*Em 2014, escrevi: “Voltando a ser adulto aqui no Face, se bem que com uma foto tirada em um lugar que me remete ao melhor da minha infância, junto ao Mar. Nessa faixa de areia, em vez de ser o velho, me torno um com os elementos — o fogo do Sol que me abrasa, a brisa do oceano que me refresca, a areia que me sustenta o pé (ainda que de forma deslizante) e a água salgada, que ainda será o futuro do Planeta Terra, assim como foi no passado”.
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29 / 06 / 2025 / Poentes No Cais

Sentado no cais,
todas as tardes,
eu me coloco a observar a linha do horizonte…
Lusco-fuscos da minha perdição…
Todos os dias,
a essa hora,
há essa hora
em que revivo o momento da despedida…
Ela se foi…
sem ter a delicadeza de desaparecer
em barco a vela silente…
Foi para o continente,
célere como o pendular instante,
em ronco de motor potente…
Fiquei na ilha, ilhado…
Solidão por todo o lado…
Em dias nebulosos,
não há diferença entre o firmamento
e o mar,
entre a noite que chega
e o dia que vai…
Então, me sinto melhor…
Porque mergulho em um mundo
de oceano sem fundo,
um buraco negro,
de luz abduzida…
De nosso amor,
restou pores de sol,
tempestuosos e brilhantes,
de raios fugidios,
figuras de corpos esguios…
assim como o seu,
que espero voltar,
até anoitecer
ou o Tempo acabar…
Arpoador
quero… desejo… vou de encontro… invado… devagar…
passos silentes sobre a areia e a pedra…
o meu corpo recebe em ondas as águas mornas do abraço marinho
desta manhã que se anuncia receptiva ela também me deseja
as águas se mostram aparentemente turbas rebeldes
consigo ler a sua dinâmica de mulher apaixonada fogo em forma aquosa
os meus membros a penetram como um cavaleiro de espada em riste
em uma batalha que já perdi sei desde o início mas guerreio
fardo de homem que ao oceano ama e por ele se derrama em sal
eu o decomponho e o absorvo em minha mente
de querer amoroso marolas se disfarçam de amantes
desfaço-me em pequenas porções de moléculas de oxigênio e hidrogênio
o meu ego apartado de mim é lançado no mar profundo
me entrego ao beijo da amada no amanhecer revelador
raios de sol por testemunha
de que sou seu amor morro para esta existência em gozo
transformado em milhões de gotas
a rebater na arrebentação junto às pedras do arpoador…
Projeto Fotográfico 6 On 6 / Anatomia Dos Passos
De supetão, a Lunna proclamou: haverá “6 On 6”! Mal acreditei que já estaríamos no sexto dia de Novembro, sendo que não faz muito tempo, era 6 de de Janeiro. O que fiz foi produzir os passos de um só dia, o de hoje mesmo, uma segunda-feira em que estou no Litoral Paulista (que a maioria chama de Baixada Santista) para cuidar da casa que frequentamos há, pelo menos, 50 anos. Este é um lugar que me remete a um período importante para mim.
Passando pela antiga região do Ipiranga, vejo que as velhas casas estão dando lugar a empreendimentos residenciais em forma espigões — símbolo da anatomia retilínea e sem graça de uma cidade-monstro-transmutante — que usou uma fórmula de cientista louco. A vetusta chaminé, símbolo do antigo progresso que antigamente até parecia feia, mas atualmente ganha contornos de saudade.
Indo em sentido do Litoral pela Rodovia dos Imigrantes, nome mais do que perfeito, passa-se por Riacho Grande, tão grande que parece um imenso lago. Quando eu o vejo, já sinto um frisson com a perspectiva de encontrar muito mais água logo mais — a do mar de amor de menino.
Logo, descendo pela Imigrantes, os contorlitoral
nos da Serra do Mar nos invade a visão e o espanto devocional a desbravadores que a transpuseram para chegar ao alto do Planalto Ocidental Paulista no qual a cidade de São Paulo (nunca) adormece em berço esplêndido, a 725 metros de altitude. Ainda bela e com o mesmo aspecto que os habitantes originais da terra frequentavam quando eram senhores de toda ela, me emociono pelo simbolismo que apresenta.
Após as curvas que abraçam as laterais do promontório, antes dos tuneis longos que adentram a Serra do Mar vislumbro as linhas das cidades litorâneas ao oceano. O Sol como testemunha. Na sequência, por túneis sinto me intrometer no corpo de um ser mitológico. A Muralha silenciosa ecoa o som dos carros que a atravessam sem a minha reverência que me faz pedir perdão por aquela invasão.
Assim que a série de túneis termina, na entrada que tomamos em direção à Praia Grande, à direita vê-se um pequeno conjunto de casas que formam uma tríade de perfeito sonho de lugar. Marca uma visão idílica, uma imagem para onde fugir a imaginação e ficar.
Na casa da praia volto a ser menino, tiro a camisa, decomponho o ser austero, voltado para as tarefas sérias em série que surgem como se fossem minas plantadas para explodirem aos meus pés. Com o celular deixado de lado, vou ao mar, esqueço de mim e de todos em mim. Converso com as ondas e me remodelo ao som de seus rugidos. Hoje, as águas estavam especialmente revoltas, puxando o meu corpo para mais para dentro, me expulsando como se eu fosse um brinquedo jogado por uma criança birrenta. Entendo a sua força, deslizo a favor da espuma ondulante, branquidade em forma de felicidade.
Participam: Lunna Guedes
Braseiro

que fornalha a nossa cama
tapetes sofás assentos mesas chão
refúgios destinos começo meio e fim
alcances enlaces trançados translados
para todos os lados perpassados
mergulhados os corpos um no outro enfiados
combatemos fogo com fogo afogueados
mãos desviadas pés descaminhados
voltados para o centro do universo
nossos seres nós um só em peles enxaguadas
de suores salivas líquidos fluídos
fogareiro em chamas onduladas
escorregamos feito espumas no mar
para o interior do oceano em marés altas
ondas revoltas em ebulição de águas ferventes
quem quer voltar da viagem viajantes
de um só tempo para todos os tempos?
o que sei é que tudo posso
naquela que me possui…
Foto por Yaroslav Shuraev em Pexels.com







