quero… desejo… vou de encontro… invado… devagar…
passos silentes sobre a areia e a pedra…
o meu corpo recebe em ondas as águas mornas do abraço marinho
desta manhã que se anuncia receptiva ela também me deseja
as águas se mostram aparentemente turbas rebeldes
consigo ler a sua dinâmica de mulher apaixonada fogo em forma aquosa
os meus membros a penetram como um cavaleiro de espada em riste
em uma batalha que já perdi sei desde o início mas guerreio
fardo de homem que ao oceano ama e por ele se derrama em sal
eu o decomponho e o absorvo em minha mente
de querer amoroso marolas se disfarçam de amantes
desfaço-me em pequenas porções de moléculas de oxigênio e hidrogênio
o meu ego apartado de mim é lançado no mar profundo
me entrego ao beijo da amada no amanhecer revelador
raios de sol por testemunha
de que sou seu amor morro para esta existência em gozo
transformado em milhões de gotas
a rebater na arrebentação junto às pedras do arpoador…
Etiqueta: morte
#Blogvember / O Tempo
meu kairós em transcendência vida e morte (Obdulio Nuñes Ortega)

Por mais que especulemos sobre a sua natureza física, mecânica, para o comum dos homens o Tempo não existe fora da nossa percepção no final das contas. E dá-lhe fazer contas de mais e de menos para mensurar o quanto vivemos, a estabelecer tabelas com as quais programamos as nossas agendas de encontros e desencontros, trabalho, vacância, lazer, nascer, permanecer e morrer. Efemérides que falham em designar a qualidade do momento que vivemos, o minuto que passa ou Kairós.
Ontem, me reuni com pessoas que se moveram para estar juntas de vários pontos da cidade. Fizemos algo que quase nunca tenho a disponibilidade para fazer: conversar. Falamos sobre assuntos sérios, outros nem tanto. Discutimos sobre o clima, as chuvas, as secas – de territórios e de mentes – o frio e o aquecimento. Este é um mundo que está morrendo. Já ouvi dizer que os entendidos em mudanças climatológicos calculam que em três anos, veremos caravanas de pessoas se movendo para as áreas menos inóspitas em termos climáticos. Projetaram que a continuação do processo que ora se desenvolve resultará, em 2050, em várias faixas das áreas junto aos Oceanos inundadas, engrossando os números dos refugiados do clima. Questão de Tempo.
É triste perceber que as minhas visões juvenis de cataclismas mundiais esteja perto de se realizar. Eu sempre fui muito imaginativo, mas não era isso que gostaria que as minhas filhas venham a vivenciar num futuro próximo. Os meus textos de garoto amante de escritores de ficção científica – Julio Verne, Isaac Asimov, H.G.Wells, Jack Finney – primavam pela revolta da Natureza frente ao continuado ataque dos seres humanos. Eu me tornei abstêmio de carne buscando minimizar os efeitos de minha presença como típico predador pertencente ao topo da cadeia alimentar por isso, também. Não são poucas as vezes que penso em voltar a essa fase que durou dez anos. Não resolverá a questão, mas talvez diminua a minha culpa…
Previsões se baseiam na soma de sequência de fatos passados com a repetição de fatos presentes, resultando em consequências práticas. A experiência da Humanidade na Terra me induz a imaginar que no atual andamento dos eventos, chegaremos a um colapso global em menos tempo do que se esperava. O atual sistema de produção que desenvolvemos ao longo dos séculos, empreendeu um aceleramento que está precipitando em descontrole sistemático. É como se víssemos Cronos devorando os seus filhos. Não terei condições de experimentar o meu Kairós em transcendência de vida, mas sim de morte…
Participam: Mariana Gouveia / Lunna Guedes
#Blogvember / Viagem Interrompida
Entre sucessivos solavancos projetam veias de anil (Rozana Gastaldi Cominal)

busco me encontrar em você
que está onde?
onde eu me encontro em você?
observo às formigas que se reúnem em torno
de sua saliva que despencou da boca molhada
sou como elas tentando beber de suas afluências carnais
sou como a paleta do pintor plena de cores de meu pincel a jorrar
na tela entre sucessivos solavancos que projetam veias de anil
como se pollock incontrolável fosse a aspergir sêmen colorido
em seu corpo de ente ser pessoa mulher em fuga de mim em si
momento sentimento emoção violenta que lhe abençoa a existência
de fêmea senhora de si em mim a perfurar rasgar-me feito faca cega
que me mata me renova em revolucionários movimentos de subversão
múltiplas versões de nós espelhares — tesão
teso peso uso confuso escuso difuso intruso abuso de poder vil
sem saídas apenas entradas e bandeiras morte de etnias da terra nova
dominação e danação em invasões de tabas arrasadas
não é amor é horror de querer tanto que se quer partir e partir-se
em pedaços e espaços onde você ocuparia toda a extensão
de vazios e nadas por onde descaminho
perdido em viagem interrompida
pela via láctea derramada de flores florestas
de estrelas frias e solidão…
Participam: Lunna Guedes / Roseli Pedroso / Mariana Gouveia / Suzana Martins
#Blogvember / O Vício
Sem palavras, sem verbos, sem elos (Suzana Martins)

enxerguei a bituca sem filtro
grudada na soleira
eu a agarrei e a acendi
a fumaça ainda que tênue
meu pulmão recebeu
como a uma querida amiga antiga
nunca esquecida
morto de sede
absorvi as últimas gotas do copo abandonado
na mesa do bar
me senti embalado pelo odor remanescente do álcool
todos os anos de abstinência que me impus
se desvaneceram sob o império do vício
nunca debelado
ainda que não trocasse palavras
invocasse verbos
que estivesse sem elos aparentes
compartilhei da agulha do adicto solidário
inoculei para dentro das veias a dor
bela e mortal de perder-se
a invasão do mal me alegrou
eu aquele que está à beira da morte
me senti o ser mais vivaz
o gosto de sangue
vampiro retirado e arrependido
arremeteu em minha boca –
voltei a beber
voltei a matar…
bastou reencontrá-la
bastou beijá-la…
Participam: Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Lunna Guedes / Suzana Martins
Poeminhas
Larga
Vida larga
Sempre se impondo
Sobre a morte amarga
A corajosa largatixinha
Larga a antiga casa
Larga a vidinha
Rasa
Fechada
Que tinha
E se torna
Do seu destino
Rainha.
Igreja nossa que estais na terra
Onde um ritual divino se celebra
Se eleva a alma e desce a lágrima
Que seja o amor a sua obra prima.
Caminho…
a cada passo no chão,
deixo marcas dos meus pés
nas nuvens…



