A Ingrid, minha filha do meio, me perguntou sobre a origem da parte espanhola da família, do lado de minha mãe. Recorri aos meus primos mais velhos para ter conhecimento exato dessa informação. Uma delas, a Arilda, me enviou a página do documento que meu tio-avô, Juan Nuñez Blanco que, segundo a minha irmã, foi meu padrinho de batismo, lhe foi outorgado pelo Cônsul da Espanha Em Santos. Os seus filhos chegaram a visitar o local do nascimento do irmão do bisavô, Juan e do próprio bisavô, Antônio, meu avô. Eu, por algum motivo obscuro, nunca tive o desejo de “rever” as terras de onde um dia vieram. Agora, estou quase mudando de ideia. Provavelmente essa mudança se deve à pesquisa que realizei para me informar.
Ao me transportar por imagens para a região, fiquei como que conectado aos lugares, querendo saber das histórias dos seus habitantes e e pisar o chão que pisaram. No documento, surge o nome Orense, mas o nome oficial no idioma Galhego é Ourense, já que fica na Galícia, quase fronteira com Portugal. Seu nome pode derivar de Auriense — cidade do ouro — abundante na região. Ou, devido aos muitos pontos de águas termais características da região, pode advir do latim “Aquae Urente”, denominação surgida na época da dominação pelos romanos.
Na pesquisa que realizei sobre Forcadas, o lugarejo original de meu avô, me deparei com uma história incrível. Na mesma localização geográfica tive contato com cidade-fortaleza medieval de Granadilla — uma cidade fantasma. Os eventuais visitantes podem ultrapassar portas adentro, explorar os quartos vazios, caminhar pelas ruas assentadas e ver a cidade do alto do castelo. Mas ninguém mora lá desde que todos os moradores foram expulsos. Num projeto surgido na ditadura do General Francisco Franco, que governou com mão de ferro a Espanha de 1936 a 1975, decidiram construir o Reservatório Gabriel y Galán, no Rio Alagón. Em 1955, as autoridades decretaram que Granadilla, fundada pelos mulçumanos no Século IX, estava na planície que ia ser inundada pela obra e a evacuaram durante a década dos anos 60.
Os seus habitantes alertaram às autoridades que a cidade ficava num ponto mais alto que a barragem e que a água não a invadiria. Foi em vão. Ao longo de 10 anos, de 1959 a 1969, os mil moradores foram despejados à força, muitos deles realocados para assentamentos de colonização próximos à cidade. Quando a água começou a subir em 1963, cobriu todas as vias de acesso à cidade, exceto uma, transformando-a em uma península. Mas a cidade em si nunca foi coberta. Ainda atendendo ao decreto do antigo ditador, mesmo depois de sua morte, os moradores não foram autorizados a retornar até hoje.
O povoado de Forcadas, que originou a minha busca, continua a sua existência de cidade milenar, de construções de pedra, pessoas de ferro e coração quente. É um lugar onde se pode alugar quartos ou casas para estadia. Na região pode-se usufruir de fontes termais e templos antigos, além de reservas naturais.
Meu tio-avô Juan foi o primeiro da família a vir para o Brasil. Algum tempo depois, trouxe o seu irmão, meu avô Antônio que, um ou dois anos após, trouxe a mulher, minha avó Manuela, com os seus cinco filhos. A minha mãe, Maria Madalena e Benjamin, nasceram em terras brasileiras.
Seus pais, meus avós e filhos fugiram da pobreza e das condições políticas instáveis que acabaram por gerar a Guerra Civil Espanhola, que foi usada pelos alemães para testarem as suas armas de aniquilação. Foi uma época da união de regimes autoritários para ascenderem ao poder, não importando a forma e o número de mortos que gerassem. Aqui, no Brasil, os efeitos da Segunda Guerra também atingiu a Família Nuñez Blanco, assim como todos os brasileiros. Foi uma época de escassez de alimentos, com racionamento forçado. Mas estando num dos teatros da conflagração — Espanha — certamente teriam perdido as vidas. Graças à saída de seu local de origem, posso escrever agora sobre o que aconteceu.
A benção, meus avós!


