BEDA / Índio*

Pois, é! Esse sujeito de tez branca aí tem sangue dos povos originários de Pindorama (país das palmeiras, nome dado ao Brasil pelos ando-peruanos e pelos indígenas pampianos), mais precisamente Tupi-Guarani. Diz respeito à família linguística (tronco Tupi) com a maior distribuição geográfica no Brasil, estendendo-se por 13 estados e compreendendo cerca de 20 línguas vivas, com pequena diferenciação interna.

A Língua Tupi também é usada na Guiana Francesa, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Paraguai e Argentina. O meu pai tinha pele menos clara e os olhos mais puxados. Em uma empresa que trabalhou, tinha o apelido de “japonês”. O que demonstra apenas que as generalizações englobam características e conceitos pré-concebidos que faz com que sejamos chamados pelos norte-americanos de “latinos” — algo que significaria “origem racial indefinida” — o que muito me orgulha.

Tenho igualmente ascendência hispânica, por parte de mãe, portanto, de alguma maneira, sou também latino, não apenas por morar num país da América Latina. Na encruzilhada de referências, também sou originário dos povos europeus que aportaram nas Américas, as invadindo território adentro — espanhóis, portugueses, ingleses, holandeses e franceses — que promoveram um dos maiores genocídios da História humana. Nas ilhas caribenhas, por exemplo, dizimaram os habitantes autóctones e as ocuparam com populações inteiras de africanos escravizados.

Tudo já começou errado, pois o italiano Colombo cria que havia chegado às Índias, denominando aos originários da terra de Índios. A invasão das Américas ocasionou além da morte de pessoas, igualmente promoveu a extinção de culturas, de línguas, de protetores do meio ambiente que dependiam da biodiversidade para sobreviverem. Ainda hoje sofremos, como brasileiros, com a política desatinada que coloca o ganho de capital financeiro em detrimento do ganho de capital humano e das outras diversas formas de vida. Estamos perdendo a chance de nos tornarmos um país diferenciado em termos de desenvolvimento sustentável, fundamentado no que a ancestralidade, na mitologia e na cultura indígena tem a nos oferecer. Há quem sonhe viajar para outros planetas. Podem ser os mesmos que “descobriram” neste planeta chamado Terra — que prefiro chamar de Gaia —, maravilhosos lugares e os tem destruído paulatinamente.

Agimos como um vírus que contamina seu hospedeiro, o mata e contamina outros corpos após outros corpos. Se há uma lição que a mortandade dos Povos Indígenas possa nos deixar é que devemos nos curar do mal de nos colocarmos acima de tudo e de todos. Que sejamos humildes e aceitemos que devemos parar de passar como tratores por cima das áreas reservadas aos povos originários, tratando-as como recursos econômicos à disposição de invasores-destruidores-genocidas modernos hoje patrocinadas por um ignominioso que os representa no poder central do Brasil.

*Texto de 2021, por ocasião do antigo Dia do Índio, atualmente dos Povos Indígenas, macabra e contraditória efeméride, já que desrespeitamos os povos originários todo o santo dia.

9 thoughts on “BEDA / Índio*

  1. eu que vivo essa realidade cara a cara, passo a passo posso comprovar o quanto a luta deles é válida e contínua. Pedimos respeito e negamos a eles todos os dias esse direito único e estendido a todos. Infelizmente, a luta ainda está no começo. E viva os povos originários!

  2. Essa história que o Colombo acreditava ter chegado a Índia sempre me fez rir. Não sei como alguém consegue acreditar nessa falácia. Minto. Sei sim. Homens contando suas histórias, de tanto que se repetem, vira realidade

    1. Bem, o fato é que seu companheiro, Américo Vespúcio, acabou por nomear as terras “encontradas” (como se tivessem perdidas). Seria interessante chamar os três continentes (em um) de Colômbia.

      1. Nomear não me diz nada, meu caro. Até porque o tanto de coisas e pessoas nomeadas e rotuladas por aí, deixa bem claro que isso nem de longe e interessante. O fato é que a América foi encontrada por navegadores, mas duvido que estavam perdidos. Era parte de um projeto de navegação. Os documentos existentes deixam isso claro. Agora a maneira como os fatos são contatos por aí é que me diverte, desde a infância

      2. O Tratado de Tordesilhas, entre Portugal e Espanha foi assinado em 1494, em consequência da chegada de Colombo aos territórios do Norte em outubro de 1492. Eles “sabiam” que novas terras deviam se encontrar mais abaixo. A navegação tinha se desenvolvido enormemente, mas assim como lançar foguetes à Lua é uma empreitada temerária ainda hoje, navegar naqueles tempos era uma jornada sem controle sobre o destino da viagem. Obviamente, os financiadores de Colombo prefeririam que ele tivesse chegado à Índia, mas somente em 1497, Vasco da Gama conseguiu ultrapassar o Cabo das Tormentas para obter êxito. O grande e controverso genovês morreu desacreditado e sem receber o que lhe havia sido prometido pela Coroa Espanhola. Todos os registros disponíveis dão conta que ele não acreditava ter chegado a uma nova terra.

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