BEDA / Rèveillon Da Mentira

1º de Abril de 2021

Há 90 dias, realizei o meu último evento da manhã de 31 de Dezembro de 2020 até a manhã de 1° de Janeiro com a Ortega Luz & Som. Somos aqueles que chegamos primeiro e saímos por último. Trabalhamos, meu irmão, Humberto e eu, na base de sustentação da expressão artística ligada à música, à dança, à celebração de viver. À época, eu tinha plena consciência do que teríamos pela frente. Cheguei a enunciar que o ano de 2020 tinha sido apenas um spoiler de 2021. Ou que 2020 havia começado em 2019 e terminaria em 2022… com sorte!

Não sou uma pitonisa, de forma alguma. Apenas sempre fui um estudioso da Ciência e uma pessoa curiosa pelo Conhecimento, em busca de respostas pelo simples prazer de saber. Nunca achei que as coisas tivessem respostas simples, ainda que muitas questões são de solução óbvia. Sempre busquei perguntar, argumentar, verificar pontos de vista antagônicos, nunca aceitei fórmulas mágicas, nunca busquei reinventar a roda ou desprezar o conhecimento humano acumulado por milhares de anos.

É com muita tristeza que vejo hordas de cegos ideológicos reproduzirem movimentos que já devíamos ter superado. Certos ciclos se repetem justamente pela quebra da informação geracional, muitas vezes de forma intencional. E se de alguma coisa valeu esta Pandemia, é perceber que essa não é uma característica brasileira, apenas. A ignorância grassa pelos Hemisférios de alto a baixo, de um lado ao outro.

Quanto ao evento, passamos, meus colegas e eu – músicos, bailarinas, empresários – por picos emocionais e imergimos em um mar de sentimentos contraditórios. De encontro e de despedidas, de um ano difícil para outro que deveria trazer um novo alento. Dentre tantas pessoas, alguns poucos que como eu traziam o sorriso amarelo por debaixo das máscaras (usei umas cinco naquele calor infernal), sabendo que reuniões como aquela, que cumpríamos por força de contrato, seriam responsáveis, junto com às aglomerações do Carnaval, pela hecatombe que sobreveio sobre o nosso sistema de Saúde.

Após o Réveillon, recusei todas possibilidades de eventos que não tivessem a mínima segurança. Não apenas por mim, mas também por quem eu nem conheço. Neste Dia Da Mentira, que saibam separar o que é real do que é mitológico. Estamos pagando um preço muito caro, fortemente dimensionado em perdas humanas, por falácias propagadas por mitos e mitômanos.

*Texto de 1º de Abril de 2021

O BEDA é uma aventura compartilhada por: Lunna Guedes / Darlene Regina / Mariana Gouveia / Cláudia Leonardi

Projeto 52 Missivas / A Morte Pulsa…

“A morte pulsa nas veias da existência e ata minha vida ao pulsar dos segundos” essa frase diz muito sobre a minha visão sobre a existência. Carregamos, desde a concepção, as possibilidades de sermos… o que? Qualquer coisa, dentro das limitações intrínsecas às condições naturais, sociais e de outras ordens, muitas apenas especulativas.

Eu, que escrevo e você, que me lê, participamos de uma rede de relacionamentos que envolve parâmetros demarcados pela perspectiva permanente e irretocável da vida e da morte. Para mim, não há dicotomia ou separação entre uma e outra. A morte nasce com a vida e minha crença ainda prorroga esse enlace para “antes” e para “depois” de virmos fisicamente à luz do Sol. Neste período, neste planeta, neste plano, frequência, energia, pulsação…

Arbitrariamente, a depender de cada um, os eventos do nascimento e da morte são separados como acontecimentos diferentes. Filosofias de todas as eras civilizatórias propõem explicações, perspectivas, conceitos e, sobre eles, constroem crenças-religiões que regem a vida e instauram a cessação de seu fluxo, agrega culpas e decreta penas para aqueles que não creem em seus mandamentos. Grupos lutam para colocar a sua religião como a verdadeira. Baseiam-se em livros, em palavras, em imposições civilizacionais professadas por enviados e pastores.

Como bebo de um caldeirão de informações díspares, me deixo ser influenciado por concepções de todas as origens. O critério que utilizo é que a sensação de “pertencimento” repercuta em mim de alguma maneira. Consigo entender como se dá o processo naquela determinada cultura. Dali por diante, deixo a semente germinar ou morrer. Se não influencia determinantemente o meu pensamento, ainda assim posso utilizá-la na criação dos meus textos. Não preconceituo nada e a rejeição só ocorre quando algo atenta contra a liberdade de ser e de pensar. Além do empirismo pessoal, outra base na qual alimento minha religiosidade são as Ciências — as humanas, filtradas por minha percepção; a Biologia, a Geometria sagrada, a Física, a Astronomia — sem contradições, apenas confirmações.

O pulsar dos segundos rege a minha vida-morte conscientemente e a transforma em energia-combustível para minha existência. Viver o Presente é buscado e ainda que o Passado se imiscua com lembranças, será sempre para reafirmá-lo. Pensar no Futuro é utilizado para potenciá-lo em vivência realizável. Dito dessa maneira, parece um esperto jogo de palavras que nada explica. Isso porque a amálgama de emoções e sentimentos que geram são pessoais e por mais que eu tente apreender explicá-los, o fluxo torna-se inapreensível. Mas como também acredito na magia das palavras, ainda assim esta barafunda de inflexões talvez possa vir tocar o seu peito.

Lunna Guedes / Mariana Gouveia

Bom Dia!

BOM DIA!

Creio que uma das atitudes mais salutares que há é o de dar “bom dia!” no momento que temos a oportunidade. Desejar que o dia seja bom para alguém, para os outros animais não humanos, para as plantas, para o mundo invisível, para si mesmo reforça o compromisso de que estamos aqui para melhorar a nossa condição, para que as altas vibrações se sobressaiam em relação às baixas. Porém…

Não sou ingênuo a ponto de crer que meus desejares benéficos penetrem os corações inflexíveis dos que se aprazem em viver a dor como padrão de vida. Eu sei que estados depressivos se imiscuem nossas vidas vez ou outra, principalmente quando nos colocamos tão abertos às solicitações mais insidiosas do mundo, aquelas que nos carregam como formigas operárias do mal. Mas estou me referindo aos que carregam a consciência nublada por opção.

Como oferecer o meu “bom dia!” a quem acredita que a desigualdade é a linguagem pela qual devemos nos pautar como padrão da existência? Seria o caso de jogar a minha improvável força mental como se fosse um raio redentor para tentar transmutar a natureza maledicente de gente que ama odiar? Somos, cada um de nós, como planetas que desenvolvem suas próprias leis físicas-mentais. É usual planetas regressivos se apartarem da ordem humanista e se reunirem em sistemas que adotam um sol escuro em torno do qual girar.

É habitual neste quadrante que hordas de sequazes orem pela crença no separatismo em castas, benéficos apenas para escolhidos, que creem que sejam capacitados por um deus exclusivista, que implantou a doutrina de dominação de poucos sobre muitos. Que abominam os diferentes e que fazem força para que as diferenças sejam classificadas como indicativas para qualificar os que devem viver e os que devem morrer, os que devem comandar e os que devem obedecer, que lutam para reforçar a desigualdade, para que nada mude na abençoada relação de servilismo que caracteriza a História do mundo.

Fiquei a imaginar que o comportamento dessa gente é tão repugnante que me leva a não exteriorizar o melhor de mim. Dar o meu “bom dia!” a esses tipos equivaleria em querer que continuem a se beneficiarem do mal que espalham pelos caminhos que tomam. Significaria que colaboro para que continuem em seus bancos de carros blindados a se sentirem confortáveis à paisagem exterior de desequilíbrio social, que sentem recompensados por contrapor a sua boa saúde ao mal ajambrado, ao deserdado, ao molambo. Representaria abraçar àquele que ri da morte de enjeitados, que se glorifica a cada corpo sem vida de um desfavorecido na sarjeta numa noite chuvosa ao ir jantar no restaurante da moda. Daria ensejo que fosse um bom dia para o desrespeito.

Contudo, não quero me tornar um semelhante aos que não compreendem aos dessemelhantes. Afinal, a compreensão do outro é a senda que busco desde sempre. Quebrar a barreira da incomunicabilidade para entender o porquê de certos comportamentos, buscar o mínimo sinal de humanidade no ser mais abjeto com o qual convivo. Isso não significaria absolver o que fazem ou o que dizem, o mal que querem impor como agenda diária. Aos que desejam implantar a xenofobia como prática de nossa realidade de incrível diversidade cultural e racial, a incorporando como política do País. Não lhes importa que a Ciência demonstre que as diferenças sejam mínimas entre nós. Dada a realidade, que seja derrubada a base sobre a qual pautamos o desenvolvimento humano nos últimos séculos!

Isso significa que para não me tornar um negacionista, um detrator do verdadeiro cerne do que eu acredito e me conduz que é o amor, deverei trabalhar diária e permanentemente para participar da resistência. Cansa? Cansa! Há momentos que não queremos continuar a bater a cabeça, a nos digladiar contra obtusos que vibram a cada vez que o seu representante destila diatribes e promove abusos. Para mim, são como facadas em meu coração. Mas sobreviver talvez seja a maior ofensa que possa oferecer a esses sujeitos. Portanto, também para esses, dou um “bom dia!” para mim, sabendo que, se assim for, não será um bom dia para eles…

Projeto Fotográfico 6 On 6 / Em 2020, Eu…

… sobrevivi. Até agora… Com o advento de Março, chegou a Pandemia de Covid-19 no Brasil. E ela mudou tudo. As relações interpessoais sofreram o abalo que para alguns povos não significa tanto, mas para os brasileiros resultou em uma mudança brusca de comportamento — como assim, não podemos abraçar? Como assim, não podemos beijar? Como assim, não podemos respirar o mesmo ar? Como assim, não podemos trabalhar? Restou ficarmos em casa, reclusos, montando verdadeiras estratégias de guerra para simplesmente circularmos pelas ruas para irmos até uma padaria, farmácia ou supermercado. Como criminosos do colarinho branco, fomos condenados a cumprir a pena de prisão domiciliar. E como alguns bandidos, vários de nós fugiram de suas celas para enfrentar o vírus, por necessidade ou negação. E, chegamos ao final do ano, devendo anos de condenação.

Flor de maracujá

5 de Fevereiro, quarta-feira
Emoção na Casa Ortega: respondendo com beleza à atenção e ao carinho dispensados ao maracujazeiro, ele começou a florescer. Quem vive na cidade, costuma perder os pequenos milagres que a Natureza nos proporciona. As emoções são compradas e os sentimentos adquiridos como se fossem utensílios. Mas são escolhas, muitas vezes feitas por outras pessoas ou por ideias generalizantes de como a vida deva ser levada. Nós escolhemos ter quintal. As nossas plantas agradecem e os pássaros, também.

Olhar em vagas…

8 de Abril, quarta-feira
Decretado o isolamento, eu estava na Praia Grande, realizando algumas tarefas na casa da família. Fiquei isolado por quase um mês. Sem trabalho, já que os eventos do ano todo estavam suspensos até que tudo voltasse ao normal — que imaginávamos ser dali a pouco. Munido de máscara, comecei a circular de bicicleta pelas vias vazias da cidade para que pudesse me manter ativo. Ajudava o fato de os dias serem sequencialmente nublados, úmidos e frios. Escrevi, como legenda dessa imagem: “Fiquei recluso dentro de mim, mas o meu olhar vagueou por aí…”.

Parte da Turma do Curso de Educação Física da UNIP – Marquês, em 2010 — Clube Speria

16 de Julho, quinta-feira
Em boa parte do ano, eu passei a relembrar etapas da minha vida pregressa. Ressalto isso porque relembrar o futuro, também faço — ao viver o presente. Silogismos duvidosos à parte, houve etapas que cumpri com o prazer de um menino que descobre o novo quando este veterano se tornou calouro, em 2009, no curso de Educação Física. Passei quatro anos aprendendo bastante sobre o corpo em movimento e sobre convivência. Mais maduro, diferente dos meus 20 anos, quando fiz História, na USP, época que passei por várias crises existenciais, aos 50 anos levei adiante o curso ainda que a diferença de gerações pudesse trazer algum entrechoque o que, sinceramente, não senti acontecer. Pelas redes sociais mantenho contato com muitos deles, acompanhando os vários caminhos que tomaram, torço para que alcancem os seus objetivos.

Encostado, dolorido e, ainda assim, fazendo pose…

22 de agosto, sexta-feira
Quem disse que lavar roupa não é perigoso? Ontem, quinta-feira, lavei roupa e a água que resultou da lavagem utilizei para lavar o chão da varanda do @boilerlaje, escadas e churrasqueira. Após terminar uma parte, lá estou eu de chinelão, distraído, a descer, quando um passo em falso na escada escorregadia e, de uma queda, fui ao chão, quatro metros abaixo, batendo costas, pernas e braços até o final dos degraus. Não bati a cabeça porque o judô praticado na infância sempre me ajudou a protegê-la em todas as muitas quedas desde então. Acudiu-me uma cavalheira, a @liviaortega e um cavalheiro @pablittz. Pensei que houvesse apenas escoriações superficiais, mas à noite não consegui dormir direito devido às dores que surgiram depois. Hoje, estou melhor. Mas tive que reviver na boca da @tanort, da @romyzeta e da @ingriidortega, além da Lívia, poucas e boas. Acabei por me lembrar da minha mãe, Dona Madalena, que ralhava comigo todas as vezes que eu aparecia “quebrado” em casa por causa de carrinho de rolimã, patins ou futebol em campo de várzea ou quadra. Quase cheguei a confundir a dor aguda e passageira do corpo com a dor tênue e permanente da saudade. Se chorasse, talvez fosse mais pela última… no mais, gemi bastante.

O ovo azul…

29 de Outubro, quinta-feira
Produção de ovos recolhida hoje pela manhã, botados pelas galinhas garnisés Irmãs KardashiansKim, Kendall e Kylie — nomes dados por minhas filhas. Sim, um dos ovos é azulado. Provavelmente da Kim, que é misturada com galinha comum. Instalamos um galinheiro em nosso quintal. Além das fêmeas, veio também o galinho Elton John. Coincidentemente ou não, o galinheiro fica no final do Yellow Brick Road, que dá nome ao jardim. Esse ovo azul me fez lembrar meu avô Humberto, pai do meu pai, que disse ter trazido ao Brasil as galinhas que botam ovos azuis. Ele me relatou esse fato à época em que passou seu tempo final de vida conosco. Um pouco antes, uma a uma das três mulheres mais visíveis de sua vida haviam falecido – sua última companheira, a mãe do meu pai e a madrasta que ajudou a criar seu filho. Já enfraquecido, cuidei dele, ajudando a lhe dar banho, caminhar e comer. Desde que mudamos para a periferia, para ajudar no orçamento de casa, minha mãe tornou-se granjeira. Chegou a ficar conhecida como a Dona Madalena das Galinhas. Essa tradição perdurou por anos. E, aparentemente, está retornando.

Dezembro de 2020 e sorrir está difícil…

06 de Dezembro, domingo
Eis que chegamos ao final da primeira semana do último mês do ano mais incrível do Século XXI, por enquanto. Muitos utilizam o termo “incrível” com sua conotação positiva, mas ele significa exatamente o que expressa: algo que não é crível. Não é crível que não consigamos agir da maneira correta. Não é crível que tenhamos um governo tão inepto quanto o comandado pelo miliciano que está na presidência. Não é crível que as pessoas não aceitem a Ciência para balizarem as medidas preventivas para sobreviverem a esta crise sanitária. Não é crível que não aprendamos com os erros. Aliás, não seria crível, se não fôssemos brasileiros… Somos terríveis! Em todas as suas acepções: assustadores, fastidiosos, funestos, péssimos e, principalmente, invencíveis. 

Participação de 6 On 6 de:

Lunna GuedesMariana GouveiaDarlene Regina

BEDA / Scenarium / Um Dia Depois

UM DIA DEPOIS

Um dia depois do Dia dos Pais,
o que mudou no País?
Para tantos pais, filhos e famílias,
o segundo domingo de agosto não foi comemorado.
Pais não receberam seus filhos,
filhos não abraçaram quem os gerou
cuidou,
trabalhou,
viveu por…
Muitos, estavam vivos, mas distantes
e distanciados, por força do isolamento
ou pela desavença e litígio.
Eu, mesmo,
passei os últimos anos de meu pai,
alienado da sua presença. Mas foi uma escolha.
Outros, partiram pela doença do descaso.
Cem mil vezes pranteados.
Há ainda os que estão acamados,
entubados,
estratificados.
Todos, marcados
por estatísticas macabras.
Eu pude estar com as minhas filhas.
Percebi o quanto sou agraciado
por ser beijado,
abraçado,
por me sentir amado,
entrelaçado
pelo enredo familiar.
A minha alegria carregava um travo.
Em domingos sequenciais,
vivemos dentro de uma bolha boçalizada,
em ilhas isoladas,
de mar que se nega a aprofundar.
É como se o oceano não fosse salgado,
suas águas não quebrassem em ondas ao chegarem às praias,
não se permitisse abrigar sereias,
miríades de outros seres,
tesouros naufragados
e continentes perdidos ̶ raso de vida, mistérios e poesia.
Contudo, se aproveitam da crença no fantástico
e renegam a profundidade da Ciência.
Existimos em realidade paralela,
afirmando nossa indecência.
Negamos o conhecimento e festejamos a morte.
Entre plantas ̶ coqueiros e bambuzais ̶
o supremo mandatário deglute a nossa humanidade.
À caminho da segunda centena de milhar,
o chefe do jogo do bicho medonho continua sem paradeiro.
Quem o impedirá o testa de ferro insubordinado dos coronéis do dinheiro de continuar a jogar?
Há remédio
para evitar que muitos mais pais e filhos
estejam separados no próximo Dia dos Pais,
por obra e artimanha da desconsideração por brasileiros,
por obra e arte da estultice de eleitores brasileiros?

B.E.D.A. — Blog Every Day August

Adriana AneliClaudia LeonardiDarlene ReginaMariana Gouveia

Lunna Guedes