há crenças mesmo para quem não crê em nada o que já é uma crença há quem acredite de acaso no amor que se transforma em caso quando o encontro se dá há quem não acredite no amor seria uma série de episódios esparsos envolvendo sinais ações visões versões de fatos afeições transitórias e fátuas os corpos não ajudam atrapalham quando se tocam reagem quimicamente os pelos se eriçam as peles se pelam de calor fulgor de fogo paixão querência desejo falta versus falta a se completarem as bocas respondem as línguas caladas mas ativas os sexos a buscarem satisfação os sentidos em explosão busca de sentido que perde sentido e direção as horas se perdem dos ponteiros não creio em acaso mas nele boto fé os dados sendo jogados à revelia de nossa sofreguidão se encontrando em linhas de aparentes paralelas contra todos os prognósticos dois corações começam a bater no mesmo ritmo desenfreado concorrendo para que um instante se torne eterno marcando memórias recorrentes mesmo que apartadas no tempo e no espaço viver é viver de lembranças encontros desencontros o amor um caso de acaso criado pelo destino de nossos egos tontos…
Vivo quase o final da minha quinta década. Estou, como nunca antes na minha vida, me sentindo em plenitude. Não que tenha tanto fôlego quanto antes, porém nunca tive, como agora, consciência de minhas limitações. Além de certeza de minhas possibilidades… Sei que sou falível. Por isso, me cuido mais e cuido mais de quem está a minha volta. Tento não deixar nada ao acaso. A não ser quando sinto que é o acaso que deva comandar a trama. Como disse alguém deste sertão, “a felicidade se acha nas horinhas de descuido”… Então, antes de voltar para a realidade do sonho, sem cuidado, saltei para a precariedade da vida real. Só não esperava que o mergulho nessas águas sem termo fosse tão profundo, que talvez não possa retornar…
Vivo meus anos 50. Mais um pouco, inaugurarei a sétima edição anual da década. Este decênio foi totalmente diferente do que idealizei. E completaria: graças a Deus! Ao final dos meus Anos 40, tive um episódio de saúde que modificou minha interação com a vida. Cinquenta anos em cinco – emblemática frase de Juscelino Kubistchek – apenas emprestava números ao desejo de fazer crescer o país dos Anos 50, cuja a inauguração de Brasília, no início dos 60, foi um marco. Nestes meus Anos 50 particular, esperarei ter crescido, ao final de tudo, cem anos em dez – a crise hiperglicêmica foi a minha marca inicial, em 2007.
Definir datas como pontos cardinais, com números redondos parece ser uma tentativa para justificar situações que teriam começo e fim, sem causas anteriores e repercussões posteriores – uma espécie de “Big Bang” histórico, assim como anuncia a frase: “nunca antes, neste País…”. O Brasil parece ser uma nação de ciclos, sempre a se repetir, rota sem saída para o mar, com o apoio luxuoso de nossa falta de memória. Tento manter a lembrança daquilo que me levou a enfrentar determinadas situações. Sem isso, não há como saber como cheguei onde estou. Adotei a imprudência de me arrepender apenas do que não fiz. No mais, apesar da tentação de deixar tudo ao “acaso”, se é que ele existe, sei do rumo que tomei. E das consequências que ele gerou.
O contexto em que vivo os meus Anos 50 tem sido incrível. É como se tivesse aberto os meus olhos apenas agora, nos meados do meu século de vida. Eu me deixei levar pela aventura de amar – dizem que o mocinho morre no final. Eu retomei os estudos, entre compromissos profissionais e pessoais. Lancei o meu primeiro livro e estou prestes a lançar o segundo, dia 25, antes que este Agosto se encerre*. Nunca me senti tão pleno, talvez viva o ápice que todos visitam, antes do fim.
Ainda aguardando as surpresas que me reservam esta era, já vislumbro as possibilidades dos Anos 60. A década histórica do século passado, na qual nasci, foi uma das mais importantes dos 1900. De alguma forma, aglutinou todos as potencialidades que vivemos depois. Marcou mudanças estruturais que ainda repercutem nos dias atuais. Guerras (frias e quentes), luta pelos direitos civis, emancipação da mulher, revoluções político-ideológicas e comportamentais, viagem à Lua e a propaganda da ideia do “País do Futuro”, entre tantos fatos possíveis.
Saúdo a todos e a todas que estão chegando aos seus próprios Anos 50. Saberão que a vida ganha frescor, com o início de novos e estimulantes formatos e término de antigos e infrutíferos projetos. Muitas vezes, com pesar, porém com convidativos e bem-vindos significados! Feliz nova década!
*O livro de contos curtos “RUA 2”, editado pela Scenarium Plural – Livros Artesanais (https://scenariumplural.wordpress.com/), será lançado dia 25 de Agosto de 2018, sábado, na Starbucks Brasil – R. Des. Eliseu Guilherme, 200 – Paraíso, São Paulo, a partir das 18h às 20h. Convido a todos!
Carlos, em hora vaga, decidiu entrar na cafeteria para ler um pouco e saborear um cappuccino ou dois. Aproveitou a boa sorte do caixa livre. Fez o pedido, esperou menos do que esperava e se dirigiu ao segundo segundo andar. Sentou a um canto e mal pode abrir o novo lançamento da Scenarium – SADNESS – quando assomou a sombra de alguém logo na primeira página. Ao olhar em direção ao vulto, o passado o atropelou na faixa segurança, feito um caminhão desgovernado. Um tanto desconfortável, reconheceu Regina e se ergueu em sua direção. Estava tão linda quanto à época da faculdade.
Perguntou o que fazia por ali, enquanto a beijava de leve no rosto e a abraçava com força, como a confirmar a existência do fantasma vestido de saudade que o assombrou desde que quis se desencontrar dela. Regina respondeu, com aquele eterno sorriso entre brincalhão e escárnio, que sempre a categorizou: “Passava em frente, quando o vi subir as escadas… Como você está? Pelo jeito, bem! Está bonito…”. Ele nunca soube distinguir quando ela falava sério ou brincava. Sabia que não era mal-apessoado, porém diante dela, nunca conseguiu se sentir adequado.
Fazia sete anos que não a via. A última vez, ocorreu na festa de formatura do curso de comércio exterior. Viajou, logo após. Obteve uma ótima chance de aprimorar o inglês e de tentar fugir daquele sentimento que impedia de manter qualquer relacionamento com mais alguém. Naquele momento, mais confiante em si, tentou rapidamente compreender, na fração eterna de segundos que a olhava nos olhos, porque nunca se revelou apaixonado por ela. Mesmo depois de tanto tempo, voltava a ser o moço desengonçado. Não duvidava que ela soubesse do efeito que causava nele. Sempre suspeitou que gostava de brincar com ele, como a gata faz com o camundongo.
Na Austrália – outras vibrações, outra cultura – sentiu como se fosse uma muda transplantada em novo solo. Finalmente, se reconheceu outro. Lá, conheceu sua futura esposa, outra brasileira, Anna. Após dois anos, voltaram. No Brasil, casaram. Há um ano, chegou Bianco. Montaram apartamento na Santa Cecília. Estavam bem. Vidas sem sobressaltos e sem novidades no horizonte. Até voltar a ver Regina. Lembrou de Ono, um colega que se tornou escritor. Ele lhe falava sobre a Teoria de Tempo Intenso – quando tudo parece acontecer ao mesmo tempo, com força e intensidade inimagináveis. Foi assim que percebeu o quanto ainda a amava.
Mas, pela graça da boca de canto de sereia de seu amor, ela mesmo a salvou de cometer um desatino. Enquanto conversavam sobre o passado – em que enumerou as várias ocasiões em que ficou com boa parte de seus colegas – falou sobre César, então seu melhor amigo. Este, por saber de sua paixão por Regina, prometeu que nunca teria nada com o objeto de sua avassaladora paixão platônica. Ela, aparentemente sem saber desse acordo, falou que havia traçado o seu companheiro de quarto de pensão. Muitas vezes… Lá mesmo, enquanto viajava, em momentos intermitentes. César já não pertencia ao seu rol de amigos. Deu em cima de sua atual companheira, logo que a conheceu. Anna relatou o ocorrido e ele cortou a amizade. Naquela ocasião, imaginou que, eventualmente, tivesse ficado com Regina, apesar da promessa. Contudo, aquela “novidade” o arrasou como se tivesse acabado de acontecer.
Como por encanto, os olhos de Regina deixaram de exercer a imensa atração que levou muitos marinheiros à morte. O que Carlos não conseguiu se atentar foi que ela apenas começou a falar sobre o passado de tragadora de homens, depois que revelou que estava casado, com filho novo, casa montada. Depois de se perceber deixada, sempre desejou reencontrá-lo. Com ele, sempre se sentiu especial. Para ele, reservou o melhor de seus sentimentos. Depois de muitas cabeçadas, distinguiu claramente o que queria. Era Carlos. Como ele não participava das redes sociais, foi difícil localizá-lo. Descobriu onde trabalhava e aproveitou a ocasião propícia para encontrá-lo, por um desses “acasos” do destino. Sabê-lo bem, com outra mulher, filho e lar, a aniquilou. Quis se vingar.
Ao final do encontro, o sorriso de Regina se transformou em risco enrugado. O rosto de Carlos, transparecia autoconfiança. Outro beijo, mais leve e corpos descolados em um último abraço desajeitado. Ele disse que ficaria um pouco mais. Ela se retirou, carregando a dor pela falta que faria a perspectiva do amor do único homem que realmente já a interessou. Ele, voltaria para sorrisinho banguela de seu filho e o conforto seguro dos braços de Anna…