Negritude

20180409_150337
Eu e Penélope

Dormi tarde, ou cedo, às 5 horas da manhã. Acordei às 9 horas, pelo som de uma chamada de celular. Após a conversa, liguei o rádio para ouvir as notícias da manhã. Dentre todas as “novidades” – de alegrias e tristezas fátuas por efeito de competições esportivas regionais às prisões de ex-presidentes por corrupção, aqui e na Coréia do Sul – uma me chamou a atenção: animais discriminados pela cor, uma manifestação que tem se tornado comum aqui e em outras partes do mundo.

Uma extensão do que já existe entre seres humanos na realidade, não se trata apenas da ocorrência de preconceito. Mas também de um pós-conceito, qual seja: a cor escura não somente evita que vários cães e gatos sejam adotados por cuidadores humanos. E, ainda mais, quando adotados, são devolvidos ou abandonados porque não ficam “bem” nas fotos…

Devido à pelagem que não absorve a luz de maneira ideal em imagens postadas em redes sociais, esses “animais de estimação” não são tão estimados ou, para usar um termo mercantil, valorizados. Tentei compreender, com todas as minhas forças e entendimento, essa justificação totalmente esdrúxula, mas não consegui. Tirante a Penélope, que chegou com pedigree pelas mãos de alguém da família (e é negra), o critério que usamos para abrigar nossas meninas é de terem sido jogadas na rua.

Fiquei a imaginar se evitaria tirar fotos com a nossa Penélope, labradora que está a chegar no termo de sua vida. Com treze anos de idade, nascida em um mesmo 9 de outubro que eu, não é apenas por essa coincidência que eu a amo ou que amamos todos nós que a conhecemos desde pequena. A alminha de olhos brilhantes cresceu e agora, a velha de visão opaca, um tanto surda, recebe com avidez todas as demonstrações de carinho e toques suaves em seu corpo dolorido. Caminha e respira com dificuldade. Apesar disso, é todo amor. Um dos melhores seres que já conheci.

O fenômeno de viver somente como imagem, elevado à suprema potência em redes sociais, não creio que seja novo entre os humanos. Apenas ganhou ênfase renovada com o surgimento da Internet e a facilidade de exposição midiática. O que surge como expressão egocêntrica é acompanhada de todos os nossos modelos referenciais – concepções às quais nos referenciamos.

A fantasia de que os robôs possam se tornar um dia nossos substitutos em várias áreas da atuação humana, creio que seja ainda menos tenebrosa do que o terror à acontecer a olhos vistos, diante de nós – a de que estamos nos tornando cada vez mais “limpos” de sentimentos – robotizados e imagéticos – basicamente, hologramas vivos…

https://meusanimais.com.br/beleza-dos-caes-pretos/

 

Super Humano

Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande


O Homo Sapiens, de presumíveis trezentos mil de anos, seria resultado do desenvolvimento de outros humanoides ao longo de um milhão de anos, para alguns. Para outros, foi criado pronto, única possibilidade que explicaria a complexidade de seu “desenho inteligente” e as relações de forças imponderáveis entre o mundo físico e o imaterial. Cheguei a acreditar certa época que somos resultado de experiências extraterrestres alienígenas.  O Homem Sábio (de si) é um ser que passeia entre a claridade e a escuridão. Tanto pode ser criador de sistemas filosóficos que o elevam para além de suas limitações materiais em busca do autodomínio e libertação dos liames do mundo visível, para se chegar além, como Buda ou Jesus – supra-humanos –, quanto pode funcionar apenas para satisfazer seus instintos mais básicos, em que prepondera as emoções fáceis e os sentimentos simples. O que não impede que utilize de muita inteligência (prática), voltada para alcançar e manter poder sobre outros, como Hitler ou Stalin – esses, humanos demais. Entre uns e outros, nos colocamos, em nossa maioria.

Assim como parte dos seres humanos prejudica outros seres vivos simplesmente porque pode, outra parte prefere estabelecer laços de conexão em “frequências” mais altas por todos os níveis da existência. Eu suponho que ainda não nos matamos todos uns aos outros, apesar de parecer que estejamos por um fio, porque acredito que a energia positiva gerada é maior do que a negativa. Uma impressão inteiramente pessoal é que o poder de atos e pensamentos elevados sejam mais intensos do que os mais baixos, apesar de percebermos a atração que casos escabrosos têm sobre a população como um todo. A tristeza promovida por notas infelizes parece ganhar mais destaque que a alegria por boas novas. O ódio se anuncia mais candente do que o amor edificante. A paixão, volátil, é mais celebrada do que o afeto profundo. Rompantes sexuais são decantados como ideais para romances em contraponto à união madura. O pau duro e a buceta quente vencem a cabeça fria. Celebrado desde as castas cultas, em versos lascivos, passando pelas populações iletradas que expelem a cultura da precariedade como padrão, vemos a dominação do baixo ventre de maneira sequencial. No entanto, esse discurso também poderá ser encarado, de maneira inversa, como repressor, impeditivo da expressão do corpo livre da dominação de regras sociais, ainda que eu a considere uma outra forma de prisão.

Diante da relatividade dos posicionamentos, da falência da Filosofia como método abrangente, a aparência é de que todos estão certamente errados. A causa talvez seja encontrada na deseducação promovida a longo prazo pelos agentes governamentais e as cíclicas guerras de desinformação político-partidárias. Grupos agem para tentar assumir o poder sobre o cofre público, sob fiança de nossas escolhas. Como cortina de fumaça, grêmios promovem batalhas de cores, escolhidas para apartarem tendências, religiões, países, ideologias, pessoas – tática usual para aglutinar riqueza – medida de todas as coisas. A sensação é que guerreamos batalhas perdidas.

Como a se desvencilhar dos antigos saberes, os jovens tecnológicos criam virtualmente um mundo novo, apenas na aparência. Muitos vivem apenas a repetir os mesmos erros do mundo real, confirmados através de guerrilhas simuladas, uma realidade que já existe. Não sairemos dessas armadilhas armadas diligentemente por décadas a fio por agentes do Sistema. Gostaria de colocar um “talvez” (tão caro a mim), mas o pouco que o Xadrez me proporcionou como conhecimento estratégico e senso de antecipação, aliado ao meu olhar cada vez mais descrente da atual fase da aventura humana, me leva a crer que não viverei para ver alguma mudança significativa no futuro próximo.

Tomando a liberdade de me apropriar de uma nomenclatura parente utilizada por Nietzche (não é o caso de matá-lo), se eu fosse estabelecer, pelo meu critério de humanidade médio, um super-humano na atual escala talvez escolhesse Darth Vader. Afinal, o que muitos tentaram, ao promoverem maldades isoladas e coletivas, menores e maiores, o supremo representante do Lado Sombrio da Força superou a todos ao aniquilar civilizações inteiras, ainda que tivesse poderes especiais para salvá-las.