B.E.D.A. / Agosto*

Romy e eu, em 2017

Eu me lembro de Agosto antes de você. Era o mês indeciso — por vezes úmido, outras vezes, seco; meio quente, meio frio; a luz inclinada a festejar as cores mais absurdas no entardecer. Mesmo os tons de cinza eram mutantes e se percebia o Sol a brincar de esconde-esconde com quem quisesse vê-lo.

Agosto forçava o reinício dos ciclos escolares e abertura do segundo semestre. Desde pequeno, demarcava a volta para o ambiente onde encontrava os meus desiguais. A minha vida de rapaz só tinha futuro, lá adiante, igualmente a gosto quântico — indefinível…

Anos passados por mim, noivei em Agosto e, quase uma volta inteira em torno do Sol após, aconteceu você. Horas antes do Dia dos Pais, então. Preanunciada meses antes, nomeada antes de vir à luz, Romy — a primeira dos Oliveira Ortega. Veio como tinha que vir, inesperada-esperada, carreando tanta energia que mudou tudo ao seu redor.

Este mês, de remediado, se transformou em intenso. Passou a ser o primeiro do resto da minha existência terrena, aquele que me fez homem-pai. Como é incrível perceber o quanto você cresceu, além de qualquer expectativa. Como é inimaginável saber que você sente, além dos nossos pobres sentidos, toda a dor do mundo. Como é extraordinário vê-la renascer, mergulho após mergulho na profundidade do organismo, no ser que é.

Como é insólito conhecer um ente mitológico em plena modernidade — uma leonina Fênix. Como é um privilégio poder amá-la e testemunhar o amor a reverberar para além da linha do horizonte, sem obstáculo a lhe impedir. Como é bom, Romy, ser o seu pai!

Tânia, Romy e eu, em 1989.

*Texto de 2017

Participam em B.E.D.A.:
Cláudia Leonardi
Mariana Gouveia
Darlene Regina
Roseli Pedroso
Adriana Aneli
Lunna Guedes

BEDA / Scenarium / Leonina

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Foto por Public Domain Pictures em Pexels.com

O dia começa quando ela desperta.
O sol irradia luz para clarear o seu caminho.
Decide seus passos à revelia dos obstáculos.
As portas se abrem quando ela se aproxima.
Os espelhos disputam o seu reflexo quando ela passa.
A festa acontece quando ela aparece.
O DJ toca as suas músicas preferidas.
Na dança, ela comanda a coreografia.
Mares e brisas de mil anos contam segredos
quando pede que seu amor se entregue.
Quando nasceu, aceitou nascer todos os dias
em partos dolorosos,
pelo poder de viver mínimas alegrias,
poucos momentos de paz e prazer,
riso, paixão e nexo.
Por isso, vive…
Por que tudo é assim?
Esse é um enigma que não desvendei.
A resposta, não sei.
Não saberia, ainda que fosse o rei.
Ainda que percebesse o contexto.
Escritor, queria escrever outro texto
que pudesse mudar o destino,
arquitetar outro roteiro.
Queria que ela vivesse à larga,
bebesse o vinho tinto da melhor safra,
a caipirinha da mais apurada cachaça.
Ainda que não fosse alguém que ela amasse,
que eu não fosse feito de carne, mas de doce cassis.
Que meu corpo não tivesse ossos, mas giz.
Que eu estivesse em outro país
ou que não a tocasse por um triz,
que não apreciasse seu perfume pelo nariz
ou que ela viesse de outra raiz,
queria ver alterada a diretriz.
Que pudesse escolher entre ser o condenado ou o juiz,
cumprir a dura pena ou decidir que ela fosse, apenas, feliz…
Já que não tenho como a proteger
da necessária passagem do tempo e do sofrer,
me resta somente lhe perguntar:
de que maneira eu melhor posso lhe amar?

B.E.D.A. — Blog Every Day August

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Lunna Guedes