Benício e Renata se amavam, disso o sabiam, mas a mulher estava passando pela menopausa de uma forma que transformava qualquer diálogo ou decisão do casal em discussões imotivadas. Ou, por outra, tudo era motivo para que viessem as altercações — o calor, o frio, o vento, o sol, o latido do Filhote, irmão das crianças que se casaram.
Benício sentia saudade da Renata sempre alegre e positiva, sensualidade exuberante mesmo depois dos 50 anos — 30, de namoro — inesperadamente encerrado há dois anos com o início dos calores e mudanças bruscas de humor. Situação que piorou após a sua aposentadoria. Quis descansar um pouco depois de trabalhar muito. Quando desejou retornar, o mercado de trabalho havia mudado. Para Renata, o marido-príncipe se transformara em sapo, gordo e sem atrativos, a coaxar lamentos por seu comportamento.
Quando os dois, em um momento de bonança depois da tempestade, conseguiram conversar por meia hora sem se ofenderem, Benício sugeriu e Renata aceitou consultar um endocrinologista para a possibilidade de terapia de reposição hormonal. Renata tinha histórico de câncer na família e ouvira dizer que isso dificultaria um tratamento através desse recurso, que tivera bons resultados para algumas de suas amigas.
Após a realização dos exames necessários, seguida da consulta com o médico, este assegurou que Renata poderia fazer o tratamento sem problemas, acompanhado de exames periódicos para a verificação dos índices hormonais, de quantidades tão discretas quanto fundamentais no funcionamento do organismo humano. Porém, só isso não bastaria para que o tratamento funcionasse. Renata deveria iniciar um programa de atividades físicas regulares, mudança alimentar, corte de carboidratos e lactose etc.
Renata não era inativa, mas não era fã de exercícios físicos. Dr. Coimbra, no entanto, fora tão enfático na recomendação (que talvez nem ele mesmo seguisse, devido a circunferência de sua cintura) quanto aos benefícios como a diminuição do apetite, a melhora do humor, a diminuição de gordura, o enrijecimento dos músculos, a melhora da imunidade e o retardo do envelhecimento, que decidiu se matricular na academia perto de casa.
Na Cuore-Fit, Renata encontrou outras mulheres na mesma condição em que ela, constatada nas conversas entre um exercício e outro orientado pelo instrutor devidamente sarado que as acompanhavam. Não era um rapaz de rosto bonito, mas as proporções absolutamente equilibradas de seu corpo másculo e sua expressiva autossuficiência era o bastante para deixar as suas companheiras alvoroçadas.
Eduardo ou Dado era um profissional sério e sabia que qualquer desvio de comportamento poderia causar estragos em sua carreira há pouco iniciada. Muitas daquelas senhoras tinham idade para serem a sua mãe. Ainda que Renata lhe tenha impressionado por seu sorriso aberto, olhar vivaz e certa candura de menina, nunca passaria por sua cabeça se envolver com ela ou qualquer uma delas. Sentia-se compromissado com Betinha.
Passados alguns meses, Renata, bastante dedicada, progredira enormemente no alcance dos objetivos antes apenas sonhados por quem inicia a atividade física regular. O melhor era ter voltado a se sentir viva como antes, o que Benício agradeceu aos céus e ao anjo Dr. Coimbra. As brigas cessaram, as risadas voltaram a fazer parte do café da manhã e o sexo eventual, procurado por ela, voltou a ser gostoso. Não importava a hora que dormisse, acordava bem cedo e saía para correr ao mesmo tempo que ele saía para trabalhar, logo após ao café da manhã equilibrado entre frutas e alimentos a base de proteína vegetal e suplementos.
Benício não conhecia a importância do outro responsável por Renata ter chegado a essa condição — Dado. Aliás, ela sempre evitou citar o seu nome. Tudo por causa de uma prosaica circunstância que demonstrou que o tratamento começava dar resultado, ainda que inesperado. A dedicação e incentivo do instrutor físico em sua melhora orgânica, que nunca deixou de elogiar o esforço e a busca da perfeição na execução dos exercícios, a enrubescia.
Para Dado, Renata representava o resultado material da teoria aprendida na faculdade. E quando o rapaz disse isso para ela, Renata sentiu sua calcinha umedecer imediatamente. Aturdida, Renata pediu licença e correu para o banheiro. Dentro do reservado, se tocou por dois minutos e alcançou um dos orgasmos mais intensos de sua vida. Chegada a noite, buscou o marido para realizar tudo o que pensava em fazer com o moço que a excitara daquela maneira. Foi bom, mas nada comparado ao que sentira pela manhã na Cuore-Fit.
Renata teve medo do que estava sentindo. Sabia que entre os dois não havia futuro, mas a paixão era um abismo tão atraente… A questão era saber se Dado abriria o coração, fecharia os olhos e saltaria com ela. As trocas de olhares entre os dois faiscavam a ponto de serem percebidas por uma ou outra aluna.
Naquela terça-feira, Renata madrugou e chegou antes do que quase todos. Dado foi um dos primeiros a chegar. Quando a viu, ele se alegrou como o menino que era. Gostava imensamente da companhia da mulher que remoçou diante dos seus olhos. Sozinha com ele, Renata conversou leviandades para chegar ao ponto que queria. Perguntou se mais tarde ele não gostaria de almoçar em sua casa, perto dali. Olhar e boca sorriram em aceitação.
Após a aula, Renata voltou para a casa se sentindo uma menina que se apaixona pela primeira vez. Com Benício no trabalho, aquilo que pretendia fazer não lhe parecia incorreto. Em seu pensamento, essa paixão era uma homenagem ao desejo do marido de querê-la bem. Preparou um almoço robusto o suficiente para repor as energias de um jovem em constante atividade. E ela pretendia ajudar muito no desgaste energético do moço — parte dos pensamentos que a faziam rir sozinha.
À chegada de Dado, o almoço foi esquecido. Porta adentro, se abraçaram-beijaram como quem precisasse comer após prolongado jejum. Começaram no sofá e terminaram no tapete da sala, sob a observação de Filhote, que deitado em sua caminha, ouvia a sua humana a gemer-uivar, entre risos. Exaustos e excitados, iniciaram conversas lambuzadas, línguas adentrando os lábios. Conversação que durou quinze minutos.
Renata levou Dado para a sua cama. Ela queria que aquele local voltasse a ser o melhor lugar da casa. Totalmente entregue ao forte e atrevido amante concretizou todas as fantasias irrealizadas com Benício. Na sensação mais extraordinária que jamais experimentou, quis morrer naquele mesmo instante, feliz.
De alguma maneira, foi atendida. Depois desse encontro, cheio de promessas e perspectivas, tudo degringolou. Uma das outras mulheres, senhora enciumada do tratamento dispensado à Renata pelo instrutor, o denunciou por importunação sexual. Demitido, Dado decidiu voltar para Catanduva, onde nasceu. Há tempos recebera uma proposta de trabalho de uma academia daquela região que agora se tornara oportuna. Deixar Renata era como se lhe arrancassem o coração. Confirmaria o compromisso com Betinha, a namorada de meninice e tentaria esquecer o amor impossível. Era o mais certo a ser feito. No curso de Educação Física aprendera a suportar a dor do corpo, mas o que estava sentindo não estava nas estudos sobre o desenvolvimento da “mens sana in corpore sano”.
Ao se despedirem, em silêncio, os dois amantes se recolheram a um canto reservado da academia e se renderam um ao outro, em pé mesmo, sôfrega e apaixonadamente, rostos úmidos, línguas com gosto de água salgada. Ao chegar em casa, Benício encontrou Renata como no auge da menopausa, imersa na tristeza e quietude que normalmente antecedia a tormenta. Ao perguntar sobre o que sentia, Renata correu para os braços reparadores do amor da sua vida e chorou como criança. De alguma maneira, Benício sabia o que estava acontecendo, mas a amava tanto que só queria vê-la feliz. Sem dizer palavra, a abraçou com força.
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