13 / 08 / 2025 / BEDA / Errar

Para compensar o erro de tomarmos a estrada errada, nos deparamos com o outro lado do Pico do Jaraguá — o ponto mais alto da Cidade de São Paulo. Logo depois, retomamos o caminho. Quilômetros a mais, gastos a mais, fruição a mais. Muitas vezes, pagamos por nossos erros com o maior prazer do mundo…

20 / 06 / 2025 / Sabatina da Marineide*

Normalmente não participo deste tipo de sabatina. Não mais. Há pessoas que não gostam de devassar suas particularidades, por mais prosaicas que sejam. Respeito tanto, que não acionarei o 15º quesito: “15. Oito pessoas que acha que também irão brincar?”

Mas, um pedido da minha querida amiga Marineide, não tenho como negar. Sei do seu prazer em brincar, feito eterna criança que é. Apenas não sei se poderei atender a solicitação: “Consegue preencher sem mentir?”. Afinal, no próprio Facebook, apresento como divisa, a frase: “Sou escritor — digo a verdade, mesmo quando minto… Minto, ainda que diga a verdade…” — parece uma moeda com duas caras, mas a outra face é coroa.

01. Qual foi a última coisa que comeu?
R: Salada de fruta.

02. Onde foi tirada sua foto de perfil?
R: Na varanda da minha casa, olhando o pôr do sol.

03. Pior dor física que teve na vida?
R: Dor na parede intestinal, devido a uma colonoscopia.

04. Lugar preferido que já esteve?
R: Sou da praia, gosto da montanha, mas a visita preferida foi ao Planalto Central, a Brasília de Marineide e Luiz Coutinho, onde redefini o conceito que tinha da capital brasileira. Como em Sodoma e Gomorra, pediria ao anjo para salvá-la da hecatombe por causa de algumas pessoas que vivem lá.

05. Até que horas ficou acordado na noite passada?
R: Três horas da manhã, aliás a média do horário que tenho dormido. Tenho acordado às 9h.

06. Se pudesse se mudar para um outro lugar, onde seria?
R: Sou paulistano da Periferia. São Paulo é o meu lugar.

07 – Doce preferido?
R: Doce de banana.

08. Sente saudades da época da escola?
R: Não, especialmente, a não ser por algumas pessoas das quais recordo até hoje. Eu era um estranhíssimo fora do ninho.

09. Você é normal?
R: Normalíssimo. Não somos todos nós?

10. Qual a sua estação do ano favorita?
R: As que vierem, eu traço!

11. Abacaxi fica bom na pizza?
R: Adoro abacaxi. Vou tentar fazer uma com esse ingrediente.

12. Comida favorita?
R: Arroz (por baixo), feijão (na mesma quantidade, por cima), com farofa e banana.

13. Lugar que gostaria de conhecer?
R: Lugar de origem da família da minha mãe — creio que a Andaluzia — na Espanha. Se bem que seria apenas um déja-vù.

14. Último filme que assistiu?
R: Acabei de assistir a “triquetra” filosófica alemã, chamada DARK. Afinal, como todo mundo sabe e já disse Caetano, “só é possível filosofar em alemão”.

Sampa, 470 Marcas / Os Degredados

Estávamos vivendo os anos de chumbo da Ditadura Militar e tudo era “permitido” por parte das forças policiais e policialescas. Como o surgimento dos Esquadrões da Morte. Viventes da Periferia como eu, sabiam que a distância do poder tornava o lugar onde morávamos terra de ninguém. Ou nem tanto, a minha mãe certa vez foi escoltada pelos “bandidos” da rua ao descer do ônibus, ao voltar do trabalho: “Hoje a barra tá pesada, Dona Madalena!”.

Eu tinha acabado de fazer 13 anos em outubro de 1974, quando ocorreu um dos episódios que mais marcaram a minha vida. O guarda-chuva da impunidade abarcava todas as ações das “forças de segurança” como a que aconteceu no dia 19. Policiais do Departamento Estadual de Investigações Criminais cercaram a região do Marco Zero da cidade de São Paulo e apreenderam 97 menores, supostamente infratores.

Certamente, a maior infração que cometiam era a de estarem totalmente abandonados à própria sorte, com momentos descontraídos, como se banharem nas fontes da Praça da Sé. Não havia nenhuma política pública então, assim como poucas foram as iniciativas que se desenvolveram ao longo dos anos que chegasse à raiz do problema para minorá-lo.

Assim como numa ficção distópica, a chamada Operação Camanducaia dividiu o grupo de crianças em dois ônibus para rumarem pela Rodovia Fernão Dias no sentido de Minas Gerais. Eu nem imagino qual teria sido o critério na escolha de Camanducaia para despejarem – literalmente – os jovens nas imediações da pequena cidade. Os policiais civis fizeram os meninos tirarem as suas roupas, rasgaram os documentos dos que tinham, os espancaram com porretes e, sob ataques dos cães, os jogaram por uma ribanceira.

Nus, feridos, e sofrendo com o frio, os menores vagaram por estradas da região, até alcançarem o perímetro urbano da cidade, onde causaram, inicialmente, pânico entre os moradores. O telefone da delegacia local ficou congestionado pela enxurrada de ligações de moradores que relatavam a invasão de um grupo de jovens nus à cidade. Alguns atacaram um ônibus de turismo, outros invadiram estabelecimentos comerciais. Capturados, as prostitutas da cidade, compadecidas, arranjaram roupas para os meninos. Informada, a Secretaria Pública de Minas Gerais os colocaram num ônibus de volta para a São Paulo.

Essa ação gerou tremenda indignação na população, além de muita repercussão pela Imprensa. Para acalmar os ânimos, o então Secretário de Segurança Pública, o famigerado Erasmo Dias, instalou uma sindicância que, um ano após, foi encerrada sem nenhuma punição aos envolvidos. Essa tentativa de resolver o problema da marginalidade infantil, varrendo os garotos marginalizados para debaixo do tapete como fossem os responsáveis por suas escolhas, demonstra a miopia das autoridades. No levantamento feito da condição social das vítimas, apurou-se que cerca de 15 deles haviam sido abandonados pelos pais.

A Operação Camanducaia está para fazer meio século em 2024. Depois de todo esse tempo, o desafio na solução quanto ao desequilíbrio social que estimula o aumento da crise humanitária em plena cidade mais rica do País foi ampliado com o paulatino aumento no uso de entorpecentes mais potentes que deterioram a condição física e psíquica dos jovens a ponto de se tornar quase irreversível. Se na época do triste episódio, os chamados Trombadinhas causavam pânico no Centrão, atualmente a criminalidade infantil se espraiou por outros bairros com o uso de armas e veículos, como motos roubadas.

Enquanto aqueles adictos dos Anos 70 cheiravam cola, hoje o mal supremo são as drogas da linha K-2, K-4 e K-9 – substâncias que produzem efeitos agudos no Sistema Nervoso Central com manifestações clínicas compatíveis com distonia aguda, catatonia e rebaixamento do nível de consciência, com consequentes alucinações, paranoia e agressividade.

Quando assisti a “Pixote – A Lei Do Mais Fraco” (1981), de Hector Babenco, fiquei impactado pela crueza da narrativa. No entanto, percebi vários pontos de contato com a realidade que vivia na Periferia. Muitos de meus conhecidos da época que jogavam bola comigo, tiveram o mesmo destino do ator Fernando Ramos. Estigmatizado por ter feito a personagem central, foi morto pela Polícia Militar de São Paulo, numa ação nebulosa. Pixote o tornou célebre e um símbolo que precisava ser eliminado.

A existência de resquícios do Regime Militar na administração da segurança pública em São Paulo demonstra o quanto são repetidas fórmulas que não conseguem lidar com as mazelas do Sistema, apenas combatendo os seus efeitos com violência, sem resolvê-los. Enquanto a pilha de corpos de vítimas e vitimados aumenta de tamanho, especulo que chegará o dia em que Padres Lancelottis, sejam quantos forem, continuarão a enxugar gelo, a limparem feridas que nunca cicatrizarão. E os degredados da consciência social caminharão feito zumbis pelas ruas e adentrarem pelas fontes d’água da Praça da Sé… que já não existem mais…