14 / 01 / 2025 / Lembranças Pandêmicas

Em 2020, escrevi: “Tenho TOC. Estava acostumado a ter a disposição seis copos no repositório. Como demos alguns para a Lívia, passamos a ter cinco. Não pensei duas vezes, comprei um copo de requeijão do bom. Daqui a pouco, estará apto a ser usado. Logo mais, à tarde, passarei o que resta no pão italiano amanhecido e comerei com leite quente misturado ao café solúvel em vidro de geleia. Ah!… Apenas para constar, o meu pote de sorvete às vezes tem feijão congelado…”.

Em Janeiro de 2021, por mais que tentasse disfarçar, eu estava depressivo e percebia crescer uma imensa crise de ansiedade. Por mais que gostasse das atividades caseiras, só restava para fazer lavar louça, cozinhar, varrer o chão, passar pano, lavar-estender-recolher roupas no varal. Passei a viajar para o passado, buscando momentos que pudesse me resgatar daquele marasmo. Postei: “Devido à minha atividade profissional, ligada aos eventos artísticos no campo da música, de várias matrizes, que diminuía muito em Janeiro, eu aproveitava para descansar mentalmente e fazer minhas incursões pelo litoral paulista, normalmente à Praia Grande, onde a família tem uma casa. Mas em 2014, passei uns dias em Itanhaém, a convite do amigo Coimbra. Foram dias incríveis, dos quais apresento dois registros. Atualmente, a Pandemia de Covid-19 tornou tudo mais difícil. É preciso evitar aglomerações, o que impede que eu tenha o contato com o Sol e o Mar que tanto amo.”

Coimbra, Romy & eu…
Na Praia do Centro, em 2014

No final de Janeiro de 2021, sabia que se eu não tomasse uma atitude, eu teria outra crise. Em outras duas oportunidades, o meu corpo respondeu veemente revoltado, me levando a ficar na UTI, com graves crises orgânicas: na primeira vez, uma gastrite hemorrágica (com 6 de hemoglobina); na segunda, hiperglicemia (900 mg/dL), me levando à Diabetes. Nessa última oportunidade, fiquei quatro luas em Ubatuba. Eu me salvei. Ajudou-me escrever “Curso De Rio, Caminho Do Mar“, lançado pela Scenarium no mesmo ano.

Bob Esponja E O Amor

Bob Esponja e o seu famoso hambúrguer de Siri

Em julho de 2011, em férias da Faculdade de Educação Física, treinava quase todos os dias, mesmo que fosse em pleno inverno. Como a pia estava cheia de louça por lavar, o meu TOC fez com que me eu atrasasse para minha ida à academia.

Mãos à obra, enquanto isso assisti a um sensacional episódio de Bob Esponja, no qual ele se apaixonava pelo famoso hambúrguer de Siri que fez, a ponto de querer namorá-lo como a um ser vivo. Ao idealizar a relação, ele não percebeu que o outro nesse relacionamento era perecível, carne com prazo de validade muito curto. O objeto de sua atenção acabou por se deteriorar rapidamente, começando a exalar um mal odor ao qual todos percebiam, menos ele.  

Quando se deu conta do insofismável sinal de que havia se estragado, acabou por devorá-lo.   No final, é dito: “hambúrguer é para ser amado e devorado”. Tentando extrair algum tipo de mensagem, dessa forma um tanto egoísta de amar, poderíamos dizer que acabamos por consumir o nosso amor, como um palito de fósforo que, ao queimar, perderia a utilidade? Ou que ainda que não percebamos que a relação tenha acabado, queiramos continuá-la, apesar do fedor que desprende?

Filosofando, enquanto lustrava objetos exteriores, tentava fazer luzir espaços interiores, mas apenas afundava em ceticismo. Naquela época, eu me via melhor do que era ou parecia ser. Buscava alcançar a atenção de quem considerasse interessante e fazia comentários ácidos-inteligentes. Porém, suburbano até a última raiz do cabelo que se esgarçava, não era tão niilista quanto hoje sou.

Ainda assim, não acredito que devamos levar a um termo definitivo um relacionamento curto ou que perdure por “anos e nãos” de uma maneira tão brusca. Superar a aparente mesmice e a dor hedonista é uma prova de força de vontade acima do que se possa chamar de caráter resistente. É possível até que seja detectada uma espécie de dependência advinda da culpa por se viver razoavelmente bem, apesar da nulidade como homem voluntarioso. De forma contrária, terminar talvez seja prova de coragem por buscar sair da imobilidade mortífera que um amor malcheiroso exale pela perda de validade.

Eu, por mim, não desvalido quaisquer experiências de vida. Acredito que sejam como etapas que devamos transpor para continuar na viagem. Aonde se chegará? Em nenhum “lugar”, especificamente. O aprendizado é infinito. Creio em Pessoa quando diz (continua dizendo dentro de mim): “Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena”. Superar a si mesmo, a grande batalha.