#Blogvember / Terminei

Pretérito imperfeito oblíquo de um caos que nunca chega ao fim. (Suzana Martins)

Foto por Dustin Tray em Pexels.com

Quando foi colocado como tema deste 11/11 – abertura de portais – para inspirar a escrita dos participantes do #Blogvember, fiquei curioso com o tracinho azul que surgiu abaixo da locução “chega ao fim.” A IA estipula “considere utilizar outra expressão: “termina”. O IA não considera que a poeta possa querer criar imagens que passam pelas possiblidades, pelos contornos, pelas imagens possíveis, diferente da faca amolada que é determinada por “termina”. Chegar ao fim é uma coisa. Terminar, é outra.

No primeiro caso, chegar ao fim pressupõe que, como uma chuva (a não ser que seja um dilúvio) seja um fenômeno que tem hora para começar e hora para acabar. O “caos” é o referencial. De antemão, acredito que o Caos seja exatamente o esteio pelo qual caminhamos. Gosto da definição professada pela Física: “Sistema sem estabilidade, dinâmico, que se altera no tempo a cada pequena alteração das suas condições iniciais”. Esse dinamismo vital faz com que eu não certeza de muita coisa, tirante uma linha de pensamento que me define como Obdulio.

Considerando que o uso do pretérito imperfeito – que é aquele que se refere a uma ação anterior ao momento da fala e que, no tempo passado a que pertence, não foi finalizada, podendo ter sido, por exemplo, interrompida por outro acontecimento – esclarece tudo. No secundo caso, a ideia é de que o caos seja evidenciado. Numa relação íntima entre duas pessoas, possivelmente. Ainda que não seja, será o viés que utilizarei. Porque chegar ao fim num relacionamento não é exatamente o fim. Talvez, deixe de afetar tanto o presente, mas as marcas dos acontecimentos que envolveram os protagonistas delinearão o comportamento de ambos pelo resto dos dias.

A decisão de pôr um termo oficial na relação não é um corte feito sem dor. O apego aos bons momentos vividos é contrabalançado pelos percalços comuns à decisão de entregar-se, obliquamente falando. Quando um dos dois decide que o casal não deva continuar nesse acordo de intimidade exclusiva, o outro sofre tanto quanto como se fosse uma grave ofensa. Os argumentos recaem sofre a personalidade falível daquele que termina. Se for porque os olhares mais afetuosos pousam sobre outro ser, a sensação é de morte. Uma espécie de luto pela morte do antigo casal. Fim de estrada.

Na falta de um término melhor, colocarei a conjugação do verbo “terminar” (da sugestão pelo IA) no Pretérito Imperfeito Oblíquo :

Eu terminava-o
Tu terminava-lo
Ele terminava-o
Nós terminávamo-lo
Vós terminávei-lo
Eles terminavam-no…

Participam: Roseli Pedroso / Lunna Guedes / Suzana Martins / Mariana Gouveia

#Blogvember / Amantes Da Penumbra

seremos deuses de cada dobra escura… (Obdulio Nuñes Ortega)

Foto por Josh Hild em Pexels.com

dobramos as esquinas na penumbra da cidade abandonada
escorregamos por entre as fendas da solidão em desencontros
abrigados da chuva ácida nos olhamos em profusão
de raios e trovões da tempestade elétrica que nos iluminava
os lados escuros dos rostos cegos de mais ninguém
a lua quase apagada deixava um rastro de silêncio
não ouvimos as vozes que nos alertavam não se amem
não se queiram a lei proíbe por contenção de desejos
os supremos nos observam vendem vendas
para que durmamos alheios da claridade que o amor proporciona
a clareza da dor a imensidade da percepção a profundidade do querer
avançaremos sobre as muralhas escorregadias da lama que escorrem
do alto dos gabinetes dos governantes do caos
senhores das benesses vendedores das necessidades dos seres perdidos
este mundo apesar de tudo já foi melhor ou melhor achávamos isso
tudo acontecia ao derredor as dores os sofrimentos sempre no plural
insidiosos perfurantes algozes menestréis do mal anunciavam
que viúvas aportariam às praças que mães chorariam nas escadas
que as portas se fechariam aos amores que as crianças não sobreviveriam
nos apaixonarmos é uma revolução um não ao não
se mais nada restar seremos amantes deuses de cada dobra escura…

Participam: Lunna Guedes / Suzana Martins / Roseli Pedroso / Mariana Gouveia

Carta Do Passado Para Todos Os Tempos*

LALÁ,

demorei a lhe falar porque normalmente declino um monte de asneiras. Mas com você sinto-me à vontade para expô-las. O que digo aqui provavelmente não conseguiria dizer para a maioria das pessoas mais próximas do meu relacionamento, já que levo uma vidinha bem provinciana em termos familiares e amistosos. Discussões sobre a intimidade divina não passam dos anúncios de aforismos cristãos e de tentativas de relacionar-se com Deus através do temor.

Creio que Deus seja o deus do possível e tudo que passa por nosso pensamento é passível de existência. Se não existe no mundo material, palpável, pode passar a existir em nossa mente, onde criamos mundos inteiros. Com a imaginação, conseguimos subverter as leis e a ordem natural das coisas. Ou antes, a ordem natural das coisas passa por nossa ordem pessoal das coisas. Em última instância, mesmo que nós, como observadores, queiramos manter-nos distantes do mundo que nos cerca, normalmente interferimos na sua definição. Porque ao fazê-lo, usamos expressões e palavras, normalmente inexatas, parciais ou corrompidas por usos anteriores. Enquanto não tivermos a capacidade de nos comunicarmos por puras ondas mentais, quaisquer materializações, por palavras, símbolos e ações, dificilmente será entendida em sua integridade. Ainda mais porque a Matemática, língua oficial de Deus, não é alcançada pela maioria das pessoas e quem as utiliza talvez estejam presas a ditames que obedecem a fronteiras delimitadas.

E mesmo crendo que as construções linguísticas de que dispomos não sejam suficientes para o entendimento humano, confesso: como gosto de brincar com as palavras! Sinto-me bem, principalmente quando elogiam o que eu digo. Sinto-me envaidecido ainda mais quando crio uma expressão que consegue penetrar o âmago de alguma questão. Antes, quando não nos comunicávamos tão celeremente como fazemos hoje em dia através das redes sociais que nos agrupam em uma “sala”, estejamos aqui ou no Haiti, a única maneira que poderia existir para me apresentar (eu, por minhas palavras) seria escrevendo um livro que fosse publicado ou conversando com colegas e amigos, em rodas menores de contato direto. Da maneira como ocorre atualmente estamos criando uma poderosa máquina de comunicação, ainda que não compreendamos tão prontamente todo o seu alcance e força. Ao final, espero que a vacuidade da minha vaidade intelectual não me desvie do objetivo primordial que é conhecer-me através dos outros.  

Para adentrar no assunto que me levou a lhe escrever, digo que gostei muito do modo como o Prof. Laércio expôs a sua teoria sobre o Cosmo, integrando a Física – a Quântica e a Tradicional ( ainda mágica, mesmo assim) – à ainda subentendida dimensão espiritual. Ao discorrer sobre a existência de uma base plausível de ordenação do Universo visível e invisível, pela primeira vez em muito tempo, senti-me confortável em ouvir sobre equações e leis estruturais do átomo. Fiz anotações, como em uma aula normal, enchi o meu caderno de rabiscos e expressões e coloquei, lado a lado, números, questionamentos filosóficos, incitados pela Física, o princípio da incerteza e a confrontação entre a Matemática estatística e a objetiva.

Mas não passarei para você coisas que você já ouviu no vídeo, porque isso seria só repetir o curso. Darei a minha impressão sobre o que mais me chamou atenção – a menção feita de forma meio solta, quase casualmente, no terço final da palestra: somos um projeto de “extraterrestres”, seres de um dos níveis de energia do Campo Unificado. Para isso, mesmo temendo ser enfadonho, farei uma introdução.

Em cada passo que dava, o Homem enxergava uma ameaça à sua espreita – a cada animal ágil e voraz, a cada urro que ecoava pelos ares, a cada forte ventania que arrancava árvores inteiras do chão, a cada raio que riscava o horizonte. Porém, cada vez que via surgir a luz do dia ou a cada estrela que reluzia na abóboda celeste à noite, a cada flor que se projetava fora do manto de neve no início da primavera ou a cada canção produzida pelo roçar da brisa nas folhas das árvores, o mesmo Homem podia sentir a vibração da Vida a se afirmar.

Entre o medo e o encanto, a nossa espécie sempre preferiu se encantar e ultrapassar os seus próprios limites físico. Ela preferiu se identificar mais com o voo do pássaro do que com o rastejar da cobra e passou a se utilizar de sua poderosa imaginação para se desvencilhar das amarras que a prendiam à Terra. Tentou encontrar um sentido para o Mal, um equilíbrio no aparente Caos e se dedicou a se projetar de encontro ao Infinito, ao Invisível, à Força que percebeu existir por trás de cada acontecimento em seu entorno. Creio que a organização civilizacional ao longo do tempo, ao tornarem as crenças em instrumentos de castração e não de libertação espiritual, criou prisões em que o antagonismo se evidencia e se transforma em violência.   

Sempre me impressionou, conforme eu estudava o corpo humano, a capacidade plástica do cérebro, que parece ter sido feito para atender ao crescimento exponencial da inteligência humana. E como tudo é aparência, conforme as leis físicas conhecidas já deixaram descortinar ao tentar desvendar o Universo, do infinitesimal ao Infinito, aproveito para brincar com as possibilidades que o Prof. Laércio lançou com as suas ideias.

A capacidade desenvolvida pelo ser humano (ou para o ser humano) para chegar ao entendimento, ainda que mínimo, de sua condição foi resultado da evolução ou da criação? O chamado “desenho inteligente” do corpo humano seria uma prova inconteste alegada pelos criacionistas de que fomos criados pelas mãos de um ser superior. Não me oponho a essa ideia. No entanto, acredito que o surgimento do Homo sapiens obedeceu a um projeto engendrado pela Inteligência Universal para o nosso planeta, convertido no que poderíamos chamar de um grande laboratório existencial.

Na explanação do Prof. Laércio, ele citou que uma inteligência de fora deste plano que utiliza este planeta para que a Consciência, individualizada em corpos, se desenvolva para além das limitações impostas pelos invólucros corporais. Neste caso, a maior frequência de oscilação do campo energético desenvolveu a sua individualidade. Mesmo sendo uma “perturbação na Força”, não deixa de ser maravilhoso que essa manifestação da Criação apresente uma identidade diferenciada, um projeto “pessoal” de Deus.

Eu elaborei ao longo do tempo essa mesma percepção que, das formas mais básicas de vida até a “criação” do ser humano, fomos desenvolvidos em um processo supervisionado por entes “próximos” de nós. Este lugar onde vivemos é onde a nossa essência vivencia, vestida de homem ou de mulher (ou de…), as experiências necessárias para a nossa emancipação.

Mas a Terra não pertence só aos seres superiores (como vaidosamente consideramos ser), mas também às outras espécies que hospedam níveis de consciência mais diluídos ou ainda não totalmente desvendados. Por isso, devemos aprender a equilibrar a demanda de recursos, preservando a existência dos outros entes que convivem conosco nesta nave.

Muito mais besteiras poderia alinhar em sequencias absurdas, mas se você chegou até a estas últimas frases, aproveito a oportunidade para agradecer por estimular novamente esta minha vertente onde brotam ideias destrambelhadas, mas intimamente ligada ao melhor de mim.

                                                                                                                               Abraços!

*Texto de 2011

Projeto Fotográfico 6 On 6 / Geometrias / Aparências

De início, Geometria é a parte da matemática que estuda rigorosamente o espaço e as formas (figuras e corpos) que nele podem estar. Porém, as suas variadas expressões nos induzem que usar o termo Geometrias não seja contraditório, mas complementar – analítica, plana, descritiva, cotada, elementar, euclidiana, não-euclidiana, espacial ou a de n dimensões. De maneira generalizante, a maioria das pessoas pouco dá importância às questões geométricas, apesar de seus corpos viverem num determinado espaço geometricamente quantificado.

Essa desconexão não as impede de continuar respirando, mas dá bem a dimensão da ignorância que graça entre nós no sentido de entendermos como pouco estamos ligados à beleza matemática da Vida. Todos nós praticamos ações intermediadas pelos elementos geométricos. Apesar de não possuir definição, dão base para eles a reta, o ponto, o plano e o espaço. São noções primitivas de funcionalidade. Dado tantos fatores que estabelecem a nossa vivência em continentes e mares, florestas e montanhas, a vibração vital é modulada através dos corpos incongruentes dos seres vivos geometricamente espalhados pela superfície da Terra – figura arredondada, apesar de opiniões ao contrário –, um dos muitos planetas presentes no Espaço infinito, entre estrelas, galáxias e buracos negros.

Dentre as questões matemáticas mais impressionantes que conheço estão a dos números fractais. São conhecidos como fractais as formas geométricas que se repetem infinitamente em diferentes tamanhos. Ou seja, ao observar-se um fractal em diferentes escalas, é possível perceber o mesmo padrão, ainda que tenha tamanhos diferentes. Esses padrões matemáticos infinitos são apelidados de “impressão digital de Deus”. Os fractais estão ligados a áreas da Física e da Matemática, chamadas Sistemas DinâmicosTeoria do Caos, porque suas equações são usadas para descrever fenômenos que, apesar de parecerem aleatórios, obedecem a certas regras – como o fluxo dos rios, o formato de uma montanha ou a formação dos galhos de uma árvore.

São Paulo contém tantas formas geométricas que poderia representar o exemplo típico de confusão visual que mais assusta do que acolhe. Para quem a ama, é atraente e desafiadora. Nesta imagem, colhida em dia de chuva, pela manhã, o caminho em linha reta sempre poderá ser obstruído por uma bela visão… ou por hordas de seres humanos deitados embaixo de alguma marquise, cobertos por panos puídos.

“Longe das cercas embandeiradas que separam quintais, no cume calmo do meu olho que vê, assenta a sombra sonora de um disco voador…”. Eu me mudei para esta região em 1969. No alto dos morros, apenas o verde imperava onde atualmente se observa construções de tijolos aparentes em sua maior parte. São como quadrados e retângulos alinhados em áreas em declive. Engenhos da arte da sobrevivência. Essa região pertencia a uma antiga fazenda loteada em terrenos de 250m², em média. Isso, na parte “plana” do vale, onde podemos ver as casas desta rua, na várzea do Rio Guaraú que em tempos idos inundava a região.

Essa é a Gertrudes, nossa Kombi (em registro de 2013) que, nos anos iniciais do Século XXI, serviu para transportar a nós e aos equipamentos da pequena empresa de locação de equipamentos de som que meu irmão e eu temos para as mais diversas localizações, dentro do Estado e para além da fronteira. Em Portugal, as Kombis são chamadas de Pães de Forma. Basicamente, é um veículo em forma retangular, nada anatômico do ponto de vista do conforto, mas tão funcional que a chamamos de “coração de mãe”, pois tudo cabe nela, se bem posicionado. Um enigma em termos matemáticos… como se fosse um universo paralelo.

O círculo de fogo “lá em cima” gera a energia que nos aquece. Sem o Sol, nenhuma forma de vida neste planeta existiria. A Terra está na distância exata para que não desfaçamos em pó ou nos enregelemos a ponto de sermos estilhaçados feito pedações de vidro. No céu, as nuvens navegam ao sabor do vento, se formam e se desformam ao “gosto” da pressão atmosférica. Carregam partículas que podem se precipitar em forma de gotas d’água. Tudo é forma, aparência, ainda que gasosa ou aquosa.

O Homem não inventou a roda. Apenas descobriu como utilizá-la para se locomover mais rapidamente e para carregar maiores pesos com o auxílio de animais como bois e cavalos, revolucionando a Civilização. Segundo Platão, a roda já existia no Mundo das Ideias, também chamada de Teoria das Formas. Mais cedo ou mais tarde, seria natural que se materializasse. A forma circular é utilizada para vários fins, desde arquitetônicos até mecânicos, além de comparecer como elemento essencial em vários esportes na forma da bola. Neste registro feito em movimento desde as Marginais do Rio Tietê, sugere mais uma pintura do que uma foto de uma roda gigante. Uma das maiores do Brasil, está localizada no Parque Villa Lobos, sendo uma atração turística recente na capital paulista.

Participam:


Mariana Gouveia / Roseli Pedroso / Suzana Martins / Lunna Guedes

BEDA / Transmutação

A metamorfose se deu, de início
pelo olhar…
O movimento dela o paralisou.
Como se fotografasse cada gesto,
aprisionou dentro de si a evolução
do casulo à borboleta —
da flor ao céu —
asas da imaginação…

Quis recuar quando suas vozes
ocuparam o mesmo ambiente —
palco de suas atuações…
Percebeu que fluíam sonoras
conversas de palavras
entrecortadas,
caladas…
As lacunas preenchidas de desejos
perfeitos em suas incompletudes.

Quebradas as barreiras —
distâncias de centímetros-quilômetros —
peles sem proteção,
mentes despertas,
liberta de atavismos
e consequências,
o imediato transformado em eterno,
se reconheceram outros,
os mesmos…

Ele,
transmutado
de Jackyll em Hyde,
de homem em lobo,
de mortal em vampiro,
de Clark em Superman
todos e ninguém,
vivia ausente de si…
Passou a respirar o vácuo
se não aspirasse o hálito da paixão…

Transformação
irremediável,
perigosa,
instável,
liberdade de viajante
encarcerado,
não trocaria o permanente desconforto
do atual caos de criação do mundo
pela antiga estabilidade de morte
em vida…

Foto por Brenda Timmermans em Pexels.com

Participam: Alê Helga / Mariana Gouveia / Lucas / Lunna Guedes / Roseli Pedroso / Cláudia Leonardi / Suzana Martins / Dose de Poesia