19 / 08 / 2025 / BEDA / Nove Dias

Em 2021, vivíamos um ano em que o País vivia sob a sombra da gestação do Golpe de Estado, o mesmo projeto que o acusado de gestá-lo, nega que o fez. Era Agosto e, então escrevi: “Parte da turma que se reuniu para comemorar mais um ano de vida da Romy, a primogênita da família Oliveira Ortega, mesmo nove dias depois. Porque a comemoração de sua existência é nossa, que a amamos. Neste ano difícil para todos, assim como foi o anterior, superamos vicissitudes extras, mas não há outra opção a não ser caminhar com coragem e determinação. Que saibamos governar o nosso destino, ainda que estejamos embarcados numa nau sem comandante capaz.”

Projeto Fotográfico 6 On 6 / Polaroides

Em 1944, de férias com a sua família, a filha de Edwin H. Land lhe perguntou porque não podia ver imediatamente as fotografias que o pai tirava. Edwin conta que nesse mesmo dia idealizou a mecânica da câmara de impressão instantânea. Três anos depois, veio a público uma tecnologia que transformou um processo que demorava horas, que exigia um estúdio próprio e acesso a químicos de revelação fotográfica, para algo que demorava apenas alguns minutos. Chegou ao mercado em 1948 com o nome Polaroid Land Model 95, que funcionava usando dois rolos separados para o negativo e o positivo, os quais permitiam que a imagem fosse revelada dentro da câmera.

Ainda tenho uma câmera Polaroid guardada em algum canto. As minhas filhas têm uma câmera similar e gostam de brincar de tirar e revelar fotos instantâneas. Mas com o tempo a chegada dos smartphones rapidamente mudou a dinâmica da produção de imagens reveladas quase imediatamente através das redes sociais, de tal modo que a maioria das pessoas sequer pensam em algo diferente. Como não tenho polaroides à mão, compareço aqui com similares para rememorar o último semestre deste ano insano.

Em Agosto, fui informado pelo Facebook que havia ficado noivo da Tânia há 35 anos. Não houve exatamente um pedido de noivado, mas (in)formalmente, essa foi a data em que começamos a namorar. Foi tudo muito rápido. Em Maio do ano seguinte, ao décimo terceiro dia, nos casamos, com o testemunho da Romy, há cinco meses no ventre da mãe. O resto é História.

Em Setembro, estreamos a Primavera mais quente que a Humanidade já presenciou, segundo informes climáticos mensurados por institutos do mundo todo. Entre os negacionistas de plantão, não é algo para se preocupar. Alugados pelos donos do jogo, há quem queira negar que estamos à beira do colapso. Gaia está simplesmente reagindo às ameaças de sobrevivência de todas as espécies vivente neste planeta. Não duvido que se o Homem for um empecilho, a Natureza o colocará em seu devido lugar. Sinais não faltam. Enquanto isso, as orquídeas aqui em casa, se sentindo protegidas, continuam a florescer na Estação das Flores.

Parece incrível, mas apenas há um pouco mais de um ano, em Outubro, surgia Alexandre em nossa vida. O rapazinho todo desmilinguido, desnutrido, mais ossos do que carne, um tanto cego pelos olhos anuviados, de tímido que se apresentou, foi se empertigando. Pudemos perceber que se tratava de um exemplar variante de Pinscher, com todas as características que apresentam — corajosos, leais, cheios de energia, curiosos, divertidos — e guardiões, o que deixa a Lívia, que trabalha parte da semana em Home Office, muitas vezes com gana de lhe dar uns tapinhas na bunda seca. Os seus latidos, para quem passa no portão vazado, interfere frequentemente em suas reuniões. Coloca o pessoal com quem fala no modo mudo e grita para o bichinho impertinente: Aleeexaaandreee!

Bem, Novembro foi cheio de aventuras. Mais um fato recorrente marcou o meu mês. A Tigresa nos deixou na mão na subida da Serra do Mar, na volta de nossa casa da praia. E a Tímida, à caminho de Ibiúna, onde faríamos um evento pela Ortega Luz & Som. O que essa torre de caixa d’água teria a ver? Bem ela marca o ponto onde esperamos o caminhão guincho que nos levaria para o local onde conseguimos chegar à tempo para a montagem e a realização da sonorização e a iluminação da banda para festa de temática italiana. Enquanto esperávamos o transporte, fiz algumas imagens para relaxar. Afinal, temos sempre que tentar ver o outro lado da moeda.

Nesta foto, encontramos, além de mim, Marco Antônio Guedes, Lunna Guedes — mentores da Scenarium — e Flávia Côrtes, que veio à São Paulo direto de Salvador, Bahia, para o lançamento do lindo livro de poemas, Correntezas. Dias após, nos encontrarmos no SESC Paulista e posteiormente fomos ao Café da Livraria Cultura, cercado por livros, como gostamos, onde fiz este registro. A baiana mostrou ao vivo a sua verve, animação, lirismo e alegria de viver que podíamos perceber apenas através do virtual. Uma agradável surpresa de Dezembro e do real!

Participa: Lunna Guedes / Roseli Pedroso / Mariana Gouveia

BEDA / Projeto Fotográfico 6 On 6 / Ah! Gosto Deste Mês!

O longínquo Agosto de 1989 me tornou pai. Mais precisamente do dia 12 para 13 — domingo de Dia Dos Pais — nasceu a primogênita das três filhas da Família Oliveira Ortega, a Romy. E esse “detalhe” foi definidor de uma das características que mais prezo em mim. Creio que seja um bom pai. Referenciado pelo depoimento das próprias.

Apesar da secura climática, mental, social, econômica que sentimos na pele atualmente, este mês nos compensa com visões de crepúsculos espetaculares, devido à luz indireta do que deveria ser um Inverno, mas que tem apresentado temperaturas de Verão, em torno dos 30ºC.

“12 de Agosto de 2020. Este dia existe, o mês também. O ano, já não sei. Estamos vivos, eu, que escrevo, vocês, que me leem. Ou não. Aniversário da Romy, trigésimo primeiro ano de existência, todas as estações vividas aqui, na periferia da Zona Norte. Trinta e uma vezes a Terra girou em torno do sol. Onze mil, trezentos e trinta e dois crepúsculos, contando os anos bissextos. Porque com ela é assim — todo dia é dia de comemoração da energia vital. Parabéns para nós que a conhecemos, meu amor!”

A temperatura política também está altíssima. Estamos às vésperas de um novo pleito para a eleição para cargos executivos e legislativos majoritários. No entanto, como desde há muito tempo, estamos dubiamente polarizados, em que os extremos se tocam na radicalização. A decisão estará com eleitor, apesar de haver quem não queira que cheguemos a escolher ninguém em Outubro. Ou porque pessoalmente não queira ou porque não queiram que as eleições ocorram.

Registro de 2015

Eu gosto muito de treinar musculação. Mas infelizmente, a falta de tempo, antes, e o advento da Pandemia nos últimos tempos, fizeram com que eu buscasse a me exercitar em casa. Depois de uma crise de Tendinite, que me impediu de fazer exercícios superiores por quase dois meses, voltei com atividades leves. Gosto das dores musculares — reflexo-resultado do esforço. No curso de Educação Física, descobri que os sintomas dolorosos é a resposta do corpo ao rearranjo ou adaptação celular, com consequente aumento da capacidade muscular em suportar cada vez maiores cargas e repetições. Diante dos fortões que me viam utilizar cargas baixas, já me perguntaram, meio debochados, se eu estava fazendo Fisioterapia. Respondi com naturalidade: “sim, sempre!”. Não falaram mais nada. Lembrando que com a baixa umidade do ar, a hidratação tem que ser constante.

Média da umidade relativa do ar atualmente — 27%

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o nível ideal de umidade do ar para o organismo humano gira entre 40% e 70%. Acima desses valores, o ar fica praticamente saturado de vapor d’água, o que interfere no nosso mecanismo de controle da temperatura corporal exercido pela transpiração. Além disso, proporciona a proliferação de fungos, mofos, bolores e ácaros. Com a umidade muito baixa (menos que 30%), as alergias, sinusites, asmas e outras doenças tendem a se agravar. Com o desequilíbrio climático pelo qual estamos passando — estiagem extrema em uma parte do Brasil e chuvas torrenciais em outra — causado pelo desmatamento desenfreado, talvez estejamos antevendo o “spoiler” de filme-catástrofe a estrear com “sucesso” nos próximos anos.

Maria Bethânia, fazendo festa na laje, sobre a qual elucubrei sobre o ciúme que sente por mim em REALidade

“… De modo geral, além da inteligência básica, são seres-repositórios de emoções e sentimentos puros e sem medidas. Amor e ciúme, sem dúvida, estão entre eles. Nos cães, a força da irracionalidade se expressa de maneira ainda mais acintosa. Amor, ciúme, posse — onde começa um e termina outro? Há a eterna discussão se o amor é uma construção sociocultural ou uma condição intrínseca aos seres humanos… se a sua base é espiritual ou físico-química, se é algo substancial a ponto de ser verificado expressamente ou uma ilusão mental… Creio que a ligação que desenvolvemos com os outros animais, — principalmente os mais próximos de nós, “aculturados” —, diga muito sobre a própria condição humana. Talvez possa vir a desvendar se o amor e as suas emoções subsidiárias, como o ciúme, revela-nos animais básicos ou, contrariamente, que somos animais confusos demais para sabermos o que sentimos, quando sentimos…” — (REALidade, lançado pela Scenarium, em 2017).

Crepúsculo do início de Agosto de 2022 — Lua Quarto Crescente

Termino esta postagem como comecei — mostrando um entardecer-anoitecer — porém atualizado. Este Agosto promete ser intenso em várias medidas. Todas exageradas. Que saibamos vivenciá-lo com parcimônia de emoções, ainda que dificilmente conseguiremos. Porque mesmo que nos controlemos na aparência, as revoluções vulcânicas internas não deixam de apresentar os seus efeitos em algum momento. Sei disso de forma cabal — o corpo e a mente sofrem as consequências de estarmos vivos e conscientes — benção disfarçada em sofrimento.

Participam do BEDA: Suzana Martins / Roseli Pedroso / Lunna Guedes / Darlene Regina / Mariana Gouveia

B.E.D.A. / Primeira Pessoa*

“Hoje faz cinco meses que meu ano terminou. Prevíamos o fim do mundo. Para alguns milhões, realmente a vida acabou” — escrevi em Agosto de 2020, exatamente há um ano. As minhas atividades profissionais cessaram totalmente e poucas coisas me davam alento naquele momento. Uma delas foi o de estar fazendo um curso com a Lunna GuedesNarrativas Na Primeira Pessoa — que me ocupou a cabeça enquanto extraía da editora da Scenarium o que pudesse me oferecer de seu conhecimento sobre a escrita. O texto a seguir, de meados de *Junho de 2020, é o resultado de um exercício de Texto Narrativo Descritivo em que reproduzo um diálogo com a minha mentora.

Lunna, quando me perguntou, ontem: — Cadê o senhor? Fugiu? — apenas pude lhe falar que aconteceu algo inesperado. O meu dia foi mais nublado do que outros — estas horas sem fim, grudadas umas nas outras, em que os horários não se impõem como antes:  manhã, tarde e noite.

— Meu caro, no meu caso, tenho conseguido me organizar. Tenho sido muito produtiva.

— Acho incrível quando diz que consegue a organizar a loucura. Eu, não. A novidade é que tenho sonhado muito. Dizem que sonhamos sempre. Mas, ultimamente, tenho me lembrado dos sonhos. Outro dia, sonhei que estava na Coréia do Sul, em viagem. Em outra ocasião, que eu era uma mulher e estava grávida. Muitas vezes, me apresento nu diante de muita gente vestida, mas a agir de maneira natural. Assim como todos não parecem se incomodar com minha nudez.

—   Pelo áudio, percebi que não estava bem…

—  Se posso ressaltar um efeito é que acordei sem me recordar do que sonhei. Acho que meus canais se fecharam. Ou minha memória obliterou os acontecimentos sonhados e a realidade se fez mais pesada do que costumeiramente.

— Porém, de modo geral, se sente melhor?

— Acho que sim. Ao contrário de outras manhãs, decidi ficar em silêncio. Realizei as tarefas caseiras mudo e surdo, sem falar com ninguém. Não ouvi noticioso por qualquer meio. Sequer quis ouvir música. Os únicos sons que alcancei foram os latidos das minhas companheiras peludas. De vez em quando, pediam carinho e eu soltava vocábulos e inflexões de nosso léxico particular. O que me deu alento foi a marcação da aula que teria com você, agora à noite, sabendo que seria a melhor coisa que me aconteceria no dia…

Participam do B.E.D.A.:
Mariana Gouveia
Adriana Aneli
Roseli Pedroso
Lunna Guedes
Cláudia Leonardi
Darlene Regina

B.E.D.A. / Agosto*

Romy e eu, em 2017

Eu me lembro de Agosto antes de você. Era o mês indeciso — por vezes úmido, outras vezes, seco; meio quente, meio frio; a luz inclinada a festejar as cores mais absurdas no entardecer. Mesmo os tons de cinza eram mutantes e se percebia o Sol a brincar de esconde-esconde com quem quisesse vê-lo.

Agosto forçava o reinício dos ciclos escolares e abertura do segundo semestre. Desde pequeno, demarcava a volta para o ambiente onde encontrava os meus desiguais. A minha vida de rapaz só tinha futuro, lá adiante, igualmente a gosto quântico — indefinível…

Anos passados por mim, noivei em Agosto e, quase uma volta inteira em torno do Sol após, aconteceu você. Horas antes do Dia dos Pais, então. Preanunciada meses antes, nomeada antes de vir à luz, Romy — a primeira dos Oliveira Ortega. Veio como tinha que vir, inesperada-esperada, carreando tanta energia que mudou tudo ao seu redor.

Este mês, de remediado, se transformou em intenso. Passou a ser o primeiro do resto da minha existência terrena, aquele que me fez homem-pai. Como é incrível perceber o quanto você cresceu, além de qualquer expectativa. Como é inimaginável saber que você sente, além dos nossos pobres sentidos, toda a dor do mundo. Como é extraordinário vê-la renascer, mergulho após mergulho na profundidade do organismo, no ser que é.

Como é insólito conhecer um ente mitológico em plena modernidade — uma leonina Fênix. Como é um privilégio poder amá-la e testemunhar o amor a reverberar para além da linha do horizonte, sem obstáculo a lhe impedir. Como é bom, Romy, ser o seu pai!

Tânia, Romy e eu, em 1989.

*Texto de 2017

Participam em B.E.D.A.:
Cláudia Leonardi
Mariana Gouveia
Darlene Regina
Roseli Pedroso
Adriana Aneli
Lunna Guedes