28 / 11 / 2025 / Blogvember / Subi As Escadas Da Noite…

…. a lua por testemunha as luzes citadinas não atrapalharam
a minha visão do esplendor estelar quase como se fosse um presente
de algum deus noturno
olha observe a minha grandeza o universo à disposição de sonhar
o quanto quiser ou puder imagine como quando criança peter pan
e os meninos perdidos a enfrentar homens maus feito o capitão gancho
o pó de pirlinpimpim nos dando a faculdade de voar por entre os astros
escapar da fome da miséria da dor das diferenças impostas por impostores
da violência apenas porque tem o “defeito da cor” dos pusilânimes
que se dizem messias o enviado que tripudiou dos doentes
dos desvalidos dos empobrecidos a combater ao lado dos empobrecidos de espírito
enfim encarcerado mas ainda por alguns reverenciado
porque os descerebrados se reproduzem como mosquitos
ainda farão muito ruido produzirão zumbidos em série vezes xis
espalharão o mal por estradas atulhada de zumbis…

Participação: Lunna Guedes

Foto por Min An em Pexels.com

24 / 04 / 2025 / BEDA / Refugiado*

O meu lugar de refúgio preferido era o galinheiro, onde ficava muito tempo a observar o movimento desses seres que passei a admirar muito mais quando os descobri descendentes de dinossauros — as galinhas. No início, escolhia um ponto equidistante para que pudesse apreciar seus movimentos, além de pintinhos e galos, sem assustá-los. Quer dizer, um galo e jovens frangos que logo deixariam o ambiente para impedir que entrassem em luta com o pai pelo comando da galinhada. Sempre desconfiados, os galos não se deixavam tocar, mas com o tempo algumas galinhas começavam a se aproximar justamente para receberem um carinho nas diminutas cabeças. O que ocorria quando colocava ração e quirela nos comedouros. Uma parte que especialmente me divertia era quando as soltava para o quintal mais amplo. Elas saíam em desabada e desconexa carreira, como se fossem adentrar ao paraíso. Era algo frequente, mas sim quando precisávamos que os matinhos que cresciam fossem aparados.

Em certa época também passamos a criar patos. A pataquada tinha um comportamento diverso, mais arredio. Ver os patinhos entrarem na piscininha improvisada com bacia que coloquei no terreno me divertia. Ajudei a nascer diversos pintinhos e patinhos. Só intervinha quando os bichinhos demoravam um pouco demais na quebra das cascas. Muitas vezes, quando percebia que uma galinha sumia, procurava esconderijos em lugares insuspeitos até descobrir ninhos de dez a quatorze ovos sendo chocados há dias suficientes para que não servissem mais ao consumo. A espera para a eclosão dos pintos eu verificava cotidianamente. A evolução da choca era uma tarefa que me entretinha. Pedia licença à mãe para verificar como estavam os ovos, ao qual ela normalmente respondia com um típico som de reclamação. Aliás, através da minha experiência com as galinhas e patos, passei a distinguir as suas várias formas de expressão.

Os galináceos são aves que normalmente não voam ou têm voo curto, a não ser que deixemos que lhe cresçam as asas, às quais cortava com todo o cuidado para atingir apenas as penas. Aos dezesseis para dezessete anos, me tornei abstêmio de carne. A primeira que deixei de comer foi justamente a de galinha. Uma homenagem tardia àquelas que foram tão importantes na minha infância e adolescência. Com a criação delas, sobrevivemos graças aos ovos, além da venda para consumo de sua carne. Houve um período em que eu pensei ser granjeiro ou dono de sítio com pequenas produções de alfaces hidropônicas, bichos da seda, com a produção de energia através de biodigestores. Comprava edições com novidades da produção rural e mantive esse desejo durante anos. Enfim, o menino da cidade, acabou por vencer o imaginário homem do campo.

*Esses momentos de refugiado do mundo normal me foi despertado pelo belo texto de Lunna GuedesUm antigo esconderijo. Quando a resposta começou a ficar longa demais, decidi colocá-lo neste formato.

Foto por Brett Jordan em Pexels.com

“A” O Pipa

Uma pipa ficou pendurada na beira do telhado da varanda da minha casa. Estava inteira, mas com o tempo, rasgou aqui e ali com o movimento do vento ocasional. Vê-la presa, qual um pássaro que se debatia amarrado a uma armadilha, fez com me apiedasse e a retirasse de onde estava. Não era um artefato de beleza especial e decidi destruí-lo. Cometi o erro de virá-lo e perceber os detalhes de sua confecção – as varetas bem-posicionadas, as linhas de costura as alinhando devidamente, o papel de seda delicadamente colado a elas. Quem fez a pipa, além da habilidade, supus que tenha juntado sua energia às forças antigravitacionais da imaginação que antecipou vê-la singrar o mar dos céus – uma obra feita para voar.

Isso me inspirou um poema que colocaria mais ou menos nesses termos, mas o voo da pipa mudou a sua trajetória quando publiquei a foto.  Uma amiga me questionou se sabia dos últimos acontecimentos referentes a acidentes graves provocados por pipas. Na verdade, não são as pipas que devam ser condenadas, mas quem as utilizam com linhas besuntadas de cerol – uma mistura cortante de pó de vidro e cola de madeira – para colocá-las ao alto.

A intenção de quem faz isso é, supostamente, se defender de outras pipas igualmente preparadas para cortar as linhas adversárias.  De diversão inocente, a atividade inventada pelos chineses há milênios de anos se transformou em luta aérea. São empinados pipas como se fossem aviões da Segunda Guerra em movimentos ousados – mergulhos, rasantes, embicadas – para defender os seus territórios sobre os Oceanos de ruas.

Tudo bem, se essas pipas não descessem ao nível da terra dos mortais e provocassem acidentes fatais ao cortar pescoços de motociclistas, ciclistas e pedestres. Nos “menos” graves, há casos de mutilação de dedos. Além de haver relatos de acidentes com aeronaves e paraquedistas. Tudo é muito triste, se considerarmos que o espírito de competição engendrado pelo Sistema sob o qual vivemos não estimulasse aos homenzinhos “ganharem” o espaço azul como únicos soberanos.

Não foi por outro motivo que nas oportunidades que surgiram de empinar pipas com as minhas filhas, evitei. Imaginava que como não me defenderia usando “cortante”, a cada uma que colocasse no alto, ocorreria uma perda para a distância, lenta e decepcionante. Outra coisa sobre o qual Farfalla me chamou a atenção, é que chamava o objeto em discussão pelo artigo masculino – “o” pipa.  Conjecturei que talvez fosse uma imposição inconsciente do Patriarcado recebida na meninice sobre algo de tamanho poder – voar para além do corpo.

A Mariposa

Logo no primeiro dia em que estava na praia um simplório episódio me impulsionou a voar. Conversava com a minha sobrinha. O meu braço se estendia em direção às ondas do mar. A brisa chegava em invisíveis frequências sonoras quase surdas. Eu devia estar falando alguma insensatez. Eis que em voo tracejado pelo destino, estacionou em minha pele sob o sol, um tipo de mariposa soube em pesquisa por imagem feita pela Verônica.

Rapidamente, recolheu as asas abertas internas sob a externa, de proteção. Talvez ela tenha sentido que tenha chegado a um porto seguro, tão longe da vegetação. O leptóteno pousado em meu braço pareceu não querer se mover. Depois de um minuto, delicadamente eu coloquei o indicador sob as suas patinhas e a transportei para o cabo do guarda-sol.

Eu a deixei e fui às águas como o menino que me torno, enfrentar as vagas em mergulhos curtos como um golfinho-criança ou um jacaré-mirim. Quanto ao ser que vive de mariposar, ao voltar já havia me esquecido. Naquele momento. Depois, por algum motivo, ela começou a adejar pelo meu pensamento. Busquei simbolismos que pudessem me indicar alguma mensagem. Encontrei que, a depender das cores, elas simbolizavam possíveis acontecimentos, bons ou ruins. Assim como tanto pode ser o nome dado a uma joia ou pode ser outra designação dada a quem pratica a prostituição.

Achei pertinente a sua associação com a vida carnal — nascer, se desenvolver e morrer — e os ciclos na vida desse inseto, que nos remeteria não apenas a superação às limitações físicas, mas também às espirituais. “A morte, no contexto da mariposa, simboliza o fim de um ciclo ou de alguma limitação que já não precisa fazer parte da nossa vida”. O que sei é que me senti distinguido. Sou assim. Tento transcender em vida, tento elevar o meu sentimento para além do comezinho cotidiano. Isso não significa que haja assim o tempo todo. Sei distinguir as realidades. Sou funcional. E sou espiritual.

Eu me permito sair de mim de vez quando. Faço por onde me colocar no lugar do outro. Sofro muito. Mas não conseguiria agir de outra maneira. Sei que também devo proteger as minhas asas internas assim como a minha capacidade de voar sem me alienar. Essa é uma batalha que luto desde garoto. Depois de ultrapassar as fronteiras do imediato, não há como retornar, ainda que possa acontecer de surgir dúvidas e tentações de ser menos do que podemos ser.

O pequeno ser me enviou um recado. Viajei? Sim, para além de mim, em dia quente, Sol a pino, sabendo que as nuvens toldariam a luz, as chuvas se precipitariam, as ondas se enfureceriam, as tempestades ocorreriam. São os ciclos que devemos superar. É a vida que continua a voar…

Projeto Fotográfico 6 On 6 / Nostalgia

Eu diferencio Nostalgia de Saudade. A primeira palavra designaria um sentimento vago e abrangente de lembrança, um tanto melancólica de uma determinada época ou circunstância. A segunda, para mim, significaria um sentimento mais específico quanto à pessoas ou lugares, normalmente inspiradora e alegre. Porém, saudade também é bastante utilizada para designar sentimentos amargurados de solidão quando ao objeto de afeição. Por isso mesmo, é comum que confundamos as definições, mesmo porque são sentimentos imbricados, ainda que Saudade seja um idiomatismo da língua portuguesa. Nesta postagem, posto momentos específicos que me trouxeram boas lembranças e, nesse caso, a nostalgia se apresenta contagiada pela saudade.

Imigrantes andinos (2017)

Das personagens que encontramos por aqui… Todos os povos têm chance de se expressar culturalmente em Sampa, onde encontramos pessoas de todas as origens, de todos os tipos, de todos os cantos do Brasil e do mundo. Quem disser que esta terra não acolhe e não congrega quem aqui chega, está mentindo e quer criar a ideia de um separatismo que só é professada por alguns, uma absoluta minoria. Afinal, quem, entre a maioria de nós que vivemos aqui, não descende de povos de outros lugares?

Dona Georgete, primeira da direita para a esquerda, que comemorava os seus 90 anos, sentou-se com suas amigas de frente para a pista e viu a juventude dançar… Não acho que fosse com inveja. Pela retrospectiva apresentada na festa, concluo que ela não tenha ficado devendo em nada quanto às possibilidades que a vida apresentou a ela e agora apenas aprecia com prazer o ciclo a se completar…

Escada inventada por Santos Dumont (2017)

Este modelo de escada foi inventado por Santos Dumont. Cada degrau cabe apenas um pé. Ela é propícia para passagens estreitas, além de muito interessante para supersticiosos. Em se colocando o primeiro degrau para o pé direito e o último para o pé esquerdo, sempre o pé direito será aquele que iniciará o passo, ao descer e subir. Ela está instalada num palco suspenso de um buffet, onde trabalhei bastante. Quanto a Santos Dumont, é mais conhecido como um dos primeiros a desenvolver um modelo de avião e foi o criador do relógio de pulso. O sujeito era um gênio!

Dulce & Chiquito na gaiola (2016)

Quem está solto? Quem está preso?…

As calopsitas (que já partiram) passeiam pela gaiola a se sentirem seguras, mesmo com a aproximação de supostas predadoras (uma delas também já partiu). As plantas do jardim estão cercadas para que elas não sejam prejudicadas por invasores. Na verdade, se tivermos a clarividência necessária, nós, os animais humanos, não estamos em situação muito diferente. Da mesma forma, nós nos imaginamos protegidos por grades nas janelas, portas e portões de ferro… O que diferencia uns prisioneiros de outros? O que é liberdade?… Desde quase sempre, somos seres presos a uma estrutura em que somos mercadores da vida e da morte. Porém, para além do jogo das aparências, alguns dizem que existe um mundo livre de todas as amarras e condicionamentos…

O estudante de Educação Física, no Clube Spéria (2010)

Iniciei em 2009, aos 47 anos, o curso de Educação Física, na UNIP. Formei-me Bacharel em 2013. Neste registro, faço uma das etapas da sequência pedagógica do salto à distância, neste caso, com o auxílio de plinto (plataforma de madeira), na aula de Atletismo do Profº. José Luis Fernandes, mestre do Ensino e da Vida.

O menino passarinho e seus companheiros de salto (2016)

Em 13 de Abril de 2016, esta turma que está comigo na foto, vivemos juntos a experiência de saltar a 12.000 pés. Eu, que costumo apreciar as nuvens e o céu com os pés bem fincados no chão, cheguei um pouquinho mais perto dos meus objetos de culto. Do alto, vi os veículos, as casas, os animais, estradas e rios diminuírem de tamanho, até voltarem a crescer. Foi a primeira vez que saltei, mas tudo pareceu estranhamente familiar, já que quando era garoto, a experiência de voar era constante, em sonhos…

Isabelle Brum / Lunna Guedes / Mariana Gouveia