Taquara*

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A voltar da academia, ao passar por uma rua próxima de casa, ouvi o seguinte bordão apregoado pelo alto-falante de um pequeno caminhão: “Temos bambu! Bambu para varal! Dois Reais cada um! Trocamos também por Tele-Senas vencidas ou baterias de carro usadas!”…

Passei pelo caminhãozinho. Na carroceria constavam parrudos bambus, uns vinte, de quatro metros cada, pelo menos. Há muito tempo que não via esse tipo de material, um dos mais ecléticos que existe. Ainda mais aqui, em São Paulo, mesmo sendo este, um bairro de periferia.

Senti vontade de comprar pelo menos uma vara de bambu, que eu não sei em que poderia usar, mas pelo menos ficaria em algum canto do jardim, como um exemplar raro de um tempo que passou…

Lembrei-me das taquaras de bambu que eu usava em minha meninice para várias finalidades, da confecção de pipas a cercas e, obviamente, varais. Houve tempo em que a maior parte dos paulistanos vivia em casas térreas e qualquer casa tinha quintal. Erguíamos a corda do varal em um ponto central para que recebesse uma maior incidência dos raios solares. Quando havia brisa, quaisquer lençóis transformavam-se em bandeiras brancas e coloridas, verdadeiras alegorias da liberdade.

Em tempo, Sílvio Caldas compôs uma das mais belas canções da nossa música, chamada “Chão de Estrelas”. A letra toda é um primor. Em certo trecho, ele cita:

“Nossas roupas comuns dependuradas
Na corda qual bandeiras agitadas
Pareciam um estranho festival
Festa dos nossos trapos coloridos
A mostrar que nos morros mal vestidos
É sempre feriado nacional”…

Eram outros tempos, de varais, de quintais, de morros pacíficos e não apenas “pacificados”… Será que a taquara ainda está a R$ 2,00? Provavelmente, não. Não são apenas as nossas referências numéricas que se movem na memória…

*Texto de 2015

3 thoughts on “Taquara*

  1. Acho que não cheguei a ver um varal feito com esse bambu. A bem da verdade fiquei a espreitar o vazio, a observar o nada. Me inquietou a proposta de troca. Certas coisas eu não alcanço. Minha mente fica pelo caminho a buscar no ontem o que não há.

    1. Lunna, TeleSenas tem valor de troca com o valor de face menor em 50% após um ano de compra. Ou seja “vencida”. Quem compra, o faz pela possibilidade de vir a ganhar algum prêmio em sorteios. São tantos fatores imponderáveis que não alcanço explicar porque alguém se deixa levar. Bateria de carros também acho estranho. Provavelmente, ela poderá ser recuperada através de um processo que o comum dos cidadãos não tem acesso. Deve valer a pena, de alguma forma.

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