A Libélula

Ao abrir a porta que dá para a garagem, me deparei com uma libélula que, feito um helicóptero animal, parou no ar por uns três segundos e pareceu avaliar o que seria aquele ser diante dela. Desceu ao chão e repentinamente tomou o seu rumo incógnito. Era um inseto bem mais escuro e maior do que eu já vira e, mesmo em casa de tantas plantas, bastante incomum. Aliás, eu não me lembro de tê-las visto antes por aqui. Como seus voos podem durar de alguns minutos como dias, acredito que fosse do tipo migratório e que tenha vindo de uma reserva da Mata Atlântica, que fica a uns 3Km de onde moro.

Fui lá pesquisar sobre a libélula:

“A libélula, também conhecida popularmente como tira-olhos ou libelinha em Portugal e como lavadeira ou jacinta no Brasil, é um inseto alado pertencente à subordem Anisoptera. É considerado um dos primeiros insetos a surgir na Terra. Os registros fósseis de libélulas mais antigos foram encontrados na França e datam do período Carbonífero, há cerca de 300 milhões de anos. No Brasil, os fósseis datam do período Cretáceo (há aproximadamente 100 milhões de anos). ”. Wikipédia

Ou seja, é um inseto que carrega consigo o peso das idades terrenas, que vive de 5 a 56 dias. Devido ao seu processo de mutação (dentro e fora d’água), está relacionado a mudanças, transformações e capacidade de adaptação. Em alguns países, como no Japão, a libélula é associada à felicidade, coragem e prosperidade. Na América, o inseto significa a renovação nos períodos de dificuldade.

Na Bíblia, as libélulas são mencionadas em passagens como Êxodo 10:19 e Isaías 34:14. Essas referências podem ser interpretadas como símbolos de transformação, proteção divina e ação de Deus na Natureza.

“O termo ‘libélula’ pode ter se originado de dois termos latinos: libellules, o diminutivo de ‘livro’ (liber) – devido à semelhança de suas asas a um livro aberto – ou libella, que significa balança – enquanto voam, as libélulas parecem uma balança, se mantendo em perfeito equilíbrio.

As libélulas são insetos predadores que pertencem à ordem Odonata. A estrutura corporal das libélulas permite que elas sejam caçadoras implacáveis. Elas voam mais rápido do que a maioria dos outros insetos. E, podem mudar instantaneamente a direção do voo, pairando no ar como minúsculos helicópteros. Por permitirem uma visão panorâmica (360 graus), seus grandes olhos são capazes de localizar presas acima, abaixo, em frente, atrás e de ambos os lados. Esses animais exercem papel importante no controle biológico de pragas e atuam como bioindicadores de qualidade ambiental. Além disso, são protagonistas de numerosas crenças e tradições que habitam a imaginação popular há muitos séculos.

Em uma delas, são chamadas de pequenos dragões: “em inglês, as libélulas são conhecidas como dragonflies. Segundo uma lenda Xamânica, a libélula era um dragão sábio e dotado de magias que, durante a noite, difundia luz com sua própria respiração de fogo. Um dia, para enganar um coiote, o dragão aceitou o desafio de se transformar em uma libélula, tornando-se prisioneiro de seus próprios poderes. Depois disso, além de perder suas magias, o dragão ficou preso em seu novo corpo para sempre”. eCycle

Que essa visita inesperada tenha surgido diante de mim neste penúltimo dia de 2023 foi simbolicamente importante, além da beleza de seu voo que a fez desaparecer assim como surgiu, feito uma visão mágica, assim como considero mágica a expressão da Natureza. De certo que vejo a maioria dos movimentos da vida como algo de milagroso, quase sempre conspurcado pelas mundanas ações humanas. Nada de religioso, mas sim de religiosidade, de conexão com as energias invisíveis. Ainda que as guerras – grandes e pequenas, diárias – não obedeçam ao determinismo do calendário, continuando à sua faina de ceifar vidas todos os dias e trazendo sofrimento e dor, que 2024 possa ser um período de renovação para melhor. Assim seja!

Foto por Sandhy Prasetyo em Pexels.com

#Blogvember / Viciada Em Dor

Caminhei até a porta e saí para sempre (Nirlei Oliveira)

Foto por ALTEREDSNAPS em Pexels.com

Antes do movimento final, em que caminhei até a porta e saí para sempre, várias outras caminhadas as caminhei errante, batendo a cabeça pelas paredes que insistiam em serem sólidas. Era como se não quisesse aceitar que tudo havia terminado. Mas a dor de me sentir menosprezada me fez acordar. Sabia que não devia recuar quando finalmente me desvencilhasse de sua influência, o vício de seu poder, como se fosse a luz da minha vida.

Quanto mais lhe recebia em meu corpo, quanto mais você incendiava a minha mente, mais o desejava. Deixava, de fato ansiava que me possuísse da forma que lhe aprouvesse. Onde poderia ver humilhação, eu encontrava redenção. Onde sentisse dor, eu buscava satisfação. Onde talvez me repugnasse em me ver banhada de suor e esperma, eu abençoava como se fossem água benta e oferta à santidade da foda.

Até que percebi que para você eu era apenas mais uma peça de seu jogo de dominação. Não apenas a mim você ofereceu o seu abuso desmesurado. O meu sentimento foi o de se ver revelado exatamente o acontecia – eu era um objeto de prazer fátuo – não de envolvimento profundo. Para você, marcação de pontos. Para mim, sensação de poder em realizá-lo, como se eu fosse oferta de libação religiosa ao meu deus.

Sofrerei o tempo que deva sofrer, até eu quelar seus efeitos perniciosos. Viciada na depravação de meu ser, terei que trabalhar a minha mente para que expulse de minhas veias e artérias os efeitos da droga que me guiava os passos – desejá-lo. Sei que sou melhor do que um objeto de uso e usufruto. Sei que esta mulher sairá melhor do que entrou pela porta do calabouço e altar de celebração.

Sei que lembrarei das suas mãos, dedos, seu corpo, línguas (pareciam ser dezenas), membros inferiores e seu pau. Suas ações e rituais de dominação. Mas se prisioneiros de campos de concentração conseguiram tocar as suas vidas em frente depois de tudo o que passaram, também alcançarei o livramento para além da liberdade, até que a nossa história seja mais uma como tantas, de vidas passadas e superadas.

Renascerei.

Participam: Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Suzana Martins / Lunna Guedes

BEDA / Grandeza

O que seria surpresa, neste mundo de meu Deus?
Talvez encontrar a grandeza do sonho de Caieiro adormecido.
Poder ser e desejar não ser ainda que seja livre por não querer.
Voar por poder, mas em negação servir ao que rasteja.
Libertar-se da prisão cantando a lembrança do caminho perdido.

Poema participante do BEDA: Blog Every Day August, derivado de outro poema encontrado perdido de Alberto Caieiro, heterônomo de Fernando Pessoa. Estava num papel de pão.

Denise Gals Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Lunna Guedes / Bob F / Suzana Martins Cláudia Leonardi

BEDA / Profissão: Brasileiro

Imagem de nossa identidade pública, por autor anônimo. Cá, para mim, a chamo de “Brasileiro, uma profissão”.

À respeito do grafite que encontrei em minhas caminhadas pela região da Vila Nova Cachoerinha e que acabei por usar como foto de perfil por um tempo, escrevi: “Usamos fantasias, jogamos jogos de azar; acendemos velas para deuses cujos fiéis se digladiam; supersticiosos, rimos sarcasticamente da nossa ‘má sorte’ e empunhamos a bandeira nacional como a um estandarte de guerra!”… Ocorreu em 2011. Já identificava um comportamento dissociativo da nossa população, dividida em estamentos sociais díspares. E em que a estrutura social apresentava uma certa identificação da injustiça como linguagem comum e a normalização monolítica do ódio.

À época, eu acreditava que o investimento em Educação ajudaria a equilibrar a balança em que muitos sem nada eram governados por poucos com muito – o poder financeiro a dirigir o caminho das regalias e das faltas de grupos setorizados. Apesar de perceber a vertente que falava em tons de voz mais baixo para não ser ouvida fora de seus circuitos relacionais, aqueles que estavam transitando pelo esgoto do pensamento subjacente brasileiro não haviam ainda encontrado um canal para trazerem as suas ideias, palavras, preconceitos e vilipêndios a público.

Num movimento de fluxo e refluxo, o projeto de inclusão social acabou por sofrer um revés, muito devido aos erros de quem os dirigia. Esses desvios, deram oportunidade para que os setores descontentes com os pequenos avanços revidassem. Situações que iam de pessoas de baixa renda a terem acesso a universidades até revolta dos que se consideravam especiais em dividir aeroportos e assentos de aviões com empregadas domésticas em viagens para a Disney.

Estudante de História nos Anos 80, dei de frente com o arcabouço construído ao longo dos séculos pelo sistema de produção em que a escravização de naturais da terra, no início e, depois, de africanos, foi transformado em um negócio rentável e movimentou grandemente a riqueza do Brasil – a busca, transporte e venda de seres humanos. Das muitas justificativas dadas para tal, uma delas era de origem “piedosa”: como foram marcados com a cor escura por Deus, o sofrimento que sofriam ajudaria às suas almas alcançarem o Reino dos Céus.

Sem tanta sofisticação, o sujeito de passado conturbado nas hostes militares, se lançou candidato à vereador no Rio de Janeiro e, graças à votação obtida em redutos milicianos, percebeu que poderia levar a sua voz monocórdica que extravasa ódio e repulsa aos diferentes, à mulher, aos pretos, aos desejosos de uma mudança na estrutura social que penaliza a maior parte da população a viver em condições precárias.

O Ignominioso Miliciano, fascinado desde os tempos de militar por minérios como ouro e diamantes, usando seu tempo de férias em garimpos atrás de metais preciosos. É até singular que após cumprir um percurso em que poderia ser acusado de crimes maiores como Genocídio por sua política intencionalmente desastrosa que vitimou percentualmente um dos maiores números de vítimas de Covid-19 na Pandemia e incentivar a invasão das reservas indígenas para arrancar ouro, agora possa cair em desgraça no caso das joias do Oriente Médio e ser finalmente preso. Principalmente quando se houver, como parece, vinculação à venda da Refinaria Landulpho Alves, na Bahia. para a Mubadala Capital, um fundo de investimentos de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes. (Fonte: Agência Senado). As joias, nesse caso, seriam uma espécie de propina pela venda a um pouco mais da metade do valor do que valia para os árabes.

Simbólico, não?

Texto participante de BEDA: Blog Every Day August

Denise Gals Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Lunna Guedes / Bob F / Suzana Martins Cláudia Leonardi

Carta Do Passado Para Todos Os Tempos*

LALÁ,

demorei a lhe falar porque normalmente declino um monte de asneiras. Mas com você sinto-me à vontade para expô-las. O que digo aqui provavelmente não conseguiria dizer para a maioria das pessoas mais próximas do meu relacionamento, já que levo uma vidinha bem provinciana em termos familiares e amistosos. Discussões sobre a intimidade divina não passam dos anúncios de aforismos cristãos e de tentativas de relacionar-se com Deus através do temor.

Creio que Deus seja o deus do possível e tudo que passa por nosso pensamento é passível de existência. Se não existe no mundo material, palpável, pode passar a existir em nossa mente, onde criamos mundos inteiros. Com a imaginação, conseguimos subverter as leis e a ordem natural das coisas. Ou antes, a ordem natural das coisas passa por nossa ordem pessoal das coisas. Em última instância, mesmo que nós, como observadores, queiramos manter-nos distantes do mundo que nos cerca, normalmente interferimos na sua definição. Porque ao fazê-lo, usamos expressões e palavras, normalmente inexatas, parciais ou corrompidas por usos anteriores. Enquanto não tivermos a capacidade de nos comunicarmos por puras ondas mentais, quaisquer materializações, por palavras, símbolos e ações, dificilmente será entendida em sua integridade. Ainda mais porque a Matemática, língua oficial de Deus, não é alcançada pela maioria das pessoas e quem as utiliza talvez estejam presas a ditames que obedecem a fronteiras delimitadas.

E mesmo crendo que as construções linguísticas de que dispomos não sejam suficientes para o entendimento humano, confesso: como gosto de brincar com as palavras! Sinto-me bem, principalmente quando elogiam o que eu digo. Sinto-me envaidecido ainda mais quando crio uma expressão que consegue penetrar o âmago de alguma questão. Antes, quando não nos comunicávamos tão celeremente como fazemos hoje em dia através das redes sociais que nos agrupam em uma “sala”, estejamos aqui ou no Haiti, a única maneira que poderia existir para me apresentar (eu, por minhas palavras) seria escrevendo um livro que fosse publicado ou conversando com colegas e amigos, em rodas menores de contato direto. Da maneira como ocorre atualmente estamos criando uma poderosa máquina de comunicação, ainda que não compreendamos tão prontamente todo o seu alcance e força. Ao final, espero que a vacuidade da minha vaidade intelectual não me desvie do objetivo primordial que é conhecer-me através dos outros.  

Para adentrar no assunto que me levou a lhe escrever, digo que gostei muito do modo como o Prof. Laércio expôs a sua teoria sobre o Cosmo, integrando a Física – a Quântica e a Tradicional ( ainda mágica, mesmo assim) – à ainda subentendida dimensão espiritual. Ao discorrer sobre a existência de uma base plausível de ordenação do Universo visível e invisível, pela primeira vez em muito tempo, senti-me confortável em ouvir sobre equações e leis estruturais do átomo. Fiz anotações, como em uma aula normal, enchi o meu caderno de rabiscos e expressões e coloquei, lado a lado, números, questionamentos filosóficos, incitados pela Física, o princípio da incerteza e a confrontação entre a Matemática estatística e a objetiva.

Mas não passarei para você coisas que você já ouviu no vídeo, porque isso seria só repetir o curso. Darei a minha impressão sobre o que mais me chamou atenção – a menção feita de forma meio solta, quase casualmente, no terço final da palestra: somos um projeto de “extraterrestres”, seres de um dos níveis de energia do Campo Unificado. Para isso, mesmo temendo ser enfadonho, farei uma introdução.

Em cada passo que dava, o Homem enxergava uma ameaça à sua espreita – a cada animal ágil e voraz, a cada urro que ecoava pelos ares, a cada forte ventania que arrancava árvores inteiras do chão, a cada raio que riscava o horizonte. Porém, cada vez que via surgir a luz do dia ou a cada estrela que reluzia na abóboda celeste à noite, a cada flor que se projetava fora do manto de neve no início da primavera ou a cada canção produzida pelo roçar da brisa nas folhas das árvores, o mesmo Homem podia sentir a vibração da Vida a se afirmar.

Entre o medo e o encanto, a nossa espécie sempre preferiu se encantar e ultrapassar os seus próprios limites físico. Ela preferiu se identificar mais com o voo do pássaro do que com o rastejar da cobra e passou a se utilizar de sua poderosa imaginação para se desvencilhar das amarras que a prendiam à Terra. Tentou encontrar um sentido para o Mal, um equilíbrio no aparente Caos e se dedicou a se projetar de encontro ao Infinito, ao Invisível, à Força que percebeu existir por trás de cada acontecimento em seu entorno. Creio que a organização civilizacional ao longo do tempo, ao tornarem as crenças em instrumentos de castração e não de libertação espiritual, criou prisões em que o antagonismo se evidencia e se transforma em violência.   

Sempre me impressionou, conforme eu estudava o corpo humano, a capacidade plástica do cérebro, que parece ter sido feito para atender ao crescimento exponencial da inteligência humana. E como tudo é aparência, conforme as leis físicas conhecidas já deixaram descortinar ao tentar desvendar o Universo, do infinitesimal ao Infinito, aproveito para brincar com as possibilidades que o Prof. Laércio lançou com as suas ideias.

A capacidade desenvolvida pelo ser humano (ou para o ser humano) para chegar ao entendimento, ainda que mínimo, de sua condição foi resultado da evolução ou da criação? O chamado “desenho inteligente” do corpo humano seria uma prova inconteste alegada pelos criacionistas de que fomos criados pelas mãos de um ser superior. Não me oponho a essa ideia. No entanto, acredito que o surgimento do Homo sapiens obedeceu a um projeto engendrado pela Inteligência Universal para o nosso planeta, convertido no que poderíamos chamar de um grande laboratório existencial.

Na explanação do Prof. Laércio, ele citou que uma inteligência de fora deste plano que utiliza este planeta para que a Consciência, individualizada em corpos, se desenvolva para além das limitações impostas pelos invólucros corporais. Neste caso, a maior frequência de oscilação do campo energético desenvolveu a sua individualidade. Mesmo sendo uma “perturbação na Força”, não deixa de ser maravilhoso que essa manifestação da Criação apresente uma identidade diferenciada, um projeto “pessoal” de Deus.

Eu elaborei ao longo do tempo essa mesma percepção que, das formas mais básicas de vida até a “criação” do ser humano, fomos desenvolvidos em um processo supervisionado por entes “próximos” de nós. Este lugar onde vivemos é onde a nossa essência vivencia, vestida de homem ou de mulher (ou de…), as experiências necessárias para a nossa emancipação.

Mas a Terra não pertence só aos seres superiores (como vaidosamente consideramos ser), mas também às outras espécies que hospedam níveis de consciência mais diluídos ou ainda não totalmente desvendados. Por isso, devemos aprender a equilibrar a demanda de recursos, preservando a existência dos outros entes que convivem conosco nesta nave.

Muito mais besteiras poderia alinhar em sequencias absurdas, mas se você chegou até a estas últimas frases, aproveito a oportunidade para agradecer por estimular novamente esta minha vertente onde brotam ideias destrambelhadas, mas intimamente ligada ao melhor de mim.

                                                                                                                               Abraços!

*Texto de 2011