1º. / 08 / 2025 / BEDA / Estado De Negação

Acima, temos a imagem do monumento de Abraham Lincoln. Foi o 16º presidente dos Estados Unidos da América, liderando o País na sua maior crise interna, a Guerra Civil Americana, preservando a integridade territorial, ainda que tenha suscitado uma certa divisão ideológica entre o Norte (União) e o Sul (Confederação). Ocasionado principalmente pela abolição da escravatura defendida pelo Sul. Desde então, os EUA se tornou o centro da atenção do resto do Mundo. Terra prometida, recebeu imigrantes de todo o planeta que os ajudaram a prosperar e criar expectativas como exemplo de desenvolvimento tecnológico, social e ideal capitalista.

Durante os séculos subsequentes após a Guerra de Secessão, o crescimento do País abarcou possibilidades jamais imaginadas antes, servindo de modelo a ser alcançado. Até que… um suposto homem de negócios infalíveis que, de fato quase chegou à falência sobrevivendo ao cometer uma série de transgressões contábeis, manteve o seu império e, vaidoso, assumiu o desejo de se tornar o homem mais poderoso do Mundo. Conseguiu se eleger uma primeira vez e após um interregno de quatro anos, voltou a se eleger, algo que só não aconteceu por um centímetro.

Hoje, o Agente Laranja, em seis meses, conseguiu transtornar todo o sistema econômico que o próprio EUA ajudou a expandir. Foi uma iniciativa esdrúxula resultante por ter dormido sobre a ideia de que fosse hegemônico. Tendo o maior mercado consumidor mundial, passou a sobretaxar os produtos que chegam aos EUA numa espécie de chantagem comercial. As últimas notícias são mais graves ainda, pois deu ordens que submarinos nucleares se posicionem perto da Rússia após um entrevero verbal com o ex-presidente russo Medeved, um sujeito tão linha dura quanto o Agente Laranja é imprevisível.

Quer dizer que um homem repugnante em quaisquer termos, incluindo o moral, está colocando o planeta em suspensão também no sentido bélico. É tudo tão assombroso que a tentativa de intervir no Brasil com a nítida intenção de auxiliar um aliado ideológico de viés ultradireitista é até leve diante da tentativa de colocar uma outra potência nuclear contra a parede. Fico pensando se Abraham Lincon poderia imaginar que um dia, no futuro, o maior mandatário do País fosse um bucaneiro que brinca de desgovernar uma nação inteira, enquanto fatura, com as suas resoluções, bilhões de dólares ao apostar contra as moedas dos países sobretaxados.

12 / 02 / 2025 / Grana*

*Há dez anos antes, escrevi:

“Apenas hoje, ao passar pela milésima vez, ou mais, por aquela esquina, foi que percebi a sequência de edificações ocupadas para diferentes finalidades — um estiloso motel, uma agência bancária e a unidade de uma igreja cristã. Pensei em fazer uma observação atilada de como aquele espaço expunha o poder das necessidades básicas dos sentidos, dos sentimentos humanos e do desejo de poder pelo poder, passando pela feição espiritual e ou educacional.

No entanto, uma faixa de “Aluga-se” na frente da entrada do prédio onde ficava a igreja, me demoveu momentaneamente de fazer um comentário de efeito moral. Ao final de tudo, niilistamente, não deixo de constatar que esta é uma cidade em que reza a grana e qualquer outra coisa vem a reboque.

Como já disse Caetano é “… a força da grana que ergue e destrói coisas belas…”. Caetano compreendeu bem o processo que permeia as relações em um lugar como Sampa, para usar um codinome que ele consagrou para esta cidade. Mesmo porque, quando mudou para cá nos finais dos Anos 60, veio justamente atrás da sobrevivência financeira e da divulgação de seu trabalho musical. A aparente contradição reside no fato do dinheiro que enquanto ergue belos monumentos, enterra a História — exemplo determinante da personalidade deste lugar.

Não tirei foto porque trata-se de instituições particulares, principalmente o banco, com o apelo de sua fachada. Mas a configuração é esta — um motel em estilo kitsch, como tem que ser, dividindo o muro com o banco, que divide o muro com a igreja batista que, junto com escola que mantinha, mudou de endereço — sexo, dinheiro e fé — ainda que pé quebrado…”.

BEDA / Assediados E Assediadores*

Poderia não comentar, mas não há como ficar isento nessa questão de assédio que tomou conta de nossas conversas deste ontem. Como sabe quem me conhece, tenho três filhas. Sempre tomei o máximo cuidado para não passar preceitos machistas, apesar de brincar com as possibilidades com a questão do sexismo. A Tânia, como muitos também sabem, é uma mulher ativa e consciente. Igualmente, mostrou através de seu exemplo, o quanto uma mulher pode se colocar como profissional e cidadã independente em nossa Sociedade que é, em vários aspectos, retrógrada.

É no âmbito familiar que vemos surgir o comportamento ultrapassado e incongruente do homem brasileiro que crê que a mulher está ali para servi-lo em todas as instâncias. No caso da moça que denunciou o caso de assédio de José Mayer sobre ela, Susllem Tonani, muitos especulam sobre a demora da denúncia. Na minha opinião, se deveu por vários motivos — a posição de poder do assediador em questão, a dúvida que surge entre o elogio puro e simples e a ação do avanço realizado, até o episódio que culminou com a decisão de levar adiante o caso, quando foi agredida verbalmente diante de colegas de trabalho — equipe técnica e outros atores.

O fato dela ter colocado a situação de forma aberta através da mídia eletrônica talvez tenha sido o recurso que encontrou porque, provavelmente, essa situação não é inédita. Ou somos ingênuos em acreditar que tenha sido o primeiro caso de assédio no âmbito de trabalho global e outros? Trabalho no meio e sei que o assédio não se dá apenas em uma direção, mas de forma inversa também, bem como de homens sobre homens e de mulheres sobre mulheres.

Então, vemos ultrapassar a situação de assédio sexista como o assédio que acontece por derivação de posições de influência — o moral —, que é, infelizmente, muito comum no ambiente de trabalho e, obviamente, familiar, na Sociedade brasileira. Dessa forma, devemos todos rever as nossas posições diante dessas circunstâncias específicas e perceber o quanto somos, muitas vezes, assediados e assediadores, em termos morais, raciais, sociais, etc. Caso investiguemos mais detidamente as relações pessoais em nossa sociedade, perceberemos o quanto devemos repensar as nossas atitudes cotidianas.

Nada disso acontecerá sem muita dor…

*Texto de Abril de 2017

Foto por Anete Lusina em Pexels.com

Participam: Lucas / Suzana Martins / Alê Helga / Lunna Guedes / Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Cláudia Leonardi / Dose de Poesia / Danielle SV

O Assediador

Quem o olha de relance, estando só, sem saber o que faz, poderia dizer se tratar de um homem comum, talvez um executivo, vestindo de forma desleixada um terno caro. Se o visse cercado de seus comandados, logo perceberia que quem gira em seu entorno mantém um olhar atento, até nervoso, para o atender em seus mínimos gestos e intenções. O sorriso público esconde uma postura de um ser que não admite menos do que uma reverência de súditos para um rei. A exceção que abre é para o Imperador supremo, aquele que, apesar de ser maior em poder, é tão pequeno quanto ele, e lhe dá sustentação em sua administração em que o terror domina as relações humanas.

O Assediador se sente à vontade para avançar em sua pauta de monstro devorador de paz. Predador no topo da cadeia alimentar, feito um tubarão que encontra seu local de caça, quando está para chegar as presas fogem, os corredores se esvaziam, os banheiros se tornam celas de refúgio e apenas os desavisados topam de frente com o sorridente perseguidor de mulheres e homens, enquanto os cúmplices fazem questão de obter a sua atenção. Aos subordinados, a palavra dura e chula de quem quer demonstrar autoridade pela força do xingamento. Para as subordinadas, a ignomínia da palavra doce, o gesto delicado, mas invasor, a insistência na dominação dos corpos como referência. Como se fosse um galo solto no galinheiro, quer espargir o líquido de seu poder, como se participasse do coro dos anjos, impondo a soberania de seu desejo.

Criado no caldo de cultura do Patriarcado, encontrou no cargo de um governo exemplar nesse tipo de política, as circunstâncias especiais para que pudesse estar como “um pinto no lixo”. Foram anos em que pode exercer seu domínio sem que houvesse qualquer impedimento ou ressalva, até que se tornou tão sufocante que houve a iniciativa de alguns para que tudo mudasse. O assédio moral e sexual é parte de um grande concerto que foi permitido e até incentivado como demonstração de qualidades que deveriam fazer parte do perfil de comando. Para o homem crescido nesta Sociedade é quase natural que aja, diga ou minimamente insinue e por fim imponha esse caráter de “domínio superior”. Em alguns casos, há mulheres que assumem essa postura impostora imposta por tradição de chefia machista, “batendo o pinto na mesa” metaforicamente. Como se o falo fosse sinal de potência. Para todos nós, é muito penoso mudarmos as nossas ações e mentalidades, acostumados que fomos, desde a família na mais tenra idade, a estarmos cercados de tantos maus exemplos.

O importante é que mudemos de Política – a arte da convivência, segundo os gregos – para arejarmos nossos ambientes familiares, amistosos e profissionais. O organograma deve atender um direcionamento, com certeza. A linha de comando deve ser mantida, porém a prática deve obedecer a um bem maior, a do respeito à pessoa humana. Que o sorriso não seja de escárnio. Que a alegria não se dê por um malfeito. Que a felicidade de alguns não seja obtida à custa da expropriação de direitos da maioria. Que a revolução se dê na consciência de cada cidadão brasileiro. Que os assediadores sejam punidos por assédios morais, sexuais, comportamentais.

Parece que novos ares se avizinham no horizonte. Que 2023 não sejam números que apenas apresentem mais do mesmo dos últimos anos. Caso contrário, será cada vez difícil respirar, prática e socialmente, neste País.

Foto por Brian Jiz em Pexels.com

Notas Sobre Violência e Morte (2016)

Brasil registra o maior número de assassinatos da história em 2016; 7 pessoas foram mortas por hora no país…

Tenho postado aqui, no WordPress, meus escritos espalhados pelas redes sociais, principalmente pelo Facebook, além de textos – crônicas, contos, poemas – produzidos para a Scenarium Plural – Livros Artesanais, em livros autorais pessoais, coletivos e para a Revista Plural. Meu objetivo precípuo é o de montar um mosaico que busque definir minha trajetória como escritor. Uma tentativa de encontrar um norte, uma linha mestra que, acima de minhas convicções cambiantes, explicar para mim mesmo e, eventualmente para quem me lê, a realidade que nos cerca, pelo olhar de quem fui-sou. Talvez, por fim, identificar os caminhos pelos quais viemos a trilhar na atualidade-passado-futuro. Abaixo, mais um desses registros.

“A segunda-feira acordou duvidosa, mas logo mostrou a sua cara – fria e chuvosa. Saí para resolver problemas bancários e voltei a tempo de ouvir e ver o noticiário na TV – áudios vazados, estupros coletivos, acidentes automotivos fatais, um gorila assassinado…

Os áudios vazados demonstram mais do mesmo: o poder é buscado pelos supostos protagonistas, mas são os soldados do chamado “segundo escalão” que dão o tom da canção de cabaré que toca no antro dos nossos políticos profissionais. Nesses cabarés, que alguns também chamam de palácios, os personagens trocam de pares, enquanto as músicas interpretadas seguem o padrão do nosso sistema viciado. Ao final de cada dia, o resultado é que acabamos todos fodidos.

No episódio dos trinta e três contra uma, para além do descalabro moral da situação, a indigência de nossa sociedade se mostra em todas as suas piores facetas, do alarde dirigido pelos interesses de quem denuncia a “cultura do estupro” até as opiniões daqueles que desconfiam da história mal contada… Existiu um estrupo coletivo, como devem ocorrer vários iguais frequentemente, mesmo que não nessa dimensão, mas a desconfiança dos detalhes em torno do fato denuncia que o problema é bem mais amplo do que aparenta ser. Desconfiamos de tudo.

Esse não é apenas um processo que vem de cima para baixo, como igualmente no sentido contrário, que se espraia desde os atos mais comezinhos do cotidiano até as grandes negociatas. Somente quando encararmos o fato de que temos uma cultura da corrupção, poderemos enfrentar o problema em todas as frentes. A questão é estrutural. Há possibilidade de haja realmente uma cultura voltada para violentar as mulheres? Sim, há! Como também há uma cultura compartilhada para humilhar os homens, menosprezar os velhos, aviltar as crianças e usar a todos nós como massa de manobra econômica, ideológica, mental e espiritual.

Mais um acidente automobilístico matou alguém mais conhecido – um cantor sertanejo. Na edição do noticiário, vincularam o seu nome ao de outro, mais afamado, numa tentativa canhestra de reacender a comoção popular em torno do evento. Contudo, no final de semana prolongado, outro acidente, na Bahia, matou uma família inteira – pai, mãe e quatro filhos. Em uma tentativa de assalto, em São Paulo, com uma pedra atirada contra o vidro do carro por um grupo de bandidos de beira de estrada (como os que existiam na Idade Média europeia), um adolescente que iria visitar a família foi morto quase imediatamente. Ganharam pouco espaço, porque sentimos que tudo é tão prosaico, tão linear… Mais um indício de que estamos doentes.

Todavia, como a contrapor às más notícias brasileiras, chegou outra bem triste, vinda via satélite dos Estados Unidos, sucedida em circunstâncias limites. Para defender a vida de uma criança que caiu no fosso de um zoológico de Ohio, atiraram para matar o velho gorila, que parecia apenas querer guardá-la dos olhares alheios. As discussões em que se contrapunha a dúvida se deveriam ser usados dardos tranquilizantes na ação e a acusação feita à mãe do menino de estar desatenta no momento em que ele ultrapassou o gradil de proteção, são apenas circunstâncias subjacentes em relação à realidade de que nós retiramos um parente do ser humano do seu habitat e o gradeamos em um espaço exíguo, a cobrar ingressos para vê-lo, sem liberdade e acuado. A maior tristeza se dá porque não protegemos o nosso irmão em seu próprio ambiente natural. Na verdade, o estamos deixando sem um lugar para viver, caso voltasse. Cercá-lo em fossas e grades seria uma maneira de protegê-lo de nós… até decidirmos matá-lo.”