Em determinada época da minha existência, estava convicto em viver apenas de luz. Ela seria o meu alimento e o meio pelo qual caminharia. Seria um asceta. Estava convicto disso. Convicção é uma graça só concedida aos ignorantes, aos profetas, às crianças, aos inocentes ou aos loucos. Eu ainda apresento algumas convicções. Sem elas, sucumbiria ao relativismo imposto pelo Manual da Isenções de Posicionamentos Pessoais. Preciso manter meus preceitos, ainda que à revelia das modas e das opiniões coletivas consagradas como fatos da vida (até a próxima tendência alterá-los). Sem certezas, me perderia na escuridão, apesar de gostar dela para contrapor à claridade solitária. Porque, ao final de tudo, estamos sós.
Por caminhos que o reconhecemos apenas após percorrê-los, ainda que as indicações sejam claras, acabei por trabalhar fisicamente com a luz. Eu e meu irmão somos sócios em uma pequena empresa de prestação de serviços em sonorização e iluminação para eventos. Por alguns anos, ao ser solicitada a minha profissão no preenchimento de algum documento, assinalava sem estar muito convicto: Iluminador.
Consigo viver de luz, portanto. E som. Participo de festejos, de congraçamentos, de diversão. Sou do circo, não do pão. Mas me alimento dos momentos que se revelam luminosos, principalmente após a terceira dose dos participantes. Os meus possíveis personagens se apresentam. O escritor presta homenagens transversas. Faço uso da palavra que me salva. E me condena. Meu vício e alimento.
Pela palavra, me revelo, me identifico, me abismo. A cada queda, uma revelação. A cada texto, glória e decepção. Disso, se diferenciam dos filhos. Apesar de parecer uma gestação. Em 2017, publiquei um livro – REALidade, pelo selo Scenarium Plural – Livros Artesanais. Eu me senti feliz pela oportunidade de trazer a minha expressão para o velho formato. A palavra cristalizada em letras impressas tem um fascínio estranho. Quase como se fosse a construção de um portal (a)temporal baseado em Física Quântica. A sensação parece ser a mesma. Viajo sempre.
Na passagem de 2017 para 2018, trabalhei na minha função. Realizamos um belo evento. Recebemos como retorno a plena satisfação do público. Após todos se retirarem, restou a nós, responsáveis pelos equipamentos que dão suporte à apresentação dos artistas do canto e da dança, desmontar o “Circo”. Ao final, para “descerrar a cortina”, apaguei as luzes do salão. Foi então que percebi alguns dos copos com as velinhas ainda acesas sobre as mesas. Bruxuleantes, as luzinhas invadiram o meu olhar de sonhador. Me sentindo abençoado, parti dali estranhamente iluminado e iniciei um novo calendário.
Você fala de luz e eu de breu… sou esse constante fechar de olhos para escrever dentro, nas paredes da pele.
O que seria do breu sem a luz? Assim como de modo contrário. Aliás, de alguma maneira, da escuridão “fez-se a luz”…