espiritual – o significado da Páscoa – de certa maneira é subvertida ao realçar a presença física de Jesus testemunhada por seguidores e por Apóstolos que vigiavam o chamado Santo Sepulcro. Para pessoas que precisavam ver para quer, foi o recurso usado para que ficasse comprovado o poder da palavra do Mestre cristão. Questões de à parte, a palavra de amor em contrapartida ao ódio e a aceitação dos desvalidos como iguais, diferia das religiões que buscavam a supremacia de deuses que ostentavam a força e o pendor vingativo como traço de grandeza.

Com o crescimento do Cristianismo, as contradições encontraram seu esteio ao adotarem as estruturas que vigoravam no mundo, materializando o surgimento da Igreja, a ponto de se transformarem na nova face de um império, emulando o Império Romano que, aliás, o adotou como religião oficial. Como representante da palavra de Deus, se autoproclamou eterna e distante da realidade, em contraponto ao poder secular. Nesse momento, foi condenada à extinção. Como todos nós. Porém, parece que ninguém quer morrer – nem instituições, nem sociedades, nem pessoas. Apesar de estarmos num planeta que um dia será absorvido pela expansão do Sol. Não será hoje. Ainda que seja daqui a milhões de anos, ao não conceber o Fim como etapa circular de renovação, morre.

Há povos que acreditam nos ciclos temporais e eu creio ser a melhor forma de compreendermos a passagem do Tempo e da Existência. Estamos materializados, mas daqui a pouco não estaremos mais. Acreditar na supremacia do Espírito seria a alternativa encontrada por muitos para reafirmar a nossa eternidade e de que viver neste planeta não seja em vão. Filosoficamente, busco encontrar pontos de contato com a minha percepção da Vida entre os vários caminhos que se dispõem ante os meus olhos, coração e entendimento. E ainda que seja rescaldo de minha fascinação juvenil, tenho profundo respeito pela Paixão de Cristo e ainda me emociono com o contexto da história desse incrível ser humano que um dia andou sobre a Terra.

Participam: Alê Helga / Mariana Gouveia / Lunna Guedes / Roseli Pedroso / Cláudia Leonardi Suzana Martins / Dose de Poesia / Lucas Armelin / Danielle SV

13:13*

Para aqueles que dizem ter fé, que se dizem cristãos, que têm esperança em Jesus – sinônimo de amor –, mas não suportam quando o amor se pronuncia seja de que forma for.

Para aqueles que preferem seguir ídolos com pés de barros, ignóbeis que se pronunciam em nome do Mestre.

Aquele que não busca Deus dentro de si, mas O coloca acima de todos, sem intimidade ou conexão, como algo inalcançável. Quando expressa que o Brasil está acima de tudo, esquece de informar qual país é este, mas sabemos que deseja um longe dos brasileiros comuns.

Claro favorecedor de brasileiros de perfis claramente identificáveis – senhores de engenhos em pleno Século XXI. Muitos vivem nas metrópoles, tantos outros, nos condomínios do Interior e os piores são os quase indigentes, que pagam aluguel, compram carros a prestações a perder de vista e defendem o status quo como se pertencessem à elite – a faixa mais atrasada em termos culturais. Aliás, a exemplo de uma frase supostamente dita por Herman Göring, chefe da Gestapo e braço direito do Führer (ídolo do Ignóbil Miliciano) – “Quando ouço alguém falar em Cultura, saco o meu revólver” – esses tipos tentam simplificar a expressão ao mínimo de sofisticação, copiam o que lhe parecem mais vistoso, com brilho excessivo e pouco valor.

Como já disse Isaac Asimov: “O anti-intelectualismo tem sido uma ameaça constante a se insinuar em nossa vida política e cultural, alimentado pela falsa noção de que a Democracia significa que ‘a minha ignorância é tão boa quanto o seu conhecimento'”.

É como se todo o progresso tecnológico que operou as mudanças que permitiram que imbecis se pronunciassem e ganhassem alcance seja, ao mesmo tempo, renegado como algo perigoso para os seus planos hegemônicos. Assim como as vacinas tomadas pelos mesmos que a atacam.

Mas, como na frase em destaque, maior é o amor e venceremos pelo amor!

*Texto-declaração de voto, escrito e publicado no Facebook em 28 de Outubro de 2022.

#Blogvember / Ao Destino

Senhor Destino,

o dia amanheceu cheio de expectativas para tantos… Para mim, que estava me deslocando de minha zona de conforto, não. Eu aprendi… ou melhor dizendo, eu desenvolvi o costume de não ter nenhuma expectativa quanto a certas questões que fogem do meu alcance. O meu comportamento é o de um passageiro de ônibus que pode apenas observar a paisagem enquanto se encaminha para o destino programado tendo ao volante um motorista profissional capacitado. É o que se espera.

No entanto, é comum me surpreender com o otimismo que as pessoas têm quando dizem que estarão em determinado lugar em determinada hora. Ao mesmo tempo, esperar que algo dê errado com o planejamento que estabelecemos para chegarmos a algum ponto, seja um sintoma doentio de negatividade. Milhões de pessoas se deslocam de lá para cá de forma quase automática. Não são contadas intercorrências em seus trajetos, suspeitas de atraso ou movimentos inesperados. E ainda bem!… Deve ser horrível viver na expectativa de malefícios. Mesmo assim, me assusto com os que têm certezas objetivas. É como se tivessem o dom da clarividência. “Tomarei tal transporte. Irei para tal lugar. Subirei as escadas da faculdade às 10h10. Me casarei dia tal, com tal pessoa, vestindo tal roupa”.

Como deve saber (já que me tem em suas mãos), trabalho com eventos. Tenho que os agendar antecipadamente. Muitas vezes, meses e até um ano antes. Como casamentos. Eu acho incrível essa convicção de algo que envolve planos de uma vida toda. É como o agricultor que prepara o terreno para colher no tempo adequado. Verifica as previsões climáticas – se o prognóstico é de chuva aquém ou além do normal – se angustiando com antecipação. Mesmo sabendo do que ocorrerá, tenta negociar com os deuses para que não seja prejudicial assim…

Planos para a vida depende de planejamento e cuidado. Para que tudo saía idealmente, conta-se de costume com algo imponderável em resultados que é a . Para as pessoas, ela poderá ser apenas um aditivo psicológico ou um apoio milagroso de forças que impulsionam resultados à frente por si só. Eu, que não me utilizo da nesse sentido, quase como um dado prático essencial ao funcionamento das engrenagens, confio que tudo funcione perfeitamente dadas as medidas adequadas de temperatura e pressão. E só.

Hoje, está missiva começou a ser escrita antes de uma pequena viagem para o interior rumo ao casamento de meu sobrinho. Fomos e voltamos dentro da previsibilidade, mas a estrada guarda perigos visíveis, contando sempre com o jogo de dados em que muitos motoristas apostam a sua vida e de outros a cada mão jogada. Superadas as etapas passo-a-passo, roda-a-roda, não foi desta vez que você, Sr. Destino, nos interpôs obstáculos intransponíveis. Agradeço que a sua mão invisível tenha nos conduzido sãos e salvos.

Até a sua próxima intervenção!

Obdulio

Participam: Lunna Guedes / Roseli Pedroso / Suzana Martins / Mariana Gouveia

#Blogvember / Nosso Traço Falho

Detalhe do afresco A Criação de Adão, pintado por Michelangelo no teto da Capela Sistina entre os anos de 1508 e 1510, a pedido do Papa Júlio II.


Rozana Gastaldi Cominal, em “Mulheres que voam”, apregoa que “não dá para ser perfeito com defeito humano já vem a ser: traço falho”.

A condição humana natural não é exatamente sem defeitos. A velha frase que ecoou por séculos de que “o homem nasce bom, mas a Sociedade o corrompe” é, em si, incongruente ao desconsiderar que a Sociedade é justamente formada por… homens. Não conheço a fundo as teorias a respeito de seu formulador, o filósofo Jean-Jacques Rousseau, mas essa generalização “passa a mão na cabeça” dos seres humanos à priori, os inocentando de todas as possíveis falhas que venham a cometer contra outros da sua e de outras espécies – “criadas para lhes servirem”.

Para justificar essa característica de ser falho, criou-se o episódio da expulsão do Paraíso, porque Deus, em sua eterna glória, nunca cometeria o erro de nos dotar com tantos defeitos. Nesse caso, são os homens a absolvê-lo. Na visão humana, ao longo da História, os homens foram transformando seus deuses em pessoas com o dom da criação, da Eternidade e o poder de interferir na realidade, matar e destruir. Ao contrário do que versa a Bíblia, foi o Homem que O fez a sua semelhança.  

Para nos redimir, outra versão de nossa existência nos coloca como seres evolutivos que passamos por etapas de aprendizagem em vidas seguidas de mortes e renascimentos, até alcançarmos o estágio final em que seremos perfeitos. Artigo de , como todas as crenças, esse desejo que temos de nos eternizarmos, apesar das dores reincidentes, talvez para vivenciarmos prazeres fugidios é, no mínimo, comovente. Por outro lado, o fanatismo de todas as ordens gerados pelas diversas convicções é alimentado por chefes religiosos que ganham em poder ao jogar uns contra os outros na busca das diferenças.

Para o bem da convivência entre as gentes, a vontade de acreditar no imponderável deveria ser exaltada como identidade comum. Mas defeituosos que somos, não admitimos que as diferenças configurem um traço de igualdade. A onda de lideranças políticas que querem destruir a convivência democrática entre as pessoas de posturas desiguais ao que é proposto como norma, creio ser o pior defeito da personalidade humana carregada de falhas. Gera violência e sofrimento.

Para mim, o maior crime propiciado por essa “qualidade” destrutiva em sua gênese é o ataque à Natureza na tentativa de buscar lucro. Queremos controlar o meio ambiente como se fosse um inimigo a ser combatido, como se não devêssemos nos incluirmos como participantes. Abusamos da extração, sem reposição. Sofremos nós, os outros animais, as plantas, o planeta. Mais cedo ou mais tarde, pagaremos o preço. Talvez até consigamos reverter um pouco do estrago e eventualmente voltarmos atrás no caminho do suicídio… Até vermos surgir uma outra falha que parece ser permanente em nossa formulação: o esquecimento. Parece que não queremos aprender com os nossos descaminhos. O que nos condenará a cometermos os mesmos erros novamente.

Participam: Mariana Gouveia / Lunna Guedes / Suzana Martins / Roseli Pedroso

BEDA / Os Santos Inventados, Mas Reais

São Jorge, visto na Lua

Hoje é dia de São Jorge, comemorado com um feriado na cidade do Rio de Janeiro. Assim como São Sebastião se tornou um outro padroeiro da Cidade Maravilhosa, ambos santos teriam vivido na mesma época e contexto, com referências parecidas , ainda que duvidosas quanto às suas existências. A principal característica é que teriam sido soldados romanos do Imperador Deocleciano. Enquanto o primeiro teria se recusado a perseguir e a matar os Cristãos, o segundo teria se alistado para defender e levar conforto aos perseguidos religiosos que, na visão do Império, se constituíam em opositores à organização política, já que transferia a autoridade suprema do Imperador para um opositor da Província da Galileia.

São Jorge (em grego: Άγιος Γεώργιος; romanizÁgios Geṓrgios; em latimGeorgius; entre 275 e 280 — 23 de abril de 303), também conhecido como Jorge da Capadócia e Jorge de Lida foi, conforme a tradição, um soldado romano no exército do Imperador Diocleciano, venerado como mártir cristão. Na hagiografia, São Jorge é um dos santos mais venerados no Catolicismo, na Igreja Ortodoxa, bem como na Comunhão Anglicana. É imortalizado na lenda em que mata o dragão. É também um dos Catorze Santos Auxiliares. No cânon do Papa Gelásio (+496), São Jorge é mencionando entre aqueles que ‘foram justamente reverenciados pelos homens e cujos atos são conhecidos somente por Deus’” (Wikipédia).

Aliás, essa última frase serve para tudo, principalmente quando algo não pode ser provado por testemunhos factuais. Diriam que é questão de . A justifica quase tudo, na verdade. Não desdenho dessa característica humana que faz com que as pessoas suportem as piores agruras. O fato de alguns dos santos chegarem a condição de santidade pelo martírio em nome de algo intangível, invisível a olho nu, é um um dado que me interessa bastante, já que percebo poucas coisas, mas desconfio de muitas outras, por puro sentimento de identificação ou “intuição”.

No caso tanto de São Jorge da Capadócia como de São Sebastião, torturas e execuções ajudaram a enaltecer suas trajetórias através dos fins trágicos. A imagem alegórica do santo sobre um cavalo branco, matando um dragão (representação do Mal) sendo morto por sua lança, o transformou em uma figura mítica, bem afeita as mais variadas acepções fantásticas. A crença humana o fez ser visto até na Lua.

Ainda assim, foram construídas apocrifamente biografias que tentam validar suas existências e atuações. Tanto um quanto outro são santos militares, sendo que a adoção de São Jorge como padroeiro da Inglaterra, assim como de Portugal, talvez justificasse o furor que empregavam na luta para derrotarem os povos que defendiam seus territórios invadidos.

São Sebastião, flechado amarrado a um carvalho.

São Sebastião, acusado de acobertar e auxiliar cristãos perseguidos, foi condenado a ser executado preso a um carvalho símbolo de força moral e física, como o atesta a sua expressão em latim, robur. Segundo alguns relatos, ainda que ferido de morte, teria se dirigido ao Imperador para confrontá-lo, sendo espancado até a morte, tendo o seu corpo jogado em nos esgotos de Roma. Foi adotado como padroeiro da cidade do Rio de Janeiro por um evento histórico: em 20 de Janeiro de 1567, os portugueses e seus aliados — o grupo indígena rival dos Tupinambás, os Temiminós — destruíram a colônia francesa incrustada na região.

Ambos os mártires acabaram por representar vários personagens no fenômeno do crescimento da adoção do Cristianismo como a religião entre os soldados romanos. Mais tarde, a Igreja Católica Romana adotou a formulação de divisões militares romanas na organização de sua estrutura. São Jorge, no Brasil, começou a ser identificado no sincretismo religioso afro-brasileiro, com Ogum da Umbanda, o poderoso guerreiro, dono do ferro e do fogo, que defende a lei e a ordem.

São Sebastião, mais recente, com o movimento LGBTQIA+. Segundo o pesquisador norte-americano Richard Kaye, PhD pela Universidade de Princeton e professor no Hunter College de Nova York, apresenta-o como um soldado “muito amado” pelos imperadores romanos de seu período, que o queriam sempre por perto. O autor insinua que o santo poderia ter sido, mais do que guarda pessoal, amante dos imperadores (publicação da BBC).

Para Maerki, é importante ainda pontuar que São Sebastião “é o santo masculino mais retratado na história da arte”. “E a imagem clássica de seu corpo, seminu, resplandecendo beleza, se tornou simbólico. Historiadores e especialistas como Kaye veem nesse imaginário do corpo sendo retratado com um erotismo, uma espécie de propaganda do desejo homossexual”, analisa. Outra identificação ocorre por ele ser protetor dos perseguidos que defendem as suas causas.

Carrego a convicção que muitos fatos, mesmo que não sejam corroborados por provas científicas ou históricas, eles acabam por se tornar “reais”, pelos efeitos que causam na Realidade e como repercutem no imaginário das pessoas que com elas se identificam. Os documentos normalmente são apócrifos e no caso dos dois referidos santos, para assustar quem quisesse defender a fé cristã, foi decretado que não fossem referidas as biografias pessoais de cada traidor, mas sim as sevícias a que foram submetidos, com requintes de crueldade. De qualquer forma, estou aqui eu a discorrer sobre algo que carrega dúvidas quanto a sua origem, mas têm lugar no mundo. A mesma “fé” que eu trago que o que venha a escrever possa ser lembrado por quem me lê.

Participam do BEDA: 
Lunna Guedes / Alê Helga / Mariana Gouveia / 
Cláudia Leonardi