Outro dia, fui até a região de Pinheiros e observei um processo comum em toda a São Paulo — a substituição gradativa de vilas de casas e ruas tranquilas pelo excesso de veículos em vias estreitas para a passagem de carros em asfaltos irregulares, resultado de ruas mais frequentadas pelo adensamento urbano.
A chamada Gentrificação Urbana faz com que as características de bairros em que a vizinhança que se conhece, que se frequenta, que monta quermesse na igreja ou na escola, que mantêm laços afetivos, geram namoros entre os moradores, integram times de futebol — a rua de cima contra a rua de baixo — o acompanhamento no crescimento das crianças, o conhecimento do vendedor de pipoca, da vendinha ou da mercearia, a solidariedade nos momentos mais difíceis. Tudo se esvai como areia na ampulheta…
A radical obliteração de estilos de vida mais leves e saudáveis por um estranhamento de pessoas que não se reconhecem mais torna-se praticamente irreversível. A pressão pela própria decadência da qualidade de vida, a alienação dos residentes uns dos outros, encastelados que acabam por ficar nos novos edifícios, configura uma tendência intrínseca ao formato esquemático de quadrados dentro de quadrados dentro de quadrados.
A urbanidade se perde em sentido inversamente proporcional à demolição dos antigos imóveis construídos ao gosto do morador. A não ser os mais aquinhoados de poder econômico, as celas com janelas para outras janelas se multiplicam como se devêssemos aceitar que um apartamento configure o símbolo máximo de status do cidadão. Normalmente, quem participa da construção de um edifício dificilmente terá condição de adquirir aquele imóvel.
Apesar disso, a construção participa da ocupação de uma volumosa mão-de-obra em todas as suas etapas. É interessante notar que além da consequente segregação socioespacial de quem adquire um imóvel, ocorre o afastamento de pessoas de orçamentos familiares menores contribuindo para a expansão da desigualdade econômica.
Eu me lembro que um dos objetivos de Oscar Niemeyer ao construir o COPAN ao colocar no mesmo andar apartamentos maiores e menores, contribuiria para pessoas mais pobres morassem ao lado de pessoas mais ricas. Não sei se isso chegou a acontecer em algum momento, mas com o tempo houve uma homogeneização das classes econômicas dos moradores. Isso se processou de uma maneira quase “natural”. O que talvez se distinguisse um pouco no agrupamento tradicional suplantado pela verticalização.
Enfim, existe uma planificação dirigida de fora para dentro tanto por parte dos empreendimentos em que a classificação econômica das pessoas é clara, obviamente com a participação do interessado em adquirir a propriedade. Um dos quadros mais interessantes do jornalismo versa sobre os direitos e deveres de moradores de condomínios. Os síndicos têm que se desdobrarem como se fossem administradores de uma pequena cidade para fazer reinar a boa convivência dos condôminos.
Viver em grupo não é fácil…
