BEDA / A Lua De Suez

desmesurado calado em pés
contra o pouco calado do canal
Sempre Verde carregado trava no Suez
com o peso da civilização humanal
na estrada d’água desvia do caminho
encosta seu corpanzil na linha marginal
como se navegasse simples ribeirinho
por imperícia, termina encalhado
interrompe a circulação da riqueza
empobrece um pouco o rico abestalhado
imerge o pobre ainda mais na pobreza
previsão de prejuízo, bilhões de dinheiros
chama-se técnicos, consulta-se cientistas
move-se fundos, usa-se máquinas, traz-se engenheiros
faz-se planos, formula-se teorias mecanicistas
a personagem longínqua no espaço
a tudo testemunha, eterna observadora
de guerras, vida, morte, a discórdia, o abraço
de idas e vindas, marés e secas, a causadora
intervém o astro feminino, a Lua, filha da Terra
mostra a altaneira, pacífica, estival, face plena
com a sorte sazonal da fase ideal, encerra
com a elevação das águas, a crise terrena
lição para os seres que se colocam como supremos?
terão percebido os donos do poder o quão são pequenos?
alienados conseguirão se situarem longe dos extremos?
buscarão no centro da Força a grande a oportunidade que temos?


Adriana Aneli Alê Helga – Claudia Leonardi Darlene Regina
Mariana Gouveia – Lunna Guedes / Roseli Pedroso

Os Meninos E A Bola*

Futebol

Campos vazios, agora.

Minutos antes, os meninos que nós fomos, corremos atrás da bola de futebol ̶ a disputamos em divididas; a passamos para os companheiros do nosso time; a perdemos para o time oponente; a chutamos para a meta adversária; nos defendemos de seu avanço contra a nossa meta; a saudamos pelos gols feitos por nós; a amaldiçoamos por vê-la ultrapassar por nossos defensores; a rejeitamos por surpreendê-la dócil aos pés de outro amante; a desejamos cada vez mais a cada rejeição… Ao sairmos do campo, deixamos os meninos que nós fomos para trás e nos encontramos crescidos  ̶  jogo ganho ou perdido.

Voltaremos para as nossas casas, para as nossas mulheres, para os nossos filhos, para os nossos afazeres, à espera do futuro em que seremos meninos, novamente…

* Texto de 2015, quando ainda jogava futebol com os companheiros. Hoje, só em sonho…

Quimera

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Figura in: https://www.oversodoinverso.com.br/misteriosa-lenda-da-quimera/

Ouviste, certa vez, o chamado atávico e o teu corpo
Transformaste em instrumento de vida, dos pés ao metacarpo
Resultado de encontros de vultos de épocas anteriores
Estavas preparada para aceitares a vocação de sonhadores
Os teus pés, adaptados para saltar, além de caminhar
Deslizavam, além de se mover, comoviam, quando te viam transpirar
Transpôs o óbvio com os teus passos construídos de dor
Quando tinha que comer, viveu apenas de ar e bebeu apenas suor
Segurou o ar, quando tinha que se expressar, calou a palavra
Para emudecer, de emoção, uma multidão, com a arte de tua lavra
Leoa com andar de serpente, és um monstro, uma quimera
Quem pensa que te conquista, em verdade não considera
Que é consumido pelo fogo da qual és filha, mãe e senhora
Concedes a atenção obsequiosa de quem és servil portadora
Da graça suprema de seduzir e encantar, de prometer o Paraíso
Ao alcance do olhar, de sereia que faz o navegador perder o juízo
Vives na terra, apesar de viajar pelo amplo, para além, para o espaço
E fulguras, diminuta figura com as asas de Ísis, a voar para além do chão escasso…

 

 

 

 

 

Deuses

Deuses
Deusa da noite…

No fulgor do instante
em que nos separamos do  mundo
e entramos em outra dimensão…

No momento em que corpos se fundem,
fundam uma nova existência
e se aprofundam
no mar cósmico do gozo…

Na aceitação de que somos ingentes,
a deitarmos entre estrelas que dançam,
exclamas: “Pareces um deus!”…
Então,
me sinto teu,
me sinto tanto…
me sinto são…

Espalmo minhas mãos
contra a planta de teus pés –
beijo tua flor de lótus,
entoo preces
e te possuo…

Te sinto uma deusa…
Mais do que isso…
Te sinto maior que tudo…
Te sinto Mulher…