21 / 10 / 2025 / Eu E Os Catioros

Eu sempre tive cães sob a minha guarda. Tarzan, Gita, Fofinha, Cloé, João foram alguns dos mais antigos e tantos e tantos outros. A minha mãe era cachorreira. Não podia ver um cãozinho perdido ou solto na vida que trazia para casa, mesmo quando não tínhamos tantos recursos. Dona Madalena pegava nos açougues carnes que seriam jogadas fora para que eu cortasse em pedaços e, misturadas a arroz com casca, então desprezado, fazer a comida da turma. O cheiro não era nada bom na grande panela e cortar bucho não era nada fácil. Mas como já era apaixonado por essas criaturas, não deixava de me esforçar para fazer a comida das crianças.

Como já realcei em outros textos, quem adota essas “pessoas”, sabe que terá um tempo menor de convivência devido a duração em anos menor delas. Então, é comum a tristeza nos abater vez ou outra diante das suas partidas. Mas vale a pena termos contato com esses seres especiais, verdadeiros educadores sentimentais. Com eles, aprendemos, mesmo nos pequenos gestos, olhares e comportamentos que podemos ser melhores do que somos. Como a homenagear a minha mãe, uma única vez resgatei um deles — o Alexandre. Já escrevi sobre ele. É o que aparece na primeira foto. Incialmente arredio, hoje me recebe de manhã ou quando volto pra casa com a alegria de quem é sabedor de que é amado. Com eles, me sinto uma pessoa melhor.

06 / 06 / 2025 / Projeto Fotográfico 6 On 6 / Nossa Casa

A nossa casa está onde estamos, senão pelo fato de habitarmos um corpo, também por nossa estrutura mental, moldada pela memória de onde vivemos e com quem vivemos nesse espaço que além de casa — o lugar físico — uma projeção orgânica chamada de Lar. Ter imagens de onde vivemos muitas vezes marca o nosso olhar expandido pelas emoções e sentimentos envolvidos. “Naquele lugar foi onde tive a última conversa com a minha mãe”. Ali, onde mostrei para a minha filha os volteios de uma borboleta pela primeira vez”. Um Lar carregamos em nossa pele, é a nossa referência de vida. Para o bem ou para o mal.

Eu sou fascinado pelas plantas, suas estruturas, ramos, flores e formas. Gosto de ficar observando o movimento de insetos, alados e não, habitam aquela casa. São estruturas que se sobrepõem — a minha casa, a casa das plantas, a casa dos insetos.

Da varanda da minha casa, eu possuo entardeceres. As suas visões me deslocam para além do horizonte e para perto de mim.

Eu sempre quis ter jardim em minha casa. Temos dois. Um junto à casa, outro, este aqui, na parte da frente, à direita de quem entra. Lá cultivamos plantas frutíferas — bananeiras (prata e nanica), ameixeira, limoeiro, laranjeira e uma cobertura de Ora-Pro-Nobis sobre o caramanchão.

Nossa casa também é habitada por alguns bichos residentes permanentes (ou até deixarem este plano), como a Dominic, a última à direita que passou há uma semana. Eles são nossos amigos-filhos-companheiros. Da esquerda para a direita — Bethânia, Lolla, Bambino (meu neto) que nos visita eventualmente, Arya e Alexandre, à frente. Todos eles foram resgatados, a não ser a Dominic, filha de outra linda criatura resgatada — Domitila.

Esta jabuticabeira fica no jardim central, menor que o da frente. Sonho de infância comum meu e da Tânia, ela ainda está em desenvolvimento. Chegará o dia que carregará tantas jabuticabas que teremos que doar. Outro sonho.

Nossa casa é o lugar onde a família se expressa, vive, come, dorme, sonha, descansa, trabalha, cozinha, brinca, briga, se reconcilia. Lugar de expressão vital, neste registro ainda pudemos reunir todos os componentes da família. Há dez anos. Agora, apenas eventualmente, isso acontece. Tendo Van Gogh como testemunha… além de mim, temos a Tânia, atrás de mim, do seu lado direito, a primogênita, Romy; do seu lado esquerdo, Ingrid e Lívia. Imagem produzida na sala de jantar.

Participam: Lunna Guedes / Cláudia Leonardi / Silvana Lopes / Roseli Pedroso / Mariana Gouveia

30 / 08 / 2025 / BEDA / Os Caramelos

Os caramelos têm aqui em casa o seu lugar de fala. Duas delas, são mãe e filha — Domitila, a primeira de cima para baixo e Dominic, sua filha, a primeira em sentido contrário. Esse registro é de 2021. Domitila já nos deixou. As outras “meninas”: Bethânia, Arya, Lolla, além de Dominic, estão vivas. Dominic não está tão bem. Os cerca de 14 anos já pesam na sua mobilidade, além de alguns outros probleminhas típicos da idade. E isso é uma situação de quem cuida de cães ou gatos ou de quaisquer outros animais de estimação, sofrem — o tempo de vida reduzido em relação aos seus cuidadores. É o caso da ideia da inversão da lógica temporal em que os “filhos” vivam mais do que os “pais”. Estes “pais” exercem várias vezes durante a vida a dissolução de conexões íntimas e importantes entre uns e outros. Ao mesmo tempo, não conseguem deixar de ter vontade de repeti-las durante a sua existência. Porque, creio, essas relações nos abastecem de uma energia que eu chamaria de “vital”. Curativa. Além dos caramelos acima, atualmente juntou-se o Alexandre, resgatado há três anos mais ou menos. Aliás, tirante a Dominic, que nasceu em casa, todos os outros foram acolhidos de resgaste da rua. E, apesar de não haver interesse (por enquanto) de haver outros resgastes, em todas as ocasiões houve o envolvimento de outros motivos aleatórios, sem intenção de fazê-lo. À conferir…

25 / 07 / 2025 / Dominic Correu

Dominic, enquanto eu assistia televisão, dormia do meu lado no sofá. Provavelmente sonhando que corria. As suas patas se movimentavam rapidamente como se tivesse em campo aberto. Como quando era mais nova. Há dois dias, quis me acompanhar e subiu as escadas da varanda e em determinado momento, a velha companheira tropeçou, caindo alguns degraus abaixo. Ela está pesada e suas patas enfraquecidas pela idade.

Ao vê-la sonhando que corria, passei a mão em sua cabeça. Logo depois, como se ainda tivesse saindo do transe, me olhou nos olhos logo que os abriu e bateu o rabo como se estivesse feliz por aquele momento sonhado. Perto dos 14 anos, sei que ela não viverá muito mais do que alguns meses. O sobrepeso tentamos obstar, mas Dominic gosta de comer. E ainda que saiba que isso é prejudicial à sua saúde, fico pensando se vale a pena impedir de ver esse seu gosto satisfeito. Certamente não compreenderia. Nós alimentamos os nossos cães residentes apenas uma vez ao dia, com eventuais distribuição de biscoitos. Junto com a ração, acrescentamos uma mistura de legumes e carne de galinha cozidos. Uma alimentação equilibrada.

O que me deixou feliz foi ver Dominic correndo. Ainda que em sonho…

20 / 01 / 2025 / Cão Sem Dono

Ontem, no domingo, fui a um estabelecimento de produtos horti-fruti-granjeiros. Pelo caminho, vi um cãozinho caminhando aos saltos. As pernas traseiras estavam duras. Ele fez me lembrar do Nego Véio, um cachorro que já chegou em casa com dificuldades locomotoras. Um pouco mais à frente, parou junto a um ponto de ônibus, onde cheirou a ração posta para ele e outros possíveis cães de rua. Tomou um pouco de água e prosseguiu a sua caminhada. O Sol estava mostrando todo seu poder de fogo, beirando os 32ºC.

Quando cheguei à Horti-Fruti, lá estava ele, deitado num pequeno corredor, descansando. Dormia profundamente. A paz dos inocentes. Não fosse a voz de contrariedade da Tânia na minha cabeça: “Mais um?”. Os nossos seis amigos peludos que estão conosco não estão mais tão vigorosos. A Lolla, a Dominic, Alexandre (menos) e o Nego Véio têm problemas de saúde, mas continuam glutões.

Com a minha experiência de décadas no trato com os cães, sei que estão no termo final de suas vidas. Sempre digo que é uma tremenda coragem aceitarmos ter conosco seres que se fazem imprescindíveis enquanto vivem num tempo previsivelmente menor que o nosso. Sofremos por suas partidas e os relembramos vendo as suas fotos e filminhos como se filhos fossem. Porque, são filhos do coração…