Tenho a tendência de esquematizar todas as experiências que vivo. Experiências como ensaios, experiências como experimentos, experiências como tentativas. Que normalmente induzem a erros. E erros cimentam o meu caminho. São erros repletos de boas intenções. Portanto, irei direto para o Inferno. Sendo ensaios, me pergunto para quê ensaio, afinal. Apresentarei, ao final de tudo, um grande espetáculo, sem erros? Para quê, se durante os ensaios, acabo por ferir tanta gente, que finalmente me levarão ao ostracismo? Terei ainda muito tempo para ensaiar? E esse espetáculo, quando estreará? Se estrear…
A questão do Tempo é primordial, mas especulo que a Eternidade seja um conceito fora do tempo. Teorizo, ainda, que seja um sentimento de plenitude absoluta, em que sendo alcançando dentro do Tempo, contudo se separa dele, permanecendo no repositório das coisas infinitas – ad eternum. O Amor, por exemplo, poderia ser depositado na caixinha do Infinito? Pareço abarcar o Infinito e o Eterno no mesmo ramalhete, como flores nascidas no mesmo campo. Mas o que é infinito pode não ser eterno ou o que é eterno pode não ser necessariamente, infinito. Porque quando amamos profundamente, esse é um sentimento que será lançado na torrente da Eternidade. Porém, quando direcionamos o amor a algo ou alguém que deixamos de querer, esse amor deixa de ter a qualidade da infinitude. E, ainda, um amor que vivemos intensamente, apesar de ter esfriado com a vivência, pode conter momentos depositados nesse repositório.
Ouço pessoas dizerem o quanto é extraordinário falar sobre aquele amor como se fosse uma história vivida por outros personagens que não fossem elas. Acho muito interessante presenciar pessoas que continuam juntas apenas pela simples lembrança de quando se amaram profundamente. Quando se tem frutos desse amor – filhos – os pais chegam a amá-los mais do que a si mesmos, ainda que sejam a personificação dos ex-companheiros, os quais muitas vezes não somente deixam de amar, como a odiar – o que vem a ser um sentimento-flor pútrido nascido no mesmo campo do perfumoso Amor, tendo como símbolo um anel de metal que ainda une o casal.
Filhos seriam, naturalmente, amáveis para os pais assim como deveria ser também os pais pelos filhos. Contudo, desde os primórdios dos relatos bíblicos, percebemos que essa é uma relação tempestuosa. Considero que também aprendemos a amar aos nossos filhos, bem como o contrário também ocorre. Conquanto, quando o sentimento amoroso se dá em profundidade, ele é Amor – une-se à Eternidade – quando esse sentimento se condiciona às condições externas de tempo e lugar, ele é apenas amor… E amores vêm e vão…
Podemos nos perder em reproduções baratas de algo grandioso que vivemos um dia ou que se ouviu falar alhures. A saudade que fica de um relacionamento intenso poderá ser vista, na distância, como presença na ausência, na falta de uma definição melhor. Quando conseguimos superar a falta que alguém nos faz, podemos alcançar, com o fluxo do tempo, um sentimento de constante comparência do ser ausente, tornando-o, estranhamente, presente.
É dessa forma que sinto a presença, por exemplo, de minha mãe. Não só a sinto espraiar as suas ramificações genéticas sobre o meu corpo, como “converso” com ela o tempo todo. São diálogos mentais, com uma sensação consciente de existência espiritual. Ajudou-me bastante o fato de sonhar com a Dona Madalena, com os seus belos cabelos brancos e sorriso largo. Ao lhe perguntar como estava, me respondeu: “Estou em paz…”. Bastou-me para acordar a partir desse dia com um sentimento de perene saudade sorridente.