Uma das minhas três filhas, a Ingrid, achou que conhecer o Museu Inhotim, em Brumadinho, Minas Gerais, seria interessante sob vários pontos de vista – aventureiro, cultural, emocional. A viagem ocorreria pela época do Natal. Eu, em ritmo frenético de trabalho, decidi me deixar levar pela ideia, sem considerar todos os aspectos envolvidos, como normalmente faria. Confiei no tino para viagens de uma moça que já havia se enfiado no meio do mato sendo alérgica a picadas de formigas e que decidira visitar as frias praias de Montevidéu, a ponto de usar agasalho para enfrentar o vendo gelado vindo do mar. O meu objetivo principal era o de estar com a família reunida no mesmo ambiente por dois ou três dias, depois de tanto tempo dispersada. Com a agenda repleta de atividades pessoais de cada um, mal ficávamos por algumas horas juntos, normalmente em comemorações festivas ocasionais. Às vezes, nem assim…
Sairíamos de São Paulo logo cedo, às 6h do dia 22. Todos cansados da última semana de trabalho antes do Natal, nos levantamos uma hora e meia depois e apenas às 9h30 botamos o “pé na estrada”, a sol pleno. Pelo aplicativo, já sabíamos que teríamos um atraso de hora e meia devido um acidente na região de Mairiporã da Rodovia Fernão Dias. Vimos depois que dois enormes caminhões obstruíam metade da pista, em acidente aparentemente sem feridos. Esse seria apenas o primeiro dos vários percalços pelos quais passaríamos durante o trajeto. Para ajudar a aumentar o tempo, em diversos trechos enfrentamos pancadas de chuva pesada.
Felizmente, a paisagem pelo caminho era bela o suficiente para nos distrair. Mesmo com fome depois de duas ou três de acréscimo pelo congestionamento, decidimos comer apenas quando ultrapassássemos a fronteira com Minas, famosa por sua culinária saborosa. Paramos em Cambuí e fomos recompensados pela boa comida do Restaurante & Alambique Capela – isca de tilápia e costela no bafo, com tutu de feijão e arroz, além de outros itens. Levamos, após degustação de um golinho de ouro e prata, uma garrafa de cachaça de Cambuci, de sabor luxuoso e cor extraordinária de fogo.
Mais duas ou três centenas de quilômetros à frente, fizemos uma parada em um posto e restaurante da Rede Graal, talvez na altura de São João Del Rey, talvez mais adiante. Normalmente não citaria, mas este guardava uma boa surpresa – a reprodução dos casarios típicos de cidades como Ouro Preto e outros logradouros-patrimônios da humanidade, com móveis, objetos e itens dos séculos XVII, XVIII e XIX. Se aquelas cópias já dão água na boca, imagino o prazer de caminhar por esses lugares que respiram História. Sim, eu, um estudante de História e aficionado de prédios e objetos antigos, nunca fui a esses cenários de imersão histórica. Os motivos, vão da simples falta de dinheiro, quando novo, como falta de tempo, quando mais velho, passando por fases de retiro pessoal.
Novamente a caminho, com a reprodução reiterada de lindas paisagens, asfalto, chuvas ocasionais (sempre intensas), trechos congestionados, pequenos acidentes e paradas para idas ao banheiro e alimentação, já imaginávamos que chegaria o final de ano, mas não Brumadinho. A filosofia de que importa a viagem, não o destino, deixou de ter graça. Noite feita, no horizonte surgia a imensa Lua a nos indicar a direção. Por boa sorte, durante o trecho final já não chovia. Como desligamos os celulares para economizar baterias, sabíamos que “entraríamos pela saída” do Quilômetro 501 da Fernão e só os religamos quando estávamos próximos. No entanto, talvez fosse melhor utilizar uma saída anterior, porque começamos a duvidar que aquele fosse o caminho correto para nosso destino. Estrada ruim, cheia de barro no trecho de terra, irregular no trecho que finalmente se tornou asfalto. Como o GPS não conseguia encontrar o endereço exato da rua onde ficava o lugar de nossa hospedagem – Roztel –, coloquei o Museu Inhotim como referência e a “Moça” nos levou pelo circuito mais óbvio para ela.
Quando passamos pelo museu, chegamos em uma rua na qual encontramos outra referência – o Ponto Gê –, um restaurante. Paramos em uma perfumaria e farmácia, que felizmente ainda estava aberta, mesmo sendo pra lá de 21h, e nos indicaram como chegar ao local que procurávamos. Com um dos celulares, a Ingrid mantinha contato com Rosângela, a proprietária, informando sobre nosso paradeiro. Atenciosa, pediu para o marido, Luciano, nos encontrar na rua. Finalmente, conseguimos entrar pelo portão da bela casa que nos abrigaria pelos próximos três dias. Passava das 21h30. Doze horas depois de nossa partida. A Lua nos recebeu no novo cenário com todo o seu esplendor. O simpático casal, ao qual nos afeiçoamos, logo nos deixaram à vontade e dormimos o sono dos justos, na expectativa do dia seguinte, em que conheceríamos Inhotim – o maior museu a céu aberto do mundo.
Mas essa, já é outra história…