Costumamos entender como vitrine um mostruário reservado a um canto ou logo de frente, normalmente envidraçado, para que o interior seja mostrado, mas não tocado. Pode conter peças de roupas, sapatos, peças, utensílios, mercadorias diversas, etc. São, basicamente, objetos de desejo do ser humano para ele ou para outrem próximo — uma amostra de possibilidades de estar (para alguns, ser) — de se mostrar como quer ser visto por ter ou utilizar. Expandindo para maiores possibilidades, o mostruário não precisaria estar fisicamente limitado por impedimentos ao toque do anseio.
Em uma das saídas do Metrô Anhangabaú, me deparei com o edifício a espelhar o passado através do prédio do lado oposto. Esse confronto de concepções temporais faz desta cidade a contradição em movimento constante. Uma imagem explica a outra, a divergem no mesmo instante. Um vale de lágrimas no meio.
Sob o sol de 35ºC, um artista trabalha como estátua viva. Representa um suado guerreiro da Idade Média (talvez?) diante de uma das mais antigas construções de São Paulo. É um homem-vitrine deste tempo, de si e do País. Da minha carteira quase vazia, saquei os meus últimos 2 Reais, todo o dinheiro físico que eu tinha.
Este mostruário contém uma típica vitrine. Revelam roupas reais para corpos irreais. Longe dos biótipos brasileiros. Quem compra, compra a imagem, além do tecido e do corte. Sabe que não ficará como a vitrine adjetiva, mas como peixe que abocanha a minhoca, não resiste ao apelo.
A Casa Mathilde inteira era a sua própria vitrine. Esta imagem me deixou muito triste. Frequentei algumas vezes este local e vivi por momentos a experiência de viajar a Portugal através de sua doçura feito pães de ló e queijadas, pastéis (de nata e de Belém), pudins e trouxas de ovos, entre outras delícias. Era apenas experimentação, como se fora coisa preciosa, que era, mesmo. Tanto devido ao preço quanto a Diabetes. Agora, não sei se voltará a reabrir tão cedo… ou nunca mais.
Esta vitrine contém sonhos. Trabalho com músicos e sei o quanto cada instrumento carrega, para além de seu corpo e suas cordas, a cadência, o andamento, a destreza, os “calos” nas mãos e na alma adquiridos em treinos e ensaios para um dia um artista se apresentar diante de uma plateia para alegrá-la, comovê-la, conduzi-la para outros lugares e sonhos. São os sonhadores a fazerem sonhar através de arte de iludir e enlevar — transporte para outros tempos e lugares. Que sonhemos… mas nunca será sem muito esforço.
São Paulo, final de Janeiro. Eu caminhava em direção à Praça da República desde a Rua Santa Ephigênia e percebi que aquela seria uma imagem ideal que revela o contraste da vida paulistana entre a idealização e a realidade. Há um esforço grande para a revitalização do Centro. O edifício que apresenta uma pintura em que pessoas “descoladas” enfeitam sua parede lateral foi levantado com o objetivo de atrair moradores de um maior poder aquisitivo. É uma das vitrines do projeto. No entanto, as pichações já demonstram que a manutenção é complicada. Na calçada, encostados a essa mesma parede, sem-tetos observam a cavalaria policial passar. Quem quiser morar por ali, talvez não se sinta à vontade para conviver com a crueza abjeta do nosso estilo de vida.
Alê Helga — Mariana Gouveia — Lunna Guedes
Gostei imenso das suas vitrines… a da loja de músicas me fez viajar no tempo e a da Casa Mathilde me fez lembrar que há meses não como uma bola de berlim. Não sei se é definitivo, mas eles avisaram aos clientes que fechariam por causa da Covid, mas a sua fotografia me fez lembrar dos tempos em que eu transitava pela área central e frequentava o Boolevard São Bento, com suas mesas para leituras, cafés e encontros de fim de tarde.
Lunna, deixei de postar várias fotos. O Centrão é muito rico de imagens e personagens.