Presente da amiga e companheira de Nave-Mãe, Marineide. Pode parecer uma simples base térmica para colocar panelas ou formas quentes, mas para mim, representa o Círculo da Vida — em que o fim se confunde com o começo, mesmo porque, não há confusão, há fluição — nem início, nem final, apenas fruição…
Traço e som contínuos, como se não fossem terminar. Bastaria desligar um botão – linha e grito se perderiam no infinito apagado e mudo… Como se estivesse seguindo um roteiro, espero pelo túnel de luz… Que não se abre… Eu me incomodo, mas nem tanto. Estava em paz e não me importaria que permanecesse naquele estado estável de barco a vela em mar aberto sem vento, sol sem quentura, corpo sem frio… Até que… A paz começou a me inquietar… A quietude a me oprimir… A solidão a me assediar – um monstro branco e totalitário. Meus olhos fechados, deslocados de meu rosto amorfo, começam a queimar… Ainda que não respirasse, principio a sufocar… Me pergunto se estou no Inferno – traço de nada. Tento rememorar minha existência passada… Percebo que a perdi… Não sou e nunca fui nada… Expandido por todos os lados, sinto falta da contenção que a minha pele proporcionava. Sinto a ausência do fluxo sanguíneo, da saliva e dos substratos expelidos pelo sistema excretor – sensação vital… Ouço murmúrios, como se fosse o som de um pequeno riacho a passar – pequenas-pedras-que-rolam-entre-margens-sem-fim… Por um instante, volto ao mundo material… Pairando sobre o meu antigo corpo, testemunho pessoas a pressionar o peito do sujeito e atacá-lo com choques elétricos… Sei que não sou mais ele. Entre curioso e saudoso, não impeço (como se pudesse) que continuem tentando… Sei que não conseguirão… Ou não quero que consigam. A ciência total do que me rodeia – o Infinito – enceta me trazer felicidade… Em contagem regressiva, dou o passo traçado desde o início do meu tempo – o desenlace – o traço final. Antes de me perder no Nada pleno, ainda ouço: “Hora do óbito – Oito e oito”…
Como moscas no café da manhã… voo… Trajetos curtos, ao final de minha vida – torradas e manteiga. Desculpem a confusão de entendimento – não sei se sou eu mesma ou quem me observa… Consigo, enquanto morro, ser qualquer um. Nasci larva, vivi a flanar, em zum-zuns, a beijar lixos ricos e dejetos, termino os meus dias triunfalmente, em tapete vermelho…