BEDA / Scenarium / Selfie-Espelho

SELFIE

Quando me olho no espelho, vejo o meu contrário imagético. Me penteio, me invento-maquio, me expresso inversamente à figura que mostro aos outros. Mesmo assim, não deixo de ser verdadeiro. Afinal, sou mais real quando não sou exatamente quem penso que seja.

Como em um jogo de espelhos, o que de mim se mostra exteriormente, na realidade, acabo por ser. Se enxergar com muito cuidado, em mim tudo está dito, tudo mostrado, sem bem que nem sempre desvendado. Não falo especialmente da imagem que mostro, mas da mensagem que tento transmitir – sentimentos, visões, o que ouço, tateio, experimento o gosto – enquanto, interiormente, monto um discurso mentiroso sobre o que apreendo sobre mim para a satisfação do meu ego. E como um monstro que se projeta para além de meus limites mentais, procuro aviltar o espelho revelado-revelador.

Para não parecer tão ultrajante, prefiro me projetar nos crepúsculos, mais do que nas auroras – vida nascente. Pois ao terminar o dia, identifico neles, a morte redentora.

 

Beda Scenarium

2 thoughts on “BEDA / Scenarium / Selfie-Espelho

  1. Me lembrei de um escrito de Henri Fréderic Amiel que afirmou em um de seus diários: “o bom de viver é poder duplicar o que não somos e multiplicar por tudo que pretendíamos ser. O resultado é o reflexo que o espelho nos devolve”.

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